Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados
É bem conhecida a elevada densidade de tráfego marítimo que cruza as nossas águas territoriais.
Sabe-se que dos muitos milhares de barcos que ao longo do ano navegam junto à nossa costa, um número muito elevado de navios transporta cargas perigosas ou altamente poluentes, havendo inclusivamente navios que circulam nas nossas águas transportando material radioactivo.
Sabe-se também que muitos desses navios não oferecem condições minimamente aceitáveis para o transporte marítimo. Não têm casco duplo, têm demasiados anos de vida, utilizam bandeiras e tripulações de conveniência para baixar custos e aumentar lucros (e também o risco de desastres ambientais), fogem às inspecções e aos portos dos países onde essas inspecções são efectuadas com maior frequência e rigor. Recorde-se, a título de exemplo, o caso ainda recente do Nestor C, que impunemente transitava junto à costa portuguesas apesar de ser um dos “ilustres membros” da lista negra de navios de risco elevado elaborada pela Comissão Europeia.
Apesar da sua limitada dimensão territorial, Portugal é o país da União Europeia com maior Zona Económica Exclusiva, sendo por aqui que passam, anualmente, cerca de um milhar e meio de navios considerados de alto risco.
Esta é uma situação que não pode nem deve ser esquecida ou apenas invocada quando há desastres e catástrofes ambientais.
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados
Exigir-se-ia, em termos gerais, que o país dispusesse de meios eficazes de vigilância e acompanhamento deste intenso tráfego marítimo.
Exigir-se-ia que o país dispusesse dos meios capazes de exercer uma acção de prevenção, de limitação de riscos, e de combate às consequências ambientais de acidentes marítimos. Enfim, exigir-se-ia que o país – sem prejuízo da necessária e indispensável colaboração e coordenação de saberes e de recursos a nível internacional – dispusesse de meios próprios adequados para garantir níveis de segurança marítima compatíveis com a dimensão dos oceanos sob sua jurisdição.
Lamentavelmente isso não acontece e o caso, também recente, do Prestige – cujas consequências directas felizmente não atingiram as costas portuguesas – mostrou bem as debilidades do país.
No debate sobre a catástrofe do Prestige, aqui ocorrido há quase dois meses, o PCP lançou um repto para que o Governo apresentasse a curto prazo um programa integrado de investimentos destinados a superar as insuficiências existentes nos sistemas de vigilância e de prevenção, de controlo e de combate a situações decorrente dos riscos do transporte marítimo.
Pretendia o PCP que o Governo se comprometesse a fazer discutir, a aprovar, a tornar conhecido um plano coerente de acção e actuação que, de forma permanente assegurasse níveis exigentes de segurança marítima ao longo de toda a nossa ZEE.
O Governo, na altura, fez ouvidos de mercador a esta proposta do PCP e preferiu abordar apenas as questões imediatamente ligadas ao acidente ocorrido. Fechados os holofotes sobre o afundamento do Prestige e sobre a possibilidade das costas portuguesas serem atingidas pela maré negra – o Governo parece ter rapidamente esquecido que as debilidades e as insuficiências no dispositivo nacional de segurança marítima permanecem.
Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados
Face à situação concreta que ocorre nas nossas águas pode parafrasear-se aquele perito em segurança marítima que escreveu, não há muito tempo, que “só a protecção de Nossa Senhora de Fátima pode justificar que até agora Portugal tenha sido poupado à ocorrência de uma maré negra ou contaminante de proporções catastróficas”.
De facto, o sistema nacional de segurança marítima continua a enfermar de vulnerabilidades estruturais acentuadas que, enquanto não forem corrigidas, continuarão a fazer pairar sobre o país a possibilidade de ocorrerem catástrofes ambientais.
Enquanto não forem criados sistemas de assinalamento marítimo e de ajudas à navegação, enquanto não for instalada a sempre adiada rede de vigilância e monitorização do tráfego marítimo (o famoso VTS), enquanto não se dispuser de capacidade de fiscalização e de sancionamento adequados, a vulnerabilidade da nossa costa continuará.
Portugal, até pela posição estratégica das suas águas no contexto do tráfego marítimo mundial, tem de ter uma intervenção activa no contexto internacional, designadamente defendendo e contribuindo para impor níveis elevados da segurança marítima das nossas águas através de decisões pertinentes tomadas no seio da União Europeia ou da Organização Marítima Internacional.
É esta vertente que o Projecto de Resolução dos Verdes, em discussão hoje, aborda de forma mais precisa. A definição de rotas marítimas tendo por base trajectos ambientalmente mais adequados, o seu estabelecimento preferencial em zonas mais afastados das nossas costas, a definição de locais sensíveis do ponto de vista ambiental cuja utilização deveria ser interdita ou cerceada ao tráfego marítimo, constitui um conjunto de medidas que têm de ser negociadas e firmemente defendidas pelo Governo no contexto das organizações internacionais de que Portugal faz parte.
A segurança marítima passa também, necessariamente, por aí. Por isso o PCP considera muito positivo e temporalmente adequado o Projecto de Resolução dos Verdes que faz cometer ao Governo a responsabilidade de definir e negociar com urgência novas rotas para o tráfego marítimo que atravessa as nossas águas, com vista a limitar os riscos e a criar melhores condições para minimizar e evitar consequências ambientais negativas nos ecosistemas marinhos.
Porque este constitui mais um passo claro e coerente para se poderem criar melhores condições globais para a segurança marítima nas nossas águas, o PCP manifesta o seu apoio ao Projecto de Resolução nº 70/IX do Grupo Parlamentar dos Verdes que visa criar “corredores ecológicos” para o tráfego marítimo que atravesse a nossa Zona Económica Exclusiva.