Intervenção

Criação de Áreas Protegidas<br />Intervenção de Honório Novo

Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados

Há cerca de dois anos, um vasto conjunto de académicos, investigadores e membros de diversas associações e movimentos ambientalistas e de defesa da natureza lançou um repto aos diversos partidos políticos, instituições e órgãos de poder.

O repto era claro. Apresentava-se um objectivo concreto, o de criar uma rede de áreas de paisagem protegida na Área Metropolitana do Porto e suas envolventes.

O repto dava assim corpo e seguimento às iniciativas e estudos que ao longo de anos e anos vinham justificando, e reclamando, a decisão de proceder à protecção de três áreas de reconhecido interesse ambiental no domínio da preservação da biodiversidade, da fauna e da flora e da defesa da natureza, todas elas integrando ou rodeando a grande concentração urbana portuense, todas elas tendo como elemento comum o facto de pertencerem, no fundamental, ao Distrito do Porto ou à sua Área Metropolitana.

Numa delas, situada mais a Norte, no Concelho de Vila do Conde, pretendia-se proteger e classificar como área protegida a Reserva Ornitológica do Mindelo, com cerca de 500 hectares, criada já em 1957.

A Este, atravessando os Concelhos de Valongo e Gondomar, e penetrando nos Municípios de Paredes e Penafiel pretendia-se preservar uma vasta zona montanhosa integrando as Serras de Santa Justa, Pias, Castiçal, Flores e Banjas, nos vales dos Rios Ferreira, Sousa e Mau, verdadeiro pulmão verde do Distrito do Porto, com uma área que se aproxima dos 6.000 hectares.

A Sul da Área Metropolitana, entre Espinho e Ovar, o desafio pretendia, finalmente, criar uma área de paisagem protegida – a da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos - que assim pudesse integrar e articular vontades no reiterado desejo de preservar uma zona húmida determinante na biodiversidade e nos circuitos migratórios internacionais, e que permitisse, simultaneamente, ordenar, despoluir e desassorear.

Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados

Na anterior Legislatura, a VIII, o PCP apresentara neste âmbito já duas iniciativas legislativas que só caducaram pelo facto da legislatura não ter seguido o seu curso normal.

Apresentámos então um Projecto de Resolução, o 166/VIII, com vista a vincular o Governo à criação de um Programa de Requalificação Ambiental da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos.

Apresentámos, também aí, um Projecto de Lei, o 88/VIII, que propunha a criação da Área Protegida de Santa Justa, Pias, Castiçal, Flores e Banjas, no qual já propunhamos a sua designação como Parque Regional do Douro Litoral, nome de baptismo que hoje começa a ganhar cada vez mais adeptos e simpatias.

O PCP acompanha assim, desde há muitos anos, o desejo das populações, de autarcas e ambientalistas que visa promover de forma consequente a defesa da natureza e o desenvolvimento sustentável desta região e do País.

Por isso, o desafio para criar uma rede formada no mínimo com estas três áreas protegidas em torno da Área Metropolitana do Porto foi naturalmente adoptado pelo PCP que o inscreveu em termos programáticos, e que o concretizou através da apresentação dos três Projectos de Lei.

Por isso o PCP decidiu que não se podia esperar mais tempo. Que era a altura de suster a degradação, no Mindelo, o desordenamento e a poluição, na Barrinha de Esmoriz, a destruição e a desflorestação no Parque Regional do Douro Litoral.

Por isso o PCP considerou que era altura de impedir que se adiassem sucessivamente, irresponsavelmente, as decisões que deveriam já ter sido tomadas.

Por isso o PCP decidiu agendar e trazer a debate, hoje, os Projectos de Lei para a Criação das Áreas Protegidas da Reserva Ornitológica do Mindelo, das Serras de Santa Justa e da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos.

Outros decidiram acompanhar-nos neste agendamento, ainda bem que o fizeram.

Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados

Parecia à partida que haveria condições políticas para que os três projectos fossem aprovados.

Por exemplo, todos os candidatos eleitos e partidos defendem há muito e de forma expressa – pelo menos no discurso - , a criação da Área Protegida da Barrinha de Esmoriz.

Como também o fazem autarcas, no poder e na oposição, em torno de Santa Justa e da Reserva Ornitológica do Mindelo.

Parecia assim ser possível obter consensos.

Mas o que parecia possível tornou-se afinal um jogo de sombras. Uma mistificação. Uma opção pelo não decidir, pelo adiamento.

Em Julho, no pomposo e mediático Conselho de Ministros do Palácio do Freixo, no Porto, o Governo anunciou a criação da Área Protegida de Santa Justa mas, afinal, constata-se que aprovou apenas uma resolução a reconhecer méritos e mandar proceder a estudos e a prestar colaboração aos Municípios. Uma mão cheia de quase nada.

Agora, perante o pedido de agendamento do PCP, a maioria parlamentar prepara-se para anunciar que o Conselho de Ministros vai fazer o mesmo com a Barrinha de Esmoriz.

Puxa-se da cartola por mais uma resolução que recomende estudos. Agora também para Esmoriz.

E como não há duas sem três, em relação ao Mindelo, é desta vez a maioria parlamentar quem também apresenta um projecto de resolução para recomendar ao Governo que proceda a estudos. Sempre os tais estudos!

Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados

Os estudos já existem, e há muito. Para os três locais.

O reconhecimento académico e científico sobre a importância da sua preservação, também. Por isso estão incluídas, as três áreas, ou em REN, ou em RAN, ou pertencem à Rede Natura, ou constituem zonas classificadas nos Planos de Ordenamento da Orla Costeira, ou são alvo de iniciativas concretas profundamente meritórias, embora parciais, por parte das autarquias.

É preciso delimitar rigorosamente áreas, porventura adaptá-las? É bem possível que seja. É necessário confirmar classificações, estabelecer regulamentos e criar comissões directivas? Naturalmente.

Tudo isso será necessário e possível. Mas o que se torna urgente é que essas tarefas sejam cometidas ao Governo, mas depois de serem criadas as áreas protegidas.

O que a maioria parlamentar e o Governo pretendem com as manobras dilatórias das resoluções ou dos projectos de resolução é evidente: rejeitar a criação das Áreas Protegidas de ROM, de Santa Justa e de Esmoriz.

Tudo o resto são jogos de sombra, adiamentos.

Um Governo e uma maioria que enche a boca com a capacidade de tomar decisões, desta vez, em matéria de defesa da natureza, opta por estudar, por recomendar novas análises e mais estudos, opta por adiar mais uma vez, ou seja, por rejeitar.

Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados

Uma nota final pois os exemplos repetem-se todos os dias.

O Governo quer transformar esta Casa em caixa de ressonância da vontade governamental. A maioria parlamentar aceita desempenhar o papel menor de funcionar como mero Câmara de eco das decisões e vontade do Governo.

As iniciativas legislativas não são analisadas em função do mérito ou do conteúdo, são avaliadas em função da origem.

Se for o PCP a avançar, como é o caso de hoje, a resposta é só uma: dizer que o Governo está a fazer o mesmo, ou que o irá fazer (mesmo que não saibam quando), adiar o problema, votar contra!

Fica contudo claro que:

A Reserva Ornitológica do Mindelo só não será Área Protegida a partir de hoje porque o PSD e o CDS vão votar contra.

As Serras de Santa Justa, Pias, Castiçal, Flores e Banjas só não se transformam hoje no Parque Regional do Douro Litoral porque a maioria parlamentar o vai impedir.

A Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos só não se transforma hoje numa área protegida que ultrapasse os seus bloqueios porque os eleitos do PSD e do CDS, ao contrário do que andaram a prometer na região, vão votar contra!

 

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