Projecto de Lei N.º 718/XII/4.ª

Criação da Freguesia de Poceirão, no Concelho de Palmela, Distrito de Setúbal

Criação da Freguesia de Poceirão, no Concelho de Palmela, Distrito de Setúbal

Exposição de Motivos

A Freguesia de Poceirão é a mais jovem do Concelho de Palmela. Surge do Projeto de Lei n.º 165/V – Criação da Freguesia de Poceirão no Concelho de Palmela, apresentado pelo PCP em 29 de janeiro de 1988, correspondendo aos legítimos direitos, aspirações, interesses e necessidades da população.

A votação e aprovação da criação da freguesia ocorreram em 11 de março de 1988 na Assembleia da República e daria origem à Lei n.º 67/1988, de 23 de Maio.

Com uma área de 151,46 km2 e caracterizada por uma dispersão geográfica e habitacional, dista cerca de 25 Km de Palmela e conta com aproximadamente 5.000 habitantes. Integrada no Concelho de Palmela, Distrito de Setúbal, o seu território confronta com diferentes Freguesias, nomeadamente, Canha e Santo Isidro de Pegões (Concelho do Montijo), S. Pedro de Marateca, Palmela e Pinhal Novo (Concelho de Palmela), Alcochete (Concelho de Alcochete) e Samora Correia (Concelho de Benavente).

Em meados do século XVII – XVIII, o território da freguesia de Poceirão, caracterizava-se por uma zona de coutada, onde teoricamente não era possível a ocupação humana, com solos pobres, povoados de mato e pinhais que forneciam lenha à capital.

Mais tarde, em meados do século XIX, com o aforamento das terras, procede-se ao cultivo de extensas áreas de sobro e vinha. O regime de aforamento passou posteriormente a ser substituído por explorações agrícolas familiares. Apesar de este território ser essencialmente uma terra de passagem, não deixa porém de atrair residentes e, a partir de 1861, aumenta o seu número, começando então a emergir várias povoações, algumas em rápido crescimento. É porém a instalação do caminho-de-ferro que origina um franco desenvolvimento nesta região e dá origem ao aglomerado – Poceirão.

A localidade de Poceirão é relativamente jovem, mas foi antecedido por um outro aglomerado, hoje já desaparecido, transformado em vinha, o Poceirão Velho.

Tudo indica que, desde o período da reconquista até ao século XIX, esta região se tenha mantido bastante despovoada. Reconhecem-se nesta zona abundantes vestígios arqueológicos de época romana e alguns vestígios anteriores a essa época. Junto à margem da Barragem da Venda Velha recolheram-se fragmentos de ânforas e outro material romano como imbrices (tipo de telhas), cerâmica comum e tijoleira.

As populações de Rio Frio e de Poceirão identificam-se com a denominada «cultura Caramela». As investigações sobre esta comunidade fazem remontar aos inícios do séc. XIX – chegada dos primeiros colonos a estas terras. Os registos mais coerentes só acontecem por alturas da formação do Círio da Carregueira, em 1833.

Era gente habituada ao trabalho do campo, que provinha da Beira Litoral, entre Mira e Pombal, e procurava melhores e maiores proventos. Chamados para desempenhar tarefas sazonais, na sua maioria, eram apelidados de caramelos de ir e vir. A partilha de terras fez com que os trabalhadores, sujeitos às precárias condições de trabalho e de vida, se pudessem tornar eles próprios proprietários. A ligação à terra passa a ter um carácter mais forte e o indivíduo apropria-se do espaço que passa a sentir como seu, transformando-o, construindo-o à sua imagem. Aos poucos, foram transformando as terras incultas, obtendo culturas de sequeiro e de regadio, abrindo poços, regando, cavando.

Deu-se início à colonização interna e os outrora “caramelos de ir e vir”, tornaram-se “caramelos de ficar”. A colonização desta zona pelos caramelos foi de tal forma marcante, que hoje ainda existe uma rua que se denomina de “Aceiro dos Caramelos”.

De entre os utensílios de designação característica desta comunidade, salientam-se: a copa (alcofa de comer), a torta (enxada), a tampana (cesto de vime para carregar o arroz).

A sopa Caramela, ainda hoje muito conhecida e difundida, à base de feijão, batata e couve, continha os ingredientes-base da alimentação destes rurais, a que se juntava o pão de milho e, em dias de festa, a carne de porco.

Em termos arquitetónicos, as primeiras construções de habitat desta região, de cariz popular – a casa Caramela - eram retangulares, baixas, de adobe, com telha de canudo, caiadas de branco e com faixa azul à volta. Atualmente, ainda se pode encontrar vestígios destas construções nas localidades de Asseiceira, Lagoa do Calvo e Forninho. Os caminhos que acediam às casas, situadas nas fazendas, eram os aceiros (os mais largos) e as riscas (os mais estreitos).

No monte da Lagoa do Calvo, reconhecido como um dos mais antigos pelos habitantes da região, subsistem restos de construções originais em adobe. Na base de um dos edifícios encontraram-se algumas cerâmicas do séc. XVIII e XIX, que datam a construção inicial.

Referenciamos, igualmente, que a atribuição dos arruamentos e topónimos da Freguesia está relacionada com as vivências e histórias locais (todas as ruas da freguesia possuem topónimos escolhidos e decididos democraticamente em reuniões nas localidades com as populações). A título de exemplo referimos o singular topónimo – Forninho, relacionado com a existência de um forno local, provavelmente da primeira metade do século. As cerâmicas recolhidas no espaço onde se terá situado o forno, indicam que se trataria de um pequeno centro produtor de telha e tijolo.

A constatação da importância de preservar os traços de uma primitiva colonização da zona, tem vindo a incentivar a realização de recolhas e de mostras que divulgam e cuidam da gestão desta memória coletiva. Nos festejos anuais do Poceirão, a Feira Comercial e Agrícola, foram recriados espaços e profissões em extinção, relacionados com a vivência da população local de origem Caramela, dando ênfase à ruralidade deste território ainda hoje caracterizado por uma intensa atividade agrícola, onde se destacam a cultura do tomate, das hortícolas, o montado de sobro e também as explorações de gado ovino, suíno e bovino.

Em termos de acessibilidades, esta freguesia tem como eixos principais as estradas nacionais nº.4 e nº.5, atravessada pela Linha do Alentejo e pela Linha do Sul, Concordância Agualva / Poceirão / Águas Moura.

Identificamos na localidade de Poceirão a oficina de manutenção ferroviária, que opera em instalações da CP-Carga, e efetua a manutenção a vagões de mercadorias (nomeadamente os afetos ao transporte de carvão desde o porto de Sines e de abastecimento de jet-fuel ao aeroporto de Faro), bem como manutenção ligeira a material de tração da CP Carga.

Os grandes projetos planeados para esta freguesia, atualmente suspensos (nomeadamente Terceira Travessia do Tejo, Plataforma Logística do Poceirão e Novo Aeroporto de Lisboa), incluem uma forte componente de transporte ferroviário e fazem com que o eixo Pinhal Novo-Poceirão se constitua decididamente no “Centro de Gravidade do Sistema Ferroviário a Sul do Tejo”, que até há uns anos se localizava no Barreiro.

A ampliação e modernização das atuais instalações das oficinas do Poceirão, com a implementação de diversas valências - Parque de Material e Oficinas (manutenção, parqueamento, abastecimento e limpeza de material circulante), contribuirá para que a localidade de Poceirão seja uma referência na atividade de manutenção ferroviária.
Esta freguesia, cuja principal característica é a ruralidade, inclui as localidades de Agualva de Cima, Asseiceira, Lagameças, Forninho, Lagoa do Calvo, Brejos do Poço, Aldeia Nova da Aroeira, Poceirão, uma parte de Foros do Trapo e grande parte da Herdade de Rio Frio.

De acordo com os Censos de 2011, a freguesia de Poceirão é constituída por 4.758 habitantes, dos quais 2.313 habitantes são do género masculino e 2.445 habitantes são do género feminino, situando-se a maior faixa etária no grupo etário dos 25-64 anos (com 2.516 habitantes), seguido do grupo etário de 65 ou mais anos (com 939 habitantes), do grupo dos 0-14 anos (com 762 habitantes) e do grupo dos 15-24 anos (com 538 habitantes). Segundo o nível de instrução a maioria da população possui o 1º Ciclo do Ensino Básico (1.373 habitantes), constatando-se igualmente um grande número de população sem qualquer nível de instrução (1.272 habitantes), seguido de 762 habitantes com o 3º Ciclo do Ensino Básico, 747 habitantes com o 2º Ciclo, 460 habitantes com nível secundário e 152 habitantes com ensino superior.

Esta anterior freguesia, com cerca de cinco mil habitantes, apresenta um tecido económico relacionado com o setor primário – o setor da agricultura, onde a posse de terra assume um valor social, uma identidade, que passa muitas das vezes de geração em geração, adaptando-se às novas estratégias, permanecendo os valores sociais e culturais vigentes.

As culturas que mais se praticam em Poceirão são o cultivo da vinha (predominante em relação a todos os outros), produção de vinho, cultura do tomate, batata, milho, extração de cortiça nalguns hectares de sobreiro existentes na freguesia. A predominância do cultivo da vinha explica a presença da indústria do vinho e de cerca de 17 adegas, para além das familiares.

O setor agropecuário tem, igualmente, bastante representatividade na economia da freguesia destacando-se a criação de ovinos e bovinos e principalmente a de suínos.
No domínio do comércio/lazer, realiza-se o mercado mensal (no primeiro Domingo de cada mês), uma feira anual em finais de Maio e 1º fim de semana de Junho – Feira Comercial e Agrícola do Poceirão.
A Freguesia de Poceirão possui uma relação de proximidade junto do tecido associativo, a nível social, cultural, recreativo, desportivo e educativo, no desenvolvimento de dinâmicas de parceria que contribuem para a dinamização, valorização e reconhecimento do território. É disso exemplo o trabalho em parceria com as coletividades existentes, nomeadamente: a Associação de Cultura e Desporto de Poceirão, o Forninho Futebol Clube, o Grupo Desportivo das Lagameças, a Sociedade Recreativa Instrutiva 1º de Janeiro, da Lagoa do Calvo, a Sociedade de Instrução e Recreio 1º de Maio, da Asseiceira,a Associação Os Amigos das Lagameças, o Grupo Desportivo e Recreativo Águias da Aroeira, o Rancho Folclórico de Poceirão, o Rancho Folclórico, Os Fazendeiros das Lagameças, o Rancho Folclórico do Forninho, a Associação Cultural de Agualva de Cima, a Associação da Feira Comercial e Agrícola de Poceirão.

No que se refere à área social, a freguesia de Poceirão conta com duas instituições particularmente dinâmicas, o Centro Social das Lagameças e a Associação dos Idosos e Reformados da Freguesia de Poceirão, com diversas valências, desde Creche, ATL, Pré-Escolar, a Centro de Dia e Apoio Domiciliário.

Também, num quadro de proximidade com as populações, a Freguesia de Poceirão foi pioneira na celebração de protocolos com a Câmara Municipal de Palmela, nomeadamente na área de delegações de competências, das quais destacamos: Reparação e conservação dos estabelecimentos de educação pré-escolar e do 1º ciclo do ensino básico; Higiene e limpeza de espaços públicos; Conservação e limpeza do polidesportivo; Conservação e limpeza dos espaços de jogo e recreio; Recolha de monos; Despejo de fossas; Colocação e conservação de placas toponímicas e Conservação da rede viária. Tem ainda um papel essencial na articulação dos diferentes atores locais como, as forças de segurança, a comunidade educativa, incluindo as associações de pais e encarregados de educação, o movimento associativo juvenil e o tecido empresarial local.

A extinção de freguesias protagonizada pelo Governo e por PSD e CDS-PP insere-se na estratégia de empobrecimento do nosso regime democrático. Envolto em falsos argumentos como a eficiência e coesão territorial, a extinção de freguesias conduziu à perda de proximidade, à redução de milhares de eleitos de freguesia e à redução da capacidade de intervenção. E contrariamente ao prometido, o Governo reduziu ainda a participação das freguesias nos recursos públicos do Estado.
O Grupo Parlamentar do PCP propõe a reposição das freguesias, garantindo a proximidade do Poder Local Democrático e melhores serviços públicos às populações. Assim, propomos a reposição da Freguesia de Poceirão no Concelho de Palmela.
Nestes termos, ao abrigo da alínea n) do artigo 164.º da Constituição da República e da alínea b) do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo-assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Criação

É criada, no concelho de Palmela a Freguesia de Poceirão, com sede em Poceirão.

Artigo 2.º
Limites territoriais

Os limites da nova freguesia coincidem com os da Freguesia de Poceirão até à entrada em vigor da Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro.

Artigo 3.º
Comissão instaladora

1- A fim de promover as ações necessárias à instalação dos órgãos autárquicos da nova freguesia, será nomeada uma comissão instaladora, que funcionará no período de seis meses que antecedem o termo do mandato autárquico em curso.

2- Para o efeito consignado no número anterior, cabe à comissão instaladora preparar a realização das eleições para os órgãos autárquicos e executar todos os demais atos preparatórios estritamente necessários ao funcionamento da discriminação dos bens, universalidades, direitos e obrigações da freguesia de origem a transferir para a nova freguesia.
3- A comissão instaladora é nomeada pela Câmara Municipal de Palmela com a antecedência mínima de 30 dias sobre o início de funções nos termos do n.º 1 do presente artigo, devendo integrar:

a) Um representante da Assembleia Municipal de Palmela;
b) Um representante da Câmara Municipal de Palmela;
c) Um representante da Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Poceirão e Marateca;
d) Um representante da Junta de Freguesia da União das Freguesias de Poceirão e Marateca;
e) Cinco cidadãos eleitores da área da nova Freguesia de Poceirão, designados tendo em conta os resultados das últimas eleições na área territorial correspondente à nova freguesia.

Artigo 4.º
Exercício de funções da comissão instaladora

A comissão instaladora exercerá as suas funções até à tomada de posse dos órgãos autárquicos da nova freguesia.

Artigo 5.º
Partilha de direitos e obrigações

Na repartição de direitos e obrigações existentes à data da criação da nova freguesia entre esta e a de origem, considera-se como critério orientador a situação vigente até à entrada em vigor da Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro.

Artigo 6.º
Extinção da União das Freguesias de Poceirão e Marateca

É extinta a União das Freguesias de Poceirão e Marateca por efeito da desanexação da área que passa a integrar a nova Freguesia de Poceirão criada em conformidade com a presente lei.

Assembleia da República, em 19 de dezembro de 2014

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