Projecto de Lei N.º 930/XII/4.ª

Criação da Freguesia de Cedofeita, no Concelho do Porto, Distrito do Porto

Criação da Freguesia de Cedofeita, no Concelho do Porto, Distrito do Porto

As freguesias são a célula base da administração do território e representam uma criação espontânea dos povos, cuja origem remonta aos séculos anteriores à própria constituição da nacionalidade portuguesa e consequentemente do próprio Estado. A maior parte das freguesias portuguesas origina-se principalmente nos séculos X e XI. No século XIII, conforme se constata da documentação das Inquirições de 1258, já estava constituída há muito tempo a rede de freguesias que conhecemos e que se manteve praticamente sem alterações, com algumas exceções ditadas pela necessidade de dividir algumas freguesias que foram ganhando maior dimensão. As freguesias nascem como assembleias de vizinhos que habitam um território e compartilham uma centralidade comum (igreja e cemitério), simultaneamente cívica e religiosa, que até ao século XX se designava “Paróquia” e que apenas após a implantação da República se passou a chamar-se “Freguesia”. É devido a esta necessidade de as populações decidirem localmente a resolução dos assuntos locais, ou seja aplicando na prática o princípio da subsidariedade, que no século XVII e XVIII irão surgir nas freguesias as chamadas “Confrarias do Sub-Sino” que geriam e resolviam os assuntos de interesse comum das comunidades locais, nomeadamente no que se refere à administração do cemitério paroquial, da manutenção dos caminhos vicinais, da partilha de águas de rega e baldios e outros assuntos. No século XIX, após a revolução liberal, estas entidades locais passarão a ser designadas como as “Juntas de Paróquia” passando agora a ter um carácter completamente laico mas mantendo as mesmas atribuições, competências e distribuição territorial. Após a implantação da República irão mudar o nome para “Juntas de Freguesia”, mas mantendo sempre o seu território e atribuições.
Nas Inquirições do Rei Afonso III, em 1258, já aparecem como freguesias quase todas as que atualmente compõem o município do Porto. A freguesia mais antiga da cidade era a da Sé e que até ao século XVI foi a única freguesia do núcleo urbano do Porto. Apenas as freguesias da Vitória e de S. Nicolau foram constituídas em 1583, a partir da divisão da primitiva freguesia da Sé, devido ao grande crescimento que este núcleo original da cidade tinha tido no século XVI. Em 1584 surge já a primeira referência à freguesia de Santo Ildefonso. Só em 1841 é que este mapa é alterado com a criação da freguesia do Bonfim, abrangendo partes que até então pertenciam às antigas freguesias de Santo Ildefonso, Sé e Campanhã. Outras freguesias, todas elas já existentes antes de 1258, mas que se encontravam situadas nos arrabaldes da cidade, vão sendo incorporadas gradualmente no território da cidade do Porto como Miragaia, Paranhos, Campanhã, Lordelo do Ouro e S. João da Foz. Em 1836 a cidade do Porto era composta por sete freguesias: Sé, Vitória, S. Nicolau, Santo Ildefonso, Cedofeita, Miragaia e Massarelos. Por Decreto de 26 de Novembro de 1836 foram-lhe anexadas as freguesias de Lordelo do Ouro, Foz do Douro e Campanhã. Posteriormente, por Carta de Lei de 27 de Setembro de 1837 é integrada na cidade a freguesia de Paranhos. A freguesia do Bonfim só se constituiu de facto como circunscrição administrativa em 1841. Já no final do século XIX, na sequência da construção da Estrada da Circunvalação, são ainda incorporadas em 1895 as freguesias de Aldoar, Nevogilde e Ramalde que, até então pertenciam ao concelho de Bouças (atualmente Matosinhos).

A origem da freguesia de Cedofeita remonta a um pequeno mosteiro que teria aqui sido fundado por um voto do rei suevo Teodomiro, no ano de 559. No século XII, sendo rei de Portugal D. Afonso Henriques já estariam aqui instalados os Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, procedendo-se nesta época à reconstrução e ampliação da igreja, dando origem à Colegiada de S. Martinho de Cedofeita que, até meados do século XIX, irá deter os direitos senhoriais sobre estas terras. Nos inícios do século XII, quando a Condessa D. Teresa concede a D. Hugo o Couto do Bispo da Porto, já existia o “Couto da Colegiada de Cedofeita”, uma vez que o documento refere os limites em que ambos os coutos se confrontavam. Já no século XVI é anexado o lugar de Massarelos. O Couto da Colegiada de S. Martinho de Cedofeita que compreendia assim uma extensa área incluindo ainda o lugar anexo de Massarelos. Inciar-se-ia perto do lugar da Arrábida, junto ao Rio Douro, subindo pelo lugar do Bom Sucesso até ao Monte Pedral e ao Monte Cativo, descendo depois por Germalde (atualmente a zona da Lapa) e daqui até ao atual Largo da Trindade, onde infletia em direção a Monchique junto ao Rio Douro. Era um fértil arrabalde da cidade, mas escassamente povoado, sendo muitas vezes designado como o “Ermo de Cedofeita”. Até ao século XVIII Massarelos, que seria o lugar mais povoado, terá pertencido ao Couto. No entanto, a partir desta data aparece já referenciado como uma das freguesias autónomas da cidade do Porto no território fora das muralhas da cidade. Mas Cedofeita conhece, a partir desta data, uma rápida expansão demográfica tornando-se durante o século XIX uma das zonas mais importantes para a expansão urbana da cidade e para a edificação de alguns dos mais notáveis edifícios públicos, coincidindo com a extinção da Colegiada e com a anulação do Couto e dos direitos senhoriais sobre este território.

Como se constata dos dados anteriormente referidos, a freguesia de Cedofeita é uma realidade com tradição histórica que, de acordo com o Censo de 2011, tinha22.077 habitantes.

Pelo que a extinção da freguesia de Cedofeita foi deliberada à revelia da opinião dos seus órgãos autárquicos que, na altura própria, manifestaram a discordância com esta decisão – posição que teve eco na posição assumida pela Assembleia Municipal do Porto que sempre manifestou a sua oposição ao processo de extinção de freguesias no Município do Porto.

Hoje, passado ano e meio desde a tomada de posse dos órgãos autárquicos da União de Freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória, constata-se que a extinção da freguesia de Cedofeita se traduziu numa perda para os moradores da sua área territorial.

Perda essa que se traduz:

• Na confusão introduzida nos registos dos seus habitantes, dado que é impraticável, em qualquer registo oficial, escrever o nome completo da “União de Freguesias”, tendo-se generalizado, por facilidade, a designação de “União de Freguesias do Centro Histórico”, que não tem qualquer validade;
• No afastamento dos órgãos do poder local democrático relativamente aos seus moradores;
• Na inexistência de uma verdadeira decentralização de competências da Câmara Municipal do Porto para a “União de Freguesias” (que era apontada como a principal vantagem do processo de extinção de freguesias) e que, de facto, se traduziu na transferência de competências marginais sem real impacto na vida das populações e sem ganhos de eficiência notórios ao nível da gestão de meios e dinheiros públicos;
• Nas dificuldades que os órgãos autárquicos têm para darem a devida atenção a uma “União de Freguesias” composta por realidades económicas e sociais muito diferenciadas e com uma extensão territorial e dimensão populacional muito elevadas;
• No encerramento de equipamentos sociais e de serviços públicos de proximidade que eram antes assegurados pela Junta de Freguesia de Cedofeita – situação agravada pela não adaptação da rede de transportes públicos à nova organização administrativa do território;
• Na inexistência de poupança de dinheiros públicos;
• No empobrecimento da essência participativa do Poder Local Democrático, com a redução de dezenas de eleitos de freguesia.

A extinção de freguesias protagonizada pelo Governo e por PSD e CDS-PP assenta no empobrecimento do nosso regime democrático. Envolto em falsos argumentos como a eficiência e coesão territorial, a extinção de freguesias conduziu à perda de proximidade, à redução de eleitos de freguesia e à redução da capacidade de intervenção. E contrariamente ao prometido, o Governo reduziu ainda a participação das freguesias nos recursos públicos do Estado.

O Grupo Parlamentar do PCP propõe a reposição das freguesias, garantindo a proximidade do Poder Local Democrático e melhores serviços públicos às populações. Assim, propomos a reposição da Freguesia de Cedofeita no Concelho do Porto.

Nestes termos, ao abrigo da alínea n) do artigo 164.º da Constituição da República e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo-assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Criação

É criada, no concelho do Porto a Freguesia de Cedofeita, com sede em Cedofeita.

Artigo 2.º
Limites territoriais

Os limites da nova freguesia coincidem com os da Freguesia de Cedofeita até à entrada em vigor da Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro.

Artigo 3.º
Comissão instaladora

1- A fim de promover as ações necessárias à instalação dos órgãos autárquicos da nova freguesia, será nomeada uma comissão instaladora, que funcionará no período de seis meses que antecedem o termo do mandato autárquico em curso.

2- Para o efeito consignado no número anterior, cabe à comissão instaladora preparar a realização das eleições para os órgãos autárquicos e executar todos os demais atos preparatórios estritamente necessários ao funcionamento da discriminação dos bens, universalidades, direitos e obrigações da freguesia de origem a transferir para a nova freguesia.

3- A comissão instaladora é nomeada pela Câmara Municipal do Porto com a antecedência mínima de 30 dias sobre o início de funções nos termos do n.º 1 do presente artigo, devendo integrar:

a) Um representante da Assembleia Municipal do Porto;
b) Um representante da Câmara Municipal do Porto;
c) Um representante da Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória;
d) Um representante da Junta de Freguesia da União de Freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória;
e) Cinco cidadãos eleitores da área da nova Freguesia de Cedofeita, designados tendo em conta os resultados das últimas eleições na área territorial correspondente à nova freguesia;

Artigo 4.º
Exercício de funções da comissão instaladora

A comissão instaladora exercerá as suas funções até à tomada de posse dos órgãos autárquicos da nova freguesia.

Artigo 5.º
Partilha de direitos e obrigações

Na repartição de direitos e obrigações existentes à data da criação da nova freguesia entre esta e a de origem, considera-se como critério orientador a situação vigente até à entrada em vigor da Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro.

Artigo 6.º
Extinção da União de Freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória

É extinta a União de Freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória por efeito da desanexação da área que passa a integrar a nova Freguesia de Cedofeita criada em conformidade com a presente lei.

Assembleia da República, em 20 de maio de 2015

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