Intervenção de Honório Novo na Assembleia de República

Cria uma taxa autónoma especial sobre transferências financeiras para paraísos fiscais

(projecto de lei n.º 40/XII/1.ª)

Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
Como todos sabem mas nem todos reconhecem, os paraísos fiscais são, em primeiro lugar, centros de fuga e de evasão fiscais institucionalizados. Representam perdas incalculáveis para os estados, representam fuga de capitais, degradação das receitas fiscais dos estados, degradação das contas públicas, provocando, naturalmente, a diminuição de recursos financeiras para, por exemplo, fazer face aos recibos verdes, que discutimos no ponto anterior da ordem do dia, ou, então, para políticas sociais efectivas.
Mas são também centros de branqueamento e lavagem de capitais, centros de criminalidade, de diversos tipos de tráficos, e ainda parqueamentos de produtos financeiros tóxicos e especulativos que permitem esconder prejuízos, salvar ou esconder gestões bancárias danosas — temos o exemplo do BPN — ou montar operações de ataque especulativo às dívidas soberanas ou aos mercados financeiros que deviam estar ao serviço da economia produtiva e da economia real.
Durante a crise e nestes últimos anos, muitos têm reconhecido que é necessário acabar com os paraísos fiscais, mas, apesar de se terem multiplicado muitas vozes e muita retórica, a verdade é que isso foi «sol de pouca dura», muito rapidamente as promessas foram esquecidas e os paraísos fiscais retomaram em pleno a sua actividade perversa, quase secreta, em muitos casos criminosa.
Aquilo a que assistimos, enquanto se sucedem os sucessivos planos de austeridade sobre os
trabalhadores e os povos, cada vez mais insuportáveis e injustos, é que o regabofe dos paraísos fiscais regressa em força.
Em Junho de 2009, estavam aplicados em paraísos fiscais mais de 16 000 milhões de euros de capitais saídos de Portugal, isto é, quase 10% do PIB nacional. No primeiro semestre de 2010, a banca nacional tinha concedido empréstimos para paraísos fiscais de mais de 10 000 milhões de euros.
O PCP entende que é necessário pôr fim a este espectáculo e a este regabofe. Por isso, propomos a criação de uma taxa de 25% sobre todas as transferências efectuadas por sujeitos passivos, singulares ou colectivos, com destino a qualquer tipo de entidade, singular ou colectiva, em paraísos fiscais.
Com esta taxa, nós, PCP, sabemos que não se consegue o objectivo que pretendemos, que é eliminar radicalmente os paraísos fiscais. O caminho para lá chegar tem de continuar através da insistência e da luta, mas com esta taxa prosseguem-se alguns objectivos justos: limitar e condicionar aqueles que transferem capitais para fugir às suas responsabilidades fiscais; limitar e condicionar o parqueamento de produtos financeiros destinado à actividade especulativa contra o País, contra os estados e contra os povos, e, naturalmente, obter-se receitas fiscais significativas para permitir, finalmente, que sejam os ricos, os poderosos e os especuladores deste País a contribuir, de facto, para uma maior equidade fiscal.
(…)
Sr. Presidente, vou tentar ser sintético.
Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
Alguém disse aqui que os paraísos fiscais são um cancro e que temos soluções perversas para resolver o problema da doença. A questão é que temos soluções; há quem diga que há soluções mas não as apresente e não as proponha, preferindo que a doença ataque as bases do Estado democrático.
Não estamos a propor eliminar os paraísos fiscais, nem combater transferências ilegais, nem fazer combate à evasão fiscal, como alguém aqui disse, estamos a propor, sim, taxar transferências que, infelizmente, são legais.
É só isso, mais nada! Transferências para paraísos fiscais, onde a receita fiscal, Sr.ª Deputada Vera Rodrigues, não existe! Na verdade, 2400 das 2700 empresas do offshore da Madeira pagam zero de IRC. Zero!
O Sr. Primeiro-Ministro, nestes últimos dias, esteve em Madrid, Paris e Berlim a tratar do problema da constitucionalização da dívida, mas não tivemos notícia de que estivesse a tratar do problema da eliminação dos paraísos fiscais. Pelo contrário, receamos bem que esteja a tratar da renovação do único paraíso fiscal em Portugal, Sr. Deputado Cristóvão Crespo, e isto é que é lamentável. Cai-vos a retórica ao chão com esta incapacidade de fazer alguma coisa para terminar com um regabofe fiscal.

  • Economia e Aparelho Produtivo
  • Poder Local e Regiões Autónomas
  • Assembleia da República
  • Intervenções