Projecto de Lei N.º 426/XII-2.ª

Cria um regime especial de declaração de morte presumida em caso de naufrágio de embarcações de pesca

Cria um regime especial de declaração de morte presumida em caso de naufrágio de embarcações de pesca

Os pescadores portugueses enfrentam condições muito adversas e muito perigosas no exercício da sua atividade para garantir a subsistência das suas famílias.

A necessidade, que obriga a correr mais riscos, os infortúnios, as condições atmosféricas e marítimas adversas e a própria natureza da profissão, resultam muitas vezes em acidentes graves.

A história do nosso país está, infelizmente, marcada por inúmeros naufrágios que levaram à morte de várias centenas de pescadores.

Sendo importante garantir que todas as medidas, equipamentos e condições de segurança sejam garantidas aos pescadores, a verdade é que o risco de acidentes graves e morte dificilmente deixará de existir.

Acontece que, aquando da morte de um pescador, muitas famílias ficam vários anos sem qualquer proteção e impossibilitadas de receber a indemnização a que têm direito pela morte do seu familiar em acidente de trabalho. Isto porque, em muitos dos naufrágios, os corpos dos pescadores não são encontrados, pelo que não podendo ser declarado o óbito, as famílias são obrigadas esperar o tempo necessário para ser declarada a morte presumida do seu familiar.

Ora, no que respeita à morte presumida, o código civil exige, no seu artigo 114.º como requisito, que tenham "decorridos dez anos sobre a data das últimas notícias, ou passados cinco anos, se entretanto o ausente houver completado oitenta anos de idade".

Para o PCP, estes critérios e tempos de espera para que seja declarada a morte presumida não são adequados, nem sequer justos, quando se trata de situações de naufrágios de embarcações de pesca.

Poderá dizer-se que a atual legislação permite intentar uma ação judicial para ser declarada a morte presumida, sem cumprir os prazos acima referidos, contudo, além da demora da própria ação judicial, têm que ser apresentadas provas suficientemente fortes que determinem como muito provável a morte do pescador, o que torna a ação judicial complexa e de resultado incerto.

Assim, são muitas as famílias que têm que passar um novo martírio, além da morte do seu familiar, e esperar 10 anos até que seja declarada a morte presumida e assim receberem a indemnizações a que têm direito por morte do seu familiar.

Escusado será dizer que a ausência de rendimentos por este período de tempo, provoca sérios problemas aos familiares das vítimas de naufrágio.

Atendendo a esta realidade, apenas a Mútua dos Pescadores procede ao pagamento antecipado das indemnizações por morte dos pescadores, respondendo ao drama social que se instala nas famílias enlutadas.

Contudo, esta prática não é comum nas restantes companhias de seguros, que obrigam ao decurso do tempo necessário para a declaração de morte presumida para pagar as indemnizações devidas.

Importa referir que o naufrágio de uma embarcação de pesca é hoje praticamente impossível de falsificar, graças ao seu registo obrigatório e o uso de equipamentos de geolocalização, a tripulação das embarcações tem que obrigatoriamente estar matriculada na respetiva capitania e os meios de salvamento e recuperação são muito evoluídos, pelo que é relativamente fácil identificar a embarcação sinistrada, a tripulação dessa embarcação e se esses tripulantes estão, com grande grau de certeza, mortos ou não.

Assim, O PCP entende que os critérios e as cautelas necessárias para a declaração de morte presumida devem ser alterados para as situações em que acorra um naufrágio de uma embarcação de pesca.

Nestes termos, e com o objetivo de acelerar o acesso às indemnizações por parte das famílias enlutadas, o PCP propõe criar um regime especial de morte presumida que permita determinar, de uma forma simples e pouco burocrática, a morte presumida dos pescadores vítimas de um naufrágio, caso o corpo desse pescador não seja encontrado num período de três meses após o acidente.

Com este regime, o PCP dá um importante contributo para mitigar o sofrimento e as dificuldades das famílias que perderam os dos seus para o mar.

Assim, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Âmbito
A presente lei cria um regime especial de morte presumida em caso de naufrágio de uma embarcação de pesca.

Artigo 2.º
Declaração de morte presumida
1- Decorridos 90 dias sobre a data do naufrágio de uma embarcação de pesca em que pereçam todos ou alguns dos pescadores matriculados na data do sinistro naquela embarcação, quando:
a) os cadáveres não forem encontrados;
b) os cadáveres tiverem sido destruídos em consequência do acidente ou só aparecerem despojos insuscetíveis de ser individualizados; ou
c) seja impossível chegar ao local onde os corpos se encontram,
podem os interessados a que se refere o artigo 100.º do Código Civil requerer a declaração de morte presumida.
2- Para instrução do processo, a autoridade marítima competente deve remeter ao Ministério Público o auto sobre a ocorrência e a identificação dos náufragos desaparecidos.

Artigo 3.º
Procedimentos e efeitos
Preenchidos os requisitos previstos no artigo anterior, cabe ao magistrado do Ministério Público junto da comarca em cuja área tiver ocorrido o acidente ou da residência do náufrago desaparecido, promover, por intermédio de qualquer conservatória do registo civil, a requerimento dos interessados e devidamente acompanhado com as declarações previstas no n.º 3 do artigo anterior, a justificação judicial do óbito do pescador ausente com os efeitos previstos nos artigos 115.º e seguintes do Código Civil.

Artigo 4.º
Direito subsidiário
Em tudo o que não se encontre expressamente regulado na presente lei, é aplicável subsidiariamente o disposto no Código Civil e no Código de Registo Civil.

Artigo 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

Assembleia da República, em 14 de junho de 2013

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