(Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro)
1. Os trabalhadores, os reformados, a generalidade do Povo que trabalha, os pequenos empresários deste País, não podem continuar a pagar quase sozinhos os custos de uma crise de que não foram nem são responsáveis, não podem continuar a sofrer na pele as consequências das políticas de austeridade cega impostas pelo FMI e pela União Europeia e servilmente levadas à prática, antes pelo Governo PS, agora pelo Governo do PSD e do CDS.
A banca e o sistema financeiro, que estiveram na origem da crise e que receberam milhares de milhões de euros de ajudas e garantias públicas, (como sucedeu no BPN, no BPP e como voltou há dias a suceder na mais recente rectificação do Orçamento proposta pelo Governo do PSD/CDS e aprovada pelo Partido Socialista), não podem deixar de ser responsabilizados pela situação e têm que ser convocados para “pagar a factura”.
Os grandes grupos económicos que, como a banca e o sistema financeiro, continuam a apresentar centenas de milhões de euros de lucros em plena crise, muito à custa dos aumentos da electricidade, do gás, dos combustíveis ou das comunicações, não podem continuar a não pagar o que é justo para enfrentar uma situação de que também são responsáveis ou foram sempre beneficiários.
E a verdade é que estes sectores económicos continuam a pagar muito pouco. O Relatório de Estabilidade Financeira do Banco de Portugal, relativo ao ano de 2010, mostra, por exemplo, que a tributação efectiva do sistema financeira se fixou naquele ano em 12,3% - menos de metade da taxa nominal de IRC. Da mesma forma, a informação estatística da Direcção Geral dos Impostos, relativa ao ano de 2007, mostra igualmente que a generalidade das empresas e grupos com rendimento colectável acima de 75 milhões de euros pagou naquele ano uma taxa efectiva de IRC de 12%.
Este números, apenas possíveis pela manutenção de uma imensa panóplia de benefícios fiscais e de múltiplos direitos a deduções e abatimentos, mostram à evidência a enorme injustiça na distribuição do esforço fiscal, por comparação com o aumento sucessivo e quase imparável da carga fiscal sobre os trabalhadores e os mais frágeis da sociedade, seja com o imposto extraordinário sobre o subsídio de Natal seja com os anunciados aumentos de IVA ou com a eliminação ou redução significativa de deduções de despesas de saúde.
2. Quem neste contexto quiser, usando a retórica e esquecendo o essencial, afirmar que com uma tributação especial apenas sobre os rendimentos mais elevados do trabalho dos designados mais ricos, pode resolver, por essa via exclusiva, a injustiça na distribuição do esforço fiscal em Portugal, está, consciente ou inconscientemente, a iludir o problema da verdadeira iniquidade fiscal e a deixar de fora da tributação e da justiça fiscal o património individual e colectivo, os enormes rendimentos e lucros por tributar recorrentemente obtidos por grupos financeiros e por grupos económicos, a existência de determinadas actividades ou operações que literalmente continuam sem qualquer tributação.
Por isso, quando se fala de tributar os ricos e poderosos, o PCP entende que esta ideia não pode ser ilusória ou metafórica, tem que ser coerente e consequente. Há que impor uma tributação adicional que deve onerar os grupos financeiros e económicos com lucros quase imorais face à crise que atravessamos, que tem que onerar as mais-valias bolsistas em sede de IRC, que tem que onerar com novas taxas as transacções financeiras nos mercados financeiros ou as transferências financeiras para paraísos fiscais e que, necessariamente, terá também que onerar o património imobiliário e os bens de luxo de sujeitos singulares e colectivos passíveis de serem identificados e conhecidos de forma imediata, automática e objectiva, sem esquecer os rendimentos de capital e os juros de depósito.
Nos últimos dias muita gente parece ter despertado para a necessidade de exigir maior esforço fiscal aos ricos e poderosos. Como se a injustiça na distribuição da riqueza em Portugal, os escandalosos benefícios, a enorme evasão fiscal e a baixa tributação da banca, dos grupos económicos e dos mais ricos fosse uma novidade descoberta na última semana.
Pena é que aqueles que, no PSD, no CDS e também no PS, se manifestam agora tão sensíveis e receptivos à tributação dos mais ricos e poderosos tenham todos rejeitado, na última legislatura, as diversas propostas que o PCP para introduzir alguma justiça fiscal em Portugal.
3. Quando há poucos meses o PCP propunha reforçar a tributação fiscal para quem possui carros de luxo, iates, aviões particulares, casas com valor acima de um milhões de euros, todos sem excepção, PSD, PS e CDS votaram contra!
Quando há poucos meses, o PCP quis criar um novo imposto aplicável às transacções em bolsa e às transferências financeiras para os paraísos fiscais, quando o PCP apresentou propostas para que a banca e os grandes grupos económicos pagassem a mesma taxa de imposto (IRC) que os pequenos empresários já pagam, quando o PCP apresentou propostas para limitar e condicionar o regabofe fiscal existente na Madeira, ou quando o PCP apresentou propostas para que as mais-valias mobiliárias de SGPS ou de Fundos de Investimento passassem a ser finalmente tributadas, o PS, o PSD e o CDS uniram-se e disseram sempre não.
Os que agora se mostram tão disponíveis para tributar os mais ricos, votaram há poucos meses contra todas e cada uma das iniciativas que o PCP apresentou para tributar os poderosos deste País.
Por tudo isto, e neste contexto, o PCP entende apresentar, conjuntamente com esta iniciativa legislativa, um pacote de outras iniciativas que incluem todas essas propostas, devidamente actualizadas. Veremos como é que o PS, o PSD e o CDS se vão agora comportar perante novas propostas para tributar os bens e o património de luxo, novas propostas para tributar adicionalmente os dividendos e outros rendimentos de capital, novas propostas para que a banca e os grandes grupos económicos percam benefícios fiscais e passem a pagar a taxa nominal de imposto (IRC), novas propostas para controlar os paraísos fiscais, incluindo o da Madeira, novas propostas para tributar as mais-valias bolsistas de SGPS, ou para passar a taxar as transacções em bolsa.
Não deixaremos também de propor uma tributação adicional, em sede de IRS, sobre os rendimentos de trabalho mais elevados. Esse é o objecto concreto desta iniciativa legislativa com a qual propomos criar um novo escalão para rendimentos superiores a 175000 euros.
Esta iniciativa legislativa em sede de IRS vai ser contudo acompanhada por uma outra proposta para a tributação adicional, em sede de IRS, dos dividendos distribuídos, e dos juros de depósitos nas situações em que estes não sejam aplicados em produtos de poupança, usando como inspiração os termos utilizados pelo Governo na sua recente Proposta de Lei n.º 1/XII.
Neste contexto, e ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP, abaixo assinados, apresentam o seguinte Projecto de Lei.
Artigo 1.º
Alteração ao Código do IRS
Os artigos 68.º, 71.º e 72.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-Lei n.º448-A/88, de 30 de Novembro, passam a ter a seguinte redacção:
“Artigo 68.º
[…]
1. [novo]. As taxas do imposto são as constantes da tabela seguinte:
Rendimento Colectável (em euros) Taxa Normal (em percentagem) Taxa Média (em percentagem)
Até 4 898 11,50 11,5000
De mais de 4 898 até 7 410 14,00 12,3475
De mais de 7 410 até 18 375 24,50 19,5993
De mais de 18 375 até 42 259 35,50 28,5861
De mais de 42 259 até 61 244 38,00 31,5043
De mais de 61 244 até 66 045 41,50 34,7575
De mais de 66 045 até 153 300 43,50 38,6450
De mais de 153300 até 175000 46,50 39,6190
Superior a 175 000 49,50 -
2. […]
Artigo 71.º
[…]
1.[…].
2.[…].
3.[…].
4.[…].
5.[…].
6.[…].
7.[…].
8.[…].
9.[…].
10.[…].
11.[…].
12.[novo]. Os rendimentos constantes dos números 1, 2 e 12 estão sujeitos ao regime previsto no n.º1 do artigo 72.º-A, que criou a sobretaxa extraordinária, à excepção dos constantes na alínea a) do n.º1 mas apenas na parte em que sejam aplicados em produtos de poupança por período não inferior a um ano.
Artigo 72.º
[…]
1.[…].
2.[…].
3.[…].
4.[…].
5.[…].
6.[…].
7.[…].
8.[…].
9.[…].
10.[…].
11.[novo]. Os rendimentos constantes do n.º5 estão sujeitos ao regime previsto no n.º1 do artigo 72.º-A, que criou a sobretaxa extraordinária, à excepção dos constantes nas alíneas b) e c) do n.º2 do artigo 5.º do Código do IRS, mas apenas na parte em que sejam aplicados em produtos de poupança por período não inferior a um ano”.
Artigo 2.º
Entrada em vigor
1. As alterações aos artigos 71.º e 72.º do Código do IRS, constantes do artigo anterior, entram em vigor no dia imediato ao da publicação do presente diploma.
2. A alteração ao artigo 68.º do Código do IRS, constante do artigo anterior, entra em vigor no dia 1 de Janeiro de 2012.
Assembleia da República, em 31 de Agosto de 2011