Petição manifestando-se contra a criação de uma secção de tauromaquia no Conselho Nacional de Cultura
(petição n.º 55/XI/1ª)
Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
Começo por saudar os peticionários que se dirigiram à Assembleia da República, exercendo um direito de participação política que nunca é demais sublinhar.
Nos vários considerandos da petição, os seus subscritores aduzem um conjunto de argumentos no sentido de justificar a oposição à decisão tomada pelo Governo de criar uma secção de tauromaquia no Conselho Nacional de Cultura e ainda no sentido de exigir a suspensão de quaisquer apoios, directos ou indirectos, do Estado às actividades tauromáquicas, incluindo a sua transmissão pela televisão pública.
A questão que a petição em apreço coloca é matéria complexa e controversa, que mobiliza frequentemente posições pessoais inflamadas e inflexíveis, quer por parte de quem entende as actividades tauromáquicas como um elemento da cultura e das tradições portuguesas que deve ser preservado, quer por parte daqueles que se lhe opõem e que entendem que se lhe deve pôr fim.
Considerando a questão do ponto de vista político, continuamos a afirmar que a cultura, as tradições e os costumes de um povo não podem ser encarados como elementos imutáveis e definitivos da sua história, não sendo igualmente matérias que se possam definir ou extinguir por decreto, em função de opiniões pessoais impostas a toda a comunidade, seja no sentido da sua aceitação, seja no sentido da sua extinção.
A cultura, as tradições e os costumes de um povo são elementos cuja validade depende essencialmente do seu enraizamento popular, correspondendo por isso à realidade concreta
de cada momento histórico, estando sujeitos à evolução em função das transformações sociais ocorridas.
É no contexto concreto das políticas culturais executadas pelo actual Governo PS que esta decisão de criação de uma secção de tauromaquia no Conselho Nacional de Cultura deve ser apreciada.
Esta decisão é, aliás, bem ilustrativa das práticas governativas e da natureza das políticas do actual Governo PS.
É ilustrativa das práticas políticas de um Governo que recusa a democracia participada, que recusa ouvir cidadãos e agentes culturais na definição de políticas concretas, que vota praticamente à inutilidade todas as estruturas consultivas, mas que não podia deixar de criar uma nova secção no Conselho Nacional de Cultura, precisamente uma das estruturas consultivas que para nada é consultada!
É igualmente ilustrativa da natureza das políticas de um Governo que procura mercantilizar todas as dimensões da vida cultural e artística do País e que, obviamente, não podia passar ao lado de uma actividade cuja dimensão económica e de negócio é significava.
Aliás, na resposta que enviou à Assembleia da República (já hoje aqui repetida pelo Sr. Deputado Vítor Fontes, na sua intervenção), o Ministério da Cultura afirma precisamente que «a tauromaquia atinge hoje uma dimensão que vai para além da sua componente artística. É ao mesmo tempo uma actividade de relevante importância económica».
E é aí que reside o problema de fundo, no verdadeiro critério da política cultural do PS, o critério do cifrão com que o Governo procura transformar em cultura do negócio todas as dimensões da cultura portuguesa, do teatro à música e à dança, da preservação do património material e imaterial ao cinema e às artes visuais, da cultura erudita à cultura mediática de massas ou à cultura popular.
Na batalha pela ruptura com estas políticas de mercantilização da cultura e pela exigência de uma verdadeira política cultural ao serviço do povo e do País, que corresponda à concepção de democracia afirmada na Constituição da República, podem os peticionarios e os portugueses continuar a contar com o PCP.