Projecto de Lei N.º 586/XII/3.ª

Criação da Freguesia de Caneças, no Concelho de Odivelas, Distrito de Lisboa

Criação da Freguesia de Caneças, no Concelho de Odivelas,  Distrito de Lisboa

I – Nota Introdutória

A Reforma Administrativa levada a efeito pelo governo PSD/CDS-PP à revelia e contra a vontade das populações consubstancia o enfraquecimento do Poder Local Democrático nascido com a Revolução de Abril de 1974, constituindo por isso um retrocesso na vida democrática do País.

Caneças, é uma das sete freguesias do concelho de Odivelas, um dos quatro concelhos que foram resultado do Poder Local Democrático, que nasceu de uma expectativa integrada e sustentada de toda uma comunidade que entendeu que era chegado o momento de assumir os seus destinos nas próprias mãos.

A liquidação de milhares de freguesias, imposta através das Leis n.ºs 22/2012 de 30 de Maio e 11-A/2013 de 28 de janeiro e que passou a vigorar após o ato eleitoral de setembro de 2013, em que a freguesia de Caneças foi extinta, sendo anexada à freguesia da Ramada, no Concelho de Odivelas, tem-se revelado ter sido uma atitude de empobrecimento democrático e da representação dos interesses e aspirações das populações que a presença de órgãos autárquicos assegura.

Tal como o PCP sempre disse e defendeu a extinção de ambas as freguesias Caneças e Ramada e a criação de uma nova freguesia, união de ambas, juntando uma freguesia de características rurais, como Caneças, com povoado disperso com quase um século de história, com características urbanas, de origem recente.

Os argumentos usados para justificar esta ofensiva, são falsos e injustificados.
As freguesias representam 0,1% do Orçamento de Estado.

No Concelho de Odivelas, a Freguesia de Caneças tem a sua identidade própria e o seu próprio enquadramento histórico, económico, social e cultural.

Reúne características geográficas, históricas, patrimoniais e culturais que nenhuma outra freguesia do Concelho de Odivelas detém.

Caneças, comporta uma das melhores manchas verdes da região, cuja proteção é incompatível com o aumento desmesurado do parque habitacional que se verifica na freguesia com a agregação à da Ramada.

Tem uma história rica de tradições, usos e costumes. São símbolos únicos da Freguesia de Caneças, as lavadeiras, os aguadeiros e os viveiristas de frutas e plantas. No seu património histórico e arquitetónico destacam-se as Quintas, as Fontes, as Antas e o poço do Aqueduto das Águas Livres.

II – Razões de Ordem histórica

Quanto à evolução administrativa, a povoação existe desde 1719. A Freguesia de Caneças, foi criada no dia 10 de setembro de 1915, por desanexação de Freguesia de Santa Maria de Loures, foi elevada à categoria de Vila em 16 de Agosto de 1991.

Em 2013, por força da Reforma administrativa do Poder Local, esta Freguesia foi extinta, e conjuntamente com a Freguesia da Ramada, criou-se a nova freguesia, designada por União das Freguesias da Ramada e Caneças.

Segundo alguns autores, a povoação de Caneças foi fundada pelos árabes. O topónimo deriva da palavra Caniça que significa templo dos cristãos. A lenda popular, no entanto, é outra. Diz o povo que na passagem de D. Dinis, pela povoação, alguém lhe ofereceu água numa caneca, e daí a perpetuação do nome.

O povoamento da freguesia está registado através de diversas provas documentais dos mais longínquos povos. Os Dolmens de Pedras Grandes e Batalhas, monumentos funerários de grandes dimensões, atestam à fixação do homem nestas terras desde o período megalítico.

Integram a história da freguesia, de forma importante, as inúmeras fontes que povoam o seu território. A qualidade e abundância das suas águas, levou à sua comercialização em bilhas de barro, muito famosas e procuradas até finais dos anos 60, em Lisboa.

Quando se fala em Caneças, é inevitável referir a vida rural e a cultura saloia que ainda hoje está representada na paisagem bucólica, nas fontes e na gastronomia, e integrada no desenvolvimento global do Concelho como um bastião de memória e evolução

Caneças tornou-se conhecida pela beleza natural dos seus espaços, pela pureza do seu ar e pela frescura das suas águas, qualidades estas que transformaram Caneças num local de veraneio e cura, e que contribuíram, em tempos, para o florescimento de três atividades económicas, a dos aguadeiros, a das lavadeiras, e a dos viveiristas.

Graças à relação que as gentes de Caneças estabeleceram com a capital, veio esta terra a ser local preferido, pela classe média de Lisboa, para veranear.

Os canecenses prestavam serviços aos lisboetas, vendiam-lhes as hortaliças e os frutos, a "criação", o queijo, o leite e a água, "boa para curar anemias e indisposições de estômago e intestinos".

Até meados do século XIX, Lisboa era uma cidade suja, afetada por numerosas epidemias. Os cidadãos ricos pagavam aos Aguadeiros, entre os quais os de Caneças, para lhes levarem água a casa. Caneças e as suas águas eram, então, muito apreciadas pela sua qualidade.

Lisboa era o grande mercado para a água de Caneças, o que motivou o aparecimento das fontes - Fontainhas, Castanheiros, Piçarras, Passarinhos, Castelo de Vide, Fonte Velha, Fonte Santa e Fonte do Ouro, que comercializaram água e que constituem um marco de uma época e de modos de vida caraterísticos da freguesia, e em sentido mais lato do concelho. A venda da água de Caneças fazia-se através de carroças ou galeras, que transportavam para Lisboa e arredores a água em bilhas de barro, juntamente com as trouxas de roupa das lavadeiras e produtos hortícolas.

Em terras de Caneças se exploraram nascentes cujas águas foram conduzidas até à Mãe de Água Nova, em Carenque e, daí, até Lisboa, pelo Aqueduto das Águas Livres.

A noroeste da povoação, as mães de água indicam os locais de captação e as condutas mostram o caminho que a água percorria, até ao seu destino.

O terramoto de 1755 causa grandes estragos na região mas leva também a que muitos lisboetas se venham fixar na zona, à procura de ares mais saudáveis. Talvez por isso, e na esperança de cura, aqui tenha procurado repouso Cesário Verde, que residiu durante algum tempo, no Lugar d’Além, antes de se transferir para o Paço do Lumiar, onde veio a falecer.

Locais de Interesse

Igreja Matriz de Caneças

Anta das Pedras Grandes
Detetados os restos da mamoa e o contraforte dos esteios da câmara.
Anta com câmara formada por 7 esteios e um pequeno corredor virado a Sudoeste. Esta estrutura de grandes blocos calcários foi utilizada como espaço funerário, durante o Neolítico final e Calcolítico. (4º-3º milénios a.c.)

Localização: Bairro do Casal Novo, Caneças

Aquedutos

Delineado pelos arquitetos Manuel da Maia e Custódio Vieira, o aqueduto das Águas Livres é composto pelo Aqueduto Principal localizado nas Amoreiras, e cujas galerias se destinavam à distribuição urbana, e por aquedutos subsidiários, que traziam novos caudais de água, de reforço à parte ocidental da cidade, em expansão.

É neste contexto, que foram construídos em Caneças, previsivelmente na segunda metade do séc. XVIII, quatro aquedutos subsidiários para levar a Lisboa as águas das nascentes de Caneças. Os quatro aquedutos — identificando-se aqui o Aqueduto do Olival do Santíssimo como aqueduto principal, e os aquedutos do Poço da Bomba, Vale da Moura e Carvalheiro como abastecedores deste - foram desativados na década de 70, por falta de qualidade das águas e diminuição dos caudais das suas nascentes.

FONTES

Fonte dos Castanheiros
Uma fachada de três arcos de volta perfeita dá acesso ao interior da mesma Fonte e Quinta eram frequentadas pelos forasteiros que acorriam a Caneças em busca do seu bom ar e das boas águas. Como todas as outras Fontes, entre o período de 1938 e a década de 50, terá abrandado lentamente o volume de vendas, até que em 1960 recebeu um ofício da antiga Direção Geral de Minas e Serviços Geológicos para iniciar um novo processo de licenciamento. Este não teve continuidade.

Fonte de Castelo de Vide
O processo de legalização da Fonte da Quinta de Castelo de Vide, para a exploração e comercialização da sua água como água de mesa, iniciou-se em 1932. No entanto, a licença concedida pela antiga Direção Geral de Minas e Serviços Geológicos apenas teve lugar em abril de 1933.
A laboração manteve-se até ter autorização. No entanto, nos anos 50, o volume de negócios já indica pouca Atividade.

Em 1977 é cancelada a possibilidade de vender água em bilhas de barro. A autorização da exploração é concedida novamente em 1982, com a condição da realização de investimentos e renovação da maquinaria. De idade avançada, e com um orçamento representando um montante de investimento elevado, o proprietário não conseguiu dar andamento ao processo.

Fonte das Fontainhas
O aspeto atual desta fonte, decorre das obras realizadas em 1910 e 1932; no entanto, a exploração e venda das suas águas não é autorizada pela antiga Direção Geral de Minas e Serviços Geológicos, após pedido efetuado em 1938.
Em 1989, foram efetuadas obras de limpeza e restauro, tendo sido construídas algumas infraestruturas de apoio aos visitantes, nomeadamente parque de merendas, parque infantil, instalações sanitárias e estacionamento.

Fonte dos Passarinhos
Concedida a licença para comercialização de água de mesa, por portaria de 1935, a Empresa Fonte dos Passarinhos explorava e vendia a sua água nas tradicionais bilhas de barro. Em 1960 recebeu diretrizes da antiga Direção Geral de Minas e Serviços Geológicos para proceder a um novo licenciamento que não teve continuidade

Fonte das Piçarras
A autorização para a exploração e venda de água, chega através da portaria de 5 de abril de 1933; a partir de 1960 perde esta autorização e finda a sua Atividade.

Quintas
Quinta das Águas Férreas
Quinta da Fonte Santa (propriedade do Banco de Portugal)

A Quinta da Fonte Santa foi adquirida em 1989 pelo Banco de Portugal para local de lazer de funcionários e convidados do Banco e suas famílias. A propriedade sofreu várias remodelações, que a tornaram num local ideal para recreio.

III – Razões de ordem demográfica e geográfica

Caracterização da Freguesia de Caneças:
Caneças confina com Famões, Ramada e com os Concelhos de Sintra e de Loures. Com uma área de 5,89 km2, tem, de acordo com os dados dos censos de 2011, 12 324 habitantes, 4 548 famílias residentes. Dispõe de 5 543 alojamentos e 2 944 edifícios.

Evolução da população de Caneças (1920 – 2011)
1920 - 1 095
1930 - 1 147
1991 - 9 711
2001 - 10 647
2011 - 12 324

IV – Atividades Industriais e comerciais

Dados de 2012, revelam que a freguesia de Caneças dispõe de 475 empresas sendo 2 empresas ligadas ao setor primário; 54 indústrias transformadoras, 3 de captação, gestão de resíduos e despoluição; 105 de construção; 141 de comércio por grosso e a retalho e de motociclos; 38 de transporte e armazenagem; 38 de alojamento, restauração e similares; 8 de atividades de informação e de comunicação; 4 de atividades financeiras e de seguros; 16 de atividades imobiliárias; 17 de atividades de consultadoria, cientificas, técnicas e similares; 12 de atividades administrativas e dos serviços de apoio; 7 de atividades na área da educação; 20 de atividades na área da saúde humana e apoio social; 7 de atividades artísticas, de espetáculos, desportivas e recreativas e 18 de outras atividades de serviços.

A freguesia de Caneças dispõe também de 4 dependências de instituições bancárias.

V – Equipamentos coletivos

a) Sede da junta de freguesia
b) Casa da Cultura
c) Pólo da Biblioteca Municipal
d) Mercado – 1
e) Estabelecimentos de ensino – 5

E. B. 2º e 3º Ciclos dos Castanheiros
E. B. 1º Ciclo de Caneças
E. B. 1º Ciclo / JI n.º 1 de Campos de Caneças
E. B. 1º Ciclo / JI n.º 1 Cesário Verde (Casal Novo)
Escola Secundária de Caneças

f) Centro de Saúde de Odivelas – Extensão de Saúde de Caneças
g) Farmácias – 2 (Caneças e Casal Novo)
h) Cemitério – 1
i) Polidesportivos – 4. As escolas EB 2,3, EB1/JI do Casal Novo e EB1/JI dos Campos de Caneças, com polidesportivos descobertos, mais 1 polidesportivo descoberto no Lugar d’Além.
j) Pavilhão gimnodesportivo na Escola Secundária
k) Posto de Correio – 1
l) Esquadra da PSP
m) Terminal Rodoviário

VI – Movimento Associativo – 7

Sociedade Musical e Desportiva de Caneças – coletividade centenária, com banda de música, escola de futebol e ginástica

APSS – Esperanças da Ponte da Bica
Associação dos Amigos de Caneças
Secção Desportiva e Cultural da Associação de Moradores Bairro das Sete Quintas
Secção Desportiva e Cultural da Associação de Moradores do Casal Novo
Secção Desportiva e Cultural da Associação de Moradores do Arco Maria Teresa
Sociedade Recreativa Unidos ao Botafogo

VII – IPSS

Obra Imaculada Conceição e Sto. António (Obra do Padre Abel)
Casa de Repouso da Enfermagem e Profissões Auxiliares de Saúde
Comissão Unitária dos Reformados Pensionistas e Idosos de Caneças
Associação de Bombeiros Voluntários de Caneças

VIII – Transportes Públicos

A freguesia é servida pela Rodoviária de Lisboa, e pela VIMECA e tem praça de Táxis.

A Rodoviária de Lisboa dispõe de 15 carreiras. Destas, 4 fazem ligação ao metro no Sr. Roubado e Odivelas, 1 ao metro na Pontinha. 2 ao metro do Campo Grande e Colégio Militar. Outras fazem ligação entre os vários lugares da freguesia e concelhos vizinhos. Uma passa pelo Hospital Beatriz Ângelo em Loures. Há ainda uma carreira urbana, que funciona especificamente no período escolar.

As carreiras e percursos da VIMECA são residuais, em 3 ou 4 percursos de circulação, que servem a periferia da freguesia.

A extinção de freguesias protagonizada pelo Governo e por PSD e CDS-PP assenta no empobrecimento do nosso regime democrático. Envolto em falsos argumentos como a eficiência e coesão territorial, a extinção de freguesias conduziu à perda de proximidade, à redução de milhares de eleitos de freguesia e à redução da capacidade de intervenção. E contrariamente ao prometido, o Governo reduziu ainda a participação das freguesias nos recursos públicos do Estado.

O Grupo Parlamentar do PCP propõe a reposição das freguesias, garantindo a proximidade do Poder Local Democrático e melhores serviços públicos às populações. Assim, propomos a reposição da Freguesia de Caneças no Concelho de Odivelas.

Nestes termos, ao abrigo da alínea n) do artigo 164.º da Constituição da República e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo-assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Criação
É criada, no concelho de Odivelas a Freguesia de Caneças, com sede em Caneças.

Artigo 2.º

Limites territoriais
Os limites da nova freguesia coincidem com os da Freguesia de Caneças até à entrada em vigor da Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro.

Artigo 3.º

Comissão instaladora

1- A fim de promover as ações necessárias à instalação dos órgãos autárquicos da nova freguesia, será nomeada uma comissão instaladora, que funcionará no período de seis meses que antecedem o termo do mandato autárquico em curso.

2- Para o efeito consignado no número anterior, cabe à comissão instaladora preparar a realização das eleições para os órgãos autárquicos e executar todos os demais atos preparatórios estritamente necessários ao funcionamento da discriminação dos bens, universalidades, direitos e obrigações da freguesia de origem a transferir para a nova freguesia.

3- A comissão instaladora é nomeada pela Câmara Municipal de Odivelas com a antecedência mínima de 30 dias sobre o início de funções nos termos do n.º 1 do presente artigo, devendo integrar:

a) Um representante da Assembleia Municipal de Odivelas;
b) Um representante da Câmara Municipal de Odivelas;
c) Um representante da Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Ramada e Caneças;
d) Um representante da Junta de Freguesia da União das Freguesias de Ramada e Caneças;
e) Cinco cidadãos eleitores da área da nova Freguesia de Caneças, designados tendo em conta os resultados das últimas eleições na área territorial correspondente à nova freguesia.

Artigo 4.º

Exercício de funções da comissão Instaladora
A comissão Instaladora exercerá as suas funções até à tomada de posse dos órgãos autárquicos da nova freguesia.

Artigo 5.º

Partilha de direitos e obrigações
Na repartição de direitos e obrigações existentes à data da criação da nova freguesia entre esta e a de origem, considera-se como critério orientador a situação vigente até à entrada em vigor da Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro.

Artigo 6.º

Extinção da União das Freguesias de Ramada e Caneças
É extinta a União das Freguesias de Ramada e Caneças por efeito da desanexação da área que passa a integrar a nova Freguesia de Caneças criada em conformidade com a presente lei.

Assembleia da República, 24 de abril de 2014

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