Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

"Cresce o número daqueles que lutam pela derrota deste governo"

No debate quinzenal realizado hoje na Assembleia da República, o Secretário-Geral do PCP confrontou o governo com os autoelogios constantes que este faz sobre as suas políticas, contrastando com a realidade cada vez mais sombria para os trabalhadores e para o povo. Neste final de ano, uma das esperanças dos portugueses é demissão deste governo e a realização de eleições antecipadas, concluiu.
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Debate quinzenal com o Primeiro-Ministro sobre as questões políticas, económicas e sociais

Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Gostaria de começar por deixar uma nota: intervenções como a que fez só desconsideram as dificuldades que hoje os portugueses sentem nas suas vidas.
O Sr. Primeiro-Ministro considerou que a sua política, a execução do pacto de agressão, está a ser um êxito, que estamos no bom caminho, que há sinais para aqui e para acolá… Escolheu bem o dia para dizer tal coisa, uma sexta-feira dia 13. Faço-lhe uma proposta: acerte melhor o debate para o dia 1 de abril, dia das mentiras, porque é o que justifica melhor a sua intervenção.
Estamos, de facto, num País mais dependente, mais endividado, com mais pobreza, com mais exploração, com mais injustiças, e o Sr. Primeiro-Ministro vem dizer que a sua política tem sido um êxito.
O grande problema é que essa propaganda discursiva confronta e afronta a realidade que vivemos.
Dizem que há sinais de que o PIB cresceu ou, melhor dizendo, à cautela, que há um abrandamento da recessão, não dizendo nunca que aquilo que, de facto, cresceu foi o número de multimilionários e as 25 maiores fortunas do nosso País, nunca dizendo que aquilo que cresceu, de facto, foram os portugueses que estão em situação de pobreza ou em risco de pobreza e que são 2,7 milhões.
Com estas duas estatísticas, Sr. Primeiro-Ministro — fala sempre tanto em estatísticas —, ainda se atreve a vir aqui dizer que os sacrifícios têm sido equitativos?!
Dizem que austeridade está a abrandar. A verdade é que, ainda ontem, confirmou, na entrevista que deu, que o saque aos salários e às pensões não só é para continuar como também é para perpetuar.
Vivemos num País em que os trabalhadores, depois da sua governação, trabalham mais e recebem menos.
Dizem que o desemprego está a diminuir — ainda há pouco fez esse exercício. O que não diz é que cresceu o número de jovens desempregados e emigrados, jovens que hoje crescem no vazio, jovens que hoje não têm uma ponta de esperança em relação ao futuro.
O Sr. Primeiro-Ministro falou de emprego. Trata-se do mesmo Governo que se prepara para despedir milhares de trabalhadores da Administração Pública, colocando-os até ao fim do ano na «incubadora» da mobilidade, o mesmo Governo que quer despedir 600 trabalhadores nos Estaleiros de Viana do Castelo. Como é que acerta a cara com a careta?
O Sr. Primeiro-Ministro vem dizer que este Governo considera que vai haver mais emprego, quando é o autor material de despedimentos em massa!
Sr. Primeiro-Ministro, consideramos que esta política está a conduzir Portugal para o desastre e, por isso mesmo, comecei a intervenção com uma crítica, ou uma acusação, se quiser. Como é que, neste País, que pulsa hoje de indignação, neste País, em que há sofrimento resultante do desemprego, da pobreza, dos cortes, de uma política que está a transferir apenas para os poderosos, para o grande capital, milhares de milhões à custa desse sacrifício, pode dizer aqui, nesta Casa, com todos portugueses a ouvir, que as coisas vão no bom caminho?! Está enganado! Não minta mais! Diga a verdade. Enquanto este Governo se mantiver a governar, nunca mais conseguimos resolver os problemas.
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro, aquilo que nos diferencia, de facto, é que, recusando a realidade que hoje existe no nosso País, em que ninguém acredita que é preciso demolir, destruir, destruir vidas, inclusive… Sim, porque quando falamos em destruir vidas estamos a falar daqueles que perderam o emprego, que viram a sua reforma, a sua pensão cortada, falamos daqueles jovens que não têm saída, que não têm alternativa. Acha que isto não é destruir vidas, Sr. Primeiro-Ministro?!
É essa a diferença que existe entre nós!
O senhor fala dos sacrifícios, das dificuldades, com aquela compreensão beata — não se zangue com o termo — do «coitadinhos, mas nós estamos a fazer o melhor…» Mas ninguém acredita que surgirá das cinzas, como uma Fénix renascida, dessas cinzas que os senhores estão a provocar, uma solução para o nosso País.
Ontem, na entrevista que deu, o Sr. Primeiro-Ministro disse: «Estou profundamente tranquilo em relação a qualquer manifestação de protesto, de indignação.» A sua preocupação são os mercados — aí está, Sr. Ministro! Essa é a conceção fundamental, a natureza da sua política, que se preocupa com os mercados — o que é que são os mercados? —, com os megabancos, naturalmente, com as instituições financeiras, com esses interesses. Mas uma manifestação das gentes que se indignam por verem a sua vida a andar para trás não o preocupa nada!
Pois, engano, Sr. Primeiro-Ministro, eu não falei aqui de outro crescimento. É que, entretanto, com a sua política, cresceu o número daqueles que lutam com indignação, que protestam, que participam na luta, alguns dos quais nunca tinham lutado na vida.
E esse vai ser o fator fundamental para que, neste final de ano, uma das esperanças dos portugueses seja esta: desejo de vos ver pelas costas, com a demissão do Governo e com a convocação de eleições antecipadas.

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