Intervenção de

Constituição imediata de associações - Intervenção de Miguel Tiago na AR

Regime especial de constituição imediata de associações e actualiza o regime geral de constituição previsto no Código Civil

 

Sr. Presidente,

Depois deste fantástico exercício que acabámos de presenciar, isto é, a uma resposta do Sr. Secretário de Estado que, em 3 minutos, não conseguiu responder à questão colocada - que era só uma, e simples -, queria manifestar que, da parte do PCP, há um acordo claro, na generalidade, com o conteúdo da proposta de lei, pese embora estes «malabarismos» que o Governo vai utilizando, com um estilo a que infelizmente já nos habituou, ou seja, o de fazer propaganda das piores maneiras e muitas vezes à revelia e subalternizando esta Assembleia.

De facto, não entendemos que esta proposta de lei venha fazer a valorização necessária do associativismo, embora seja um passo em frente, pois, efectivamente, garante a descomplicação e a desburocratização de um conjunto de processos administrativos necessários para a constituição de uma associação. De facto, consiste num certo reconhecimento, que consideramos inevitável, de que o tecido associativo do País cumpre um papel essencial na dinamização e na garantia dos direitos das populações, muitas vezes até no cumprimento de serviços que caberiam ao Estado, mas que este não garante, pelo que as associações acabam por cumprir esse papel. Quando deveríamos estar perante uma acção de cooperação entre as associações e o Estado, acaba por ser a associação a cumprir o papel do Estado.

Obviamente, o Governo não pode deixar de reconhecer esse facto e, por isso, terá de valorizar, por esta via, o associativismo.

Uma das questões centrais que se sempre se colocou para o bom funcionamento do associativismo tem a ver com a desburocratização dos processos que possibilitam a constituição de uma associação - e o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português sempre teve essa posição Sr. Secretário de Estado, no entanto levantam-se algumas dúvidas. O PCP manifesta concordância genérica com a proposta de lei, mas na especialidade tentará compreender melhor, através da discussão, as propostas do Governo e também dará alguns contributos.

Entretanto, gostaria, desde já, de dar conta de algumas questões.

A proposta de lei refere que as associações de estudantes serão beneficiadas em 100 € nas taxas e emolumentos subjacentes ao processo da «associação na hora». Ora, uma vez que, actualmente, o processo de constituição de uma associação de estudantes é gratuito, há aqui uma incongruência com a lei do associativismo juvenil, que este mesmo Governo aprovou, que não atribui às associações de estudantes qualquer taxa para a sua constituição. Relembro que as associações de estudantes dependem quase exclusivamente do financiamento do próprio Estado e, portanto, não fará sentido cobrar, à cabeça, uma taxa para a sua constituição.

Mas há outras questões, que têm a ver com os estatutos e o modelo de estatutos. Gostaríamos de saber se existe um modelo que o Governo preconiza como único ou se, pelo contrário, prevê uma bolsa de estatutos diferentes de onde se poderá fazer alguma escolha para cada associação. É que, Sr. Secretário de Estado, há associações de âmbitos radicalmente diferentes: uma associação juvenil, uma associação estudantil ou uma associação ambiental não podem ser regidas por um estatuto «chapa 5», que é o único a que podem recorrer na «associação na hora». Caso contrário, têm de ir pelo mecanismo tradicional do regime geral da constituição das associações e, portanto, ficam também a perder por não haver uma capacidade de resposta da parte do Estado aos estatutos concretos, de forma a que se adaptem minimamente aos diferentes âmbitos das associações.

Estas são algumas das questões que para já colocamos. Haverá outras, certamente, mas não queria terminar sem dizer ao Sr. Secretário de Estado e aos Srs. Deputados que se por um lado esta proposta de lei não é indiferente para o PCP também não julgamos que o Governo possa afirmar que, com ela, se valoriza o movimento associativo. De facto, há desde 2003 uma lei que promove o reconhecimento e a valorização do movimento associativo popular e que está ainda por regulamentar. Esta lei diz, inclusivamente, que o movimento associativo popular goza do estatuto de parceiro social e, como digo, está há quatro anos por regulamentar, não obstante os requerimentos e as demais pressões que o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português e, eventualmente, outros grupos parlamentares têm vindo a fazer.

Estou certo, aliás, de que o próprio movimento associativo popular tem feito pressões através das suas estruturas e associações.

Ora, este passo é essencial para o verdadeiro reconhecimento e valorização do movimento associativo popular, como importante teria sido que o Governo acolhesse algumas alterações propostas à Lei de Bases do Desporto e tomasse outras medidas para reconhecer e valorizar este movimento associativo.

Esta proposta de lei é, de facto, um passo positivo, não o negamos, e, por essa razão, votá-la-emos de forma favorável sem nos demitirmos de, na especialidade, darmos o nosso contributo, levantando as dúvidas que temos.

 

  • Assuntos e Sectores Sociais
  • Assembleia da República
  • Intervenções