Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

Congresso do PS, realizado nos dias 29 e 30 de novembro p.p.

Sr.ª Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,
Sr. Deputado João Galamba,
Democraticamente, quero saudá-lo e saudar o PS, por seu intermédio, pela realização do Congresso e queria colocar-lhe algumas questões que, no nosso entender, são preocupações, ou são, pelo menos, dúvidas que têm de ficar clarificadas, essencialmente sobre dois aspetos do Congresso.
O primeiro aspeto tem a ver com um discurso de pretensa viragem à esquerda do Partido Socialista sem que, no entanto, seja assumido nenhum compromisso para uma política de esquerda e sem que, tão pouco, seja assumido um compromisso claro de rutura com a política de direita.
O segundo aspeto está relacionado com o primeiro e tem a ver com essa pretensa viragem à esquerda assentar num discurso de convergências, de romper bloqueios à esquerda, mas esse discurso ser feito na base da chantagem, da ameaça e até do insulto perante aqueles com quem dizem querer convergir.
Registo que o Sr. Deputado, na sua declaração política, não assumiu esta lógica de abordagem, mas ela resultou, de facto, da intervenção de encerramento daquele Congresso.
O Sr. Deputado, na sua intervenção, criticou a ação do Governo e criticou a política que o Governo executou. É um facto que essa ação do Governo e a política que executou devem ser motivo de crítica, mas devem ser, também, motivo de protesto e, no Congresso do Partido Socialista, essa luta que os portugueses travaram durante estes três anos contra a política do Governo foi classificada como mero protesto.
Sr. Deputado, no PCP, julgamos que não é honesto classificar como mero protesto uma luta justíssima que os portugueses travaram contra a política do Governo, que não foi só uma luta de protesto mas uma luta de soluções para resolver os problemas que estavam a ser criados por este Governo nas suas vidas, designadamente exigindo a solução da demissão do Governo — infelizmente, enquanto o PS se sentava em Belém, assumindo compromissos para que o Governo se mantivesse em funções.
Essa foi uma luta por soluções, e foram também soluções aquelas que foram trazidas, nos últimos anos, à Assembleia da República para resolver os problemas criados nas vidas dos portugueses.
No Congresso do Partido Socialista também foi dito que não havia soluções à esquerda para os problemas do País. Sr. Deputado, queria dizer-lhe que, nesta Legislatura, foram 314 as iniciativas que o PCP trouxe à Assembleia da República, relativamente às quais o PS votou contra ou se absteve, e iniciativas com soluções para problemas como a renegociação da dívida, o tratado orçamental, os cortes nos salários, os despedimentos na Administração Pública, os transportes dos doentes, os problemas do aumento das rendas da habitação social, das proteções das médias e pequenas empresas face aos monopólios.
Sr. Deputado João Galamba, são soluções concretas para problemas concretos da vida nacional, relativamente aos quais o PS entendeu votar contra ou abster-se. O PS pode ter as posições que quiser, não pode é acusar-nos de não termos soluções para os problemas do País, porque nós apresentamo-las aqui, todos os dias, e os senhores tomam posição perante elas.
Sr. Deputado, para concluir, queria perguntar-lhe, muito concretamente, que compromissos é que o Partido Socialista assume para romper com a política de direita e para fazer uma política de esquerda. É que a política de direita faz-se de opções concretas, faz-se de cortes nos salários, de leis laborais que agravam a exploração, de privatizações, de benefícios à banca e aos grupos económicos, faz-se da especulação com a dívida, e nós queríamos saber, Sr. Deputado João Galamba, quais são os compromissos do PS para romper com esta política.
Gostaríamos que clarificassem, também, quais são os compromissos para fazer uma política de esquerda, porque não basta dizer que se quer fazer uma política de esquerda. É preciso saber quais são os compromissos para essa política de esquerda e, sobretudo, é preciso saber quais são os compromissos porque há um passado, Sr. Deputado João Galamba.
E também gostaria de lhe dizer isto de uma forma muito franca: nunca foi o PCP que empurrou o PS para a direita. Infelizmente, o PS sempre que foi para a direita foi pelo seu próprio pé.

E há um passado muito concreto em relação a isso, Sr. Deputado João Galamba. Quando o PS teve uma maioria absoluta nesta Assembleia da República, quando não precisava de nada nem ninguém para fazer alianças e para fazer políticas de esquerda, infelizmente, foi procurar no PSD o apoio para, por exemplo, fazer o pacto para a justiça; infelizmente, foi procurar no PSD o apoio para muitas políticas económicas que não são políticas de esquerda e, portanto, importava perceber quais são, efetivamente, os compromissos do Partido Socialista para fazer uma política de esquerda. É que não basta fazer um discurso à esquerda para obter hoje votos e maiorias se depois, amanhã, isso servir para fazer uma política de direita.

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