Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral

Comício no Porto - Intervenção de Jerónimo de Sousa

 

 

[Extractos] 

A
ofensiva contra a Segurança Social pública e particularmente contra o conjunto
de direitos de protecção social dos trabalhadores e do povo, impôs-nos que lhe
reservássemos uma particular atenção e prioridade.

Prioridade
no esclarecimento e na denúncia do conteúdo e natureza das propostas do Governo
do PS sobre a Segurança Social. Prioridade na mobilização para o protesto e
para a organização da luta contra medidas que atingem profundamente os
interesses dos trabalhadores, dos reformados e de todas as camadas da população
cobertas pelo nosso sistema de protecção social.

É
verdade, temo-lo afirmado, que o ataque que o governo do PS desenvolve contra a
Segurança Social pública e os direitos dos trabalhadores e dos reformados é
apenas uma componente de uma vasta ofensiva, uma ofensiva global que se
desenvolve em várias frentes.

Ofensiva
que visa os direitos sociais e laborais dos trabalhadores do sector privado e
da Administração Pública, os serviços públicos indispensáveis às populações,
nomeadamente nos domínios da educação e da saúde, tal como aspectos essenciais
do próprio regime democrático.

Uma
grave ofensiva que vai contra os interesses de amplas camadas do nosso povo e
que é motivo do protesto e de luta de muitos e variados sectores da sociedade
portuguesa que é necessário continuar a potenciar.

Sabemos,
por isso, que hoje são múltiplas as preocupações e grande a inquietação nos
trabalhadores e nas outras camadas populares que resultaram em múltiplas
prioridades de intervenção, mas a particular atenção que decidimos dar à
questão da Segurança Social com a Campanha nacional do PCP justifica-se, não
apenas por esta é uma questão vital para os trabalhadores e para o povo, mas
porque a proposta do governo do PS vai estar no imediato na Assembleia da
República. 

O que está em jogo com aquilo a que o governo do PS
de José Sócrates chama “reforma” da Segurança Social e que urge combater não é
apenas um conjunto de medidas que abrem o caminho à alteração dos fundamentos
do nosso modelo de Segurança Social, assente nos princípios da solidariedade, o
que por si só já não era pouco, mas os direitos concretos dos trabalhadores e
do povo, nomeadamente o direito a uma reforma digna, hoje e no futuro.

O que está em jogo no projecto do governo do PS é
uma concepção de reforma da Segurança Social realizada exclusivamente à custa
do sacrifício e dos direitos dos trabalhadores.

O que está em jogo e é inaceitável e indecoroso
nesta iniciativa do governo do PS é que ela foi pensada e concebida, exigindo
sacrifícios apenas a um lado, aos mesmos de sempre, ao mundo do trabalho e mais
uma vez isentando o capital e o patronato de qualquer contributo para melhorar
o nosso ainda débil, mas muito importante, sistema de protecção social.

E dizemos débil, não porque pensemos que o sistema
de Segurança Social está falido ou em vias de falência como quer fazer crer a
mistificadora campanha do governo, dos partidos da direita PSD e CDS-PP e do
grande capital para justificar a mutilação dos direitos e o ataque às reformas
e às pensões.

A segurança social não está falida ou em vias de falência.

Dizemos débil, porque os direitos de protecção
social dos portugueses estão muito aquém dos direitos de protecção da
generalidade dos trabalhadores da União Europeia.

O que é inadmissível nesta dita “reforma” do governo
do PS é a ideia que lhe está subjacente que os trabalhadores e o povo português
têm direitos a mais.

O que esta “reforma” transporta e que querem
esconder, como o governo do PS quer com as suas propostas e que outros, como o
PSD e CDS já não conseguem disfarçar é a implementação de uma segurança social
pública de mínimos, residual e assistencialista apenas para os mais pobres dos
pobres, construída sobre os escombros do actual sistema de segurança social.

Alguns acharão um exagero esta afirmação. Mas
camaradas e amigos, alguém viu o PS e o seu governo a demarcar-se da proposta
de Lei de Bases da Segurança Social aprovada pelo anterior governo do
PSD/CDS-PP que estabelece a existência de três sistemas: o sistema público, o
sistema complementar e o sistema de acção social e que claramente visa retirar
ao sistema público o papel central que presentemente tem?

Ninguém viu!

O que se vê é o governo do PS assumir a filosofia da
Lei de Bases dos partidos da direita com a criação de um sistema complementar
de contas individuais que, embora público, introduz o sistema de capitalização
no cálculo do valor das reformas para abrir as portas à privatização futura.

É
a troca do certo pelo incerto em matéria de direito à reforma e a uma pensão
digna.

(...)

Dizem
que é necessário que desde já os trabalhadores contribuam mais e que recebam
menos quando se reformarem para assegurar, como afirmam: “ que no futuro haverá
dinheiro para pagar pensões”.

Falam
da nova situação da evolução demográfica, das novas realidades às quais temos
que nos ajustar.

Mas
é interessante, camaradas, que só vejam novas realidades para cortar direitos
aos trabalhadores e ao povo.

É
à luz da nova realidade da globalização que se impõem baixos salários, a
precariedade do trabalho e flexibilização das relações laborais em nome da
sacrossanta competitividade.

È
à luz das novas realidades que se justifica e impõe uma reestruturação do
Estado com o único objectivo: reduzir ao mínimo o alcance das funções sociais
imprescindíveis ao bem-estar das populações.

Encontram
sempre novos fenómenos, novas tendências, novas realidades para fundamentar e
justificar mais sacrifícios para quem trabalha e mais precisa.

Mas
já não é assim quando se trata de por em causa os grandes interesses e os
interesses do capital.

(...)

O
alargamento da esperança de vida é para o governo do PS e para toda a direita
uma situação nova que exige consideração, mas já não é uma nova realidade a ter
em conta a mudança da estrutura económica que permitem hoje novos ganhos ao
capital.

Os
povos criam cada vez mais riqueza.

As
potencialidades que a ciência e a tecnologia permitem são cada vez profícuas,
mas o caminho que apontam no plano dos direitos e das condições de vida desses
povos é o do retrocesso social.

Pensam
sempre as novas realidades para rapar os trocos dos bolsos vazios de quem
trabalha, mas nunca se consideram as novas realidades que possam por em causa
os bolsos cheios dos grandes interesses e dos grandes negócios.

Levantam
a toda a hora o espantalho da falência e da falta de dinheiro, mas nunca vão
buscá-lo aonde o há.

O
PCP considera inaceitável que o aumento da esperança de vida, seja pretexto
para impor ou forçar o aumento da idade da reforma e a redução do valor das
reformas.

O
PCP considera inadmissível que esse progresso da civilização humana seja usado
para continuar a explorar os trabalhadores, mesmo depois de uma vida inteira de
trabalho.

Vejam,
se em vez de se pedir novos sacrifícios aos trabalhadores tivessem
também em conta outra realidade que não sendo nova é um escândalo pela dimensão
assume – os volumosos lucros do grande capital financeiro – talvez não
precisassem de mostrar tanta preocupação com a situação financeira da segurança
social.

Trata-se,
também da concretização de outra nossa proposta visando não apenas a
sustentabilidade futura da segurança social, mas o alargamento do actual
sistema de protecção e que é outra proposta socialmente justa e adequada à
realidade do nosso país.

A
criação de uma contribuição extraordinária de 0,25% sobre todas as transacções
realizadas na bolsa, actividade que diga-se tem no quadro fiscal português um
estatuto de grande privilégio.

Mas
camaradas, aqueles que todos os dias levantam o fantasma da falência da
segurança social, deviam estar preocupados com o desemprego e com a sua
desastrosa política económica que são hoje os principais responsáveis pela
quebra de receitas da Segurança Social.

A
sua própria política, a política de direita que é uma das principais causa das
dificuldades do país. 

São as políticas
neoliberais e monetaristas de imposição da ditadura do défice que estão na
origem do mais longo período de estagnação da nossa economia e dos mais altos
índices de desemprego que o país conheceu nestes últimos vinte anos. 

Desemprego que tem custos
para o País, para os trabalhadores e para a segurança social representando em
2005 uma perda de 10,7 do PIB.

Só as despesas com o
subsídio de desemprego, em resultado desta política, aumentaram entre 2001/2005
106,9%, enquanto em 1996/2000 se situaram num aumento de 15,1%. 

Esta realidade
repercutiu-se, ainda na enorme quebra de receitas de contribuições e
quotizações.

Entre 2001 e 2005 estas
receitas aumentaram apenas 12,4%, enquanto entre 1996 e 200 aumentaram 43,7%.

Em
2005, a Segurança Social teve um saldo positivo de 186 milhões de euros.

Se
entre 2001 e 2005 o subsídio de desemprego tivesse aumentado percentualmente o
mesmo que aumentou no período de 1996-2000, o saldo positivo da segurança
social teria sido de 1 000 milhões de euros.

Se
entre 2001 e 2006 as receitas de contribuições e quotizações tivessem crescido
percentualmente cerca de metade do verificado no período de 1996-2000, em 2005
o saldo positivo da segurança social não teria sido 186 milhões de euros, mas
sim 1.100 milhões de euros. 

Milhões e milhões euros
são subtraídos à segurança social em resultado da precariedade das relações
laborais, nomeadamente com os recibos verdes com as fugas que permitem ao
patronato no pagamento das contribuições.

O mesmo no grave problema
da  sub-declaração dos salários. 

Entretanto, o governo do
PS de José Sócrates em vez de promover uma política de desenvolvimento e
crescimento económico e a defesa dos sectores produtivos e do emprego, vem
propor a alteração do subsídio de desemprego com o único objectivo de
restringir o seu acesso, particularmente aos jovens.

Hoje, a larga maioria dos
desempregados não tem acesso ao subsídio de desemprego.

Uma situação muito difícil
para milhares e milhares de trabalhadores, particularmente difícil nas regiões
onde o desemprego atinge níveis elevadíssimos como aqui no distrito do Porto e
em toda a Região Norte do país. 

Mas o governo em vez de
dar a mão a quem está numa situação dramática vem tornar ainda mais difícil a
sua vida.

Mas
as receitas que se esfumam não ficam por aqui.

Poderíamos
continuar a dar exemplo das receitas que seriam arrecadadas pela segurança
social se houvesse vontade política de combater efectivamente a evasão e divida
na segurança social. 

Dívida
que cobrada ao ritmo actual só daqui a treze anos seria recuperada.

É por tudo isto que nós
rejeitamos este sistemático retorno à visão catastrófica da situação financeira
da segurança social.

Há outras alternativas que
podem garantir a sustentabilidade da Segurança Social e um melhor e mais
avançado sistema de protecção social.

É por isso que nós dizemos é necessário recuperar a
divida do patronato à segurança social avaliada em cerca de 3. 400 milhões de
euros.

É por isso que é necessário lutar contra a sub-declaração
de remunerações que em 2005 representou uma perda para a segurança social de
cerca de dois mil milhões de euros que foi para os bolsos das empresas.

É por isso que travamos a luta pelo desenvolvimento
do aparelho produtivo nacional, na criação de mais emprego com direitos e
melhores salários.

Não
são apenas as reformas dos actuais trabalhadores que o governo quer atingir com
as suas propostas. São também as dos actuais reformados e dos actuais
pensionistas. 

A proposta do governo do PS de alteração do critério
de actualização anual das pensões tem esse objectivo.

Querem sujeitar a actualização das pensões e das
reformas à evolução dos indicadores da economia do país, nomeadamente à
evolução do Produto Interno Bruto.

Não para aumentar as pensões, mas porque pensam que
este é o caminho para as fazer diminuir.

Não querem actualizar as pensões e as reformas
repondo o poder de compra perdido com a inflação, querem utilizar outros
critérios da responsabilidade do Governo e das empresas e para os quais o povo
“não é metido, nem achado”. 

Se o governo aplicar a regra do aumento das pensões
em função da evolução do PIB, como pretende, há reformas, nomeadamente aquelas
que são superiores a um salário e meio mínimo nacional que correm o risco de
jamais terem actualizações superiores à inflação.

Há reformados que estarão sempre a perder até ao fim
das suas vidas.

É
por isso que nos dizemos que o direito à reforma e a uma pensão digna são
direitos a defender, e que é preciso defende-los agora!

Mas
na mira das propostas do governo estão também as pensões de sobrevivência, tal
como estão outras prestações sociais.

Revisão
de todas as prestações sociais com a introdução do que chamam enganosamente, do
“princípio da diferenciação positiva”.

No
imediato o Governo pretende destruir a universalidade do direito à pensão de
sobrevivência do cônjuge sobrevivo sujeitando-a à condição de recursos.

Em
2005 existia mais de meio milhão de portugueses a receberem pensões de
sobrevivência.

Pensões
que em mais de 95 por cento dos casos é inferior ao salário mínimo nacional.

Mas,
mesmo assim, também este regime da pensão de sobrevivência o governo pretende
agora rever, com o objectivo de reduzir também o número de beneficiários, mesmo
que diga o contrário. 

Trata-se
de alargar um processo de alteração nos critérios de atribuição de prestações
sociais visando a destruição do seu carácter universal e a imposição de
limitações no acesso a importantes prestações sociais.

Recorde-se
que o Governo anterior concretizou medidas que o actual Governo não revogou e
em que se destacam: a destruição da universalidade do direito ao abono de
família limitando o acesso aos agregados familiares com rendimento per capita
igual ou inferior a 5 salários mínimos, o estabelecimento de diferenciação no
valor do subsídio de maternidade-paternidade para licenças de 120 e 150 dias
(de 100% para 80%) criando injustiças entre trabalhadores.

Estas
são medidas que têm lugar num país em que 85 em cada 100 reformados recebem uma
pensão inferior ao salário mínimo nacional. 20% dos agregados familiares
portugueses, cerca de dois milhões de pessoas são pobres.

A
Segurança Social com o seu carácter universal e solidário é uma conquista do 25
de Abril e constitui um direito fundamental com expressão constitucional para
cada um e para todos os portugueses, consagrando um vasto conjunto de direitos.

Esse é um bem que os
trabalhadores e o povo não podem perder!

A defesa da Segurança Social Pública é uma luta de
todos!

Essa
é a luta que é preciso travar!

 

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