Intervenção de

Cmpo de milho transgénico em Silves - Intervenção de Bernardino Soares na AR

A ocorrência na Herdade da Lameira, freguesia de Alcantarilha, Silves, em 17 de Agosto do corrente ano

Comissão Permanente

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:

O debate de hoje é suscitado pelo episódio da destruição de uma parte de um campo de milho transgénico em Silves e a atitude das forças de segurança perante o facto.

Em primeiro lugar, é preciso dizer que, no PCP, não perfilhamos qualquer concepção de rejeição dos avanços e das potencialidades científicas e tecnológicas, incluindo na área da biotecnologia agrícola. Não é este o ponto de vista que nos move, quando contestamos, como temos vindo a fazer, o processo de legalização e produção das culturas transgénicas em Portugal.

O facto é que a política do Governo, no seguimento do enfeudamento das orientações da União Europeia aos interesses das multinacionais deste sector, se traduziu na legalização apressada destas culturas, no não acautelamento de questões fundamentais, com vista a evitar a contaminação das espécies convencionais, na inviabilização real da declaração pelos municípios de zonas livres de transgénicos ou até na ausência, há dois anos, de regulamentação do fundo de compensação para os agricultores afectados por qualquer contaminação.

Esta política, que despreza a agricultura nacional, o ambiente e a biodiversidade e a segurança alimentar, é que é o verdadeiro problema.

E a gravidade desta política não pode ser desvalorizada pelos efeitos de uma acção, cujos contornos não subscrevemos, que, aliás, ao contrário dos objectivos anunciados pelos seus organizadores, terá, provavelmente, contribuído para dificultar a justa luta que muitos portugueses - defensores da natureza, organizações de agricultores e também o PCP - têm levado a cabo contra o processo de legalização dos transgénicos em Portugal.

De facto, a responsabilidade pela proliferação de transgénicos e pela eventual contaminação de outras espécies deve ser atribuída não ao proprietário da exploração em causa mas à política do Governo de favorecimento dos interesses das multinacionais deste sector.

Mas esta acção, com as características que se conhecem, não teve só o condão de, provavelmente, afastar muitos cidadãos da sensibilização para o problema dos transgénicos, ela permitiu também à direita securitária «cavalgar» a ideia da falta de actuação das forças de segurança e exigir intervenções mais musculadas e de preferência aplicadas a todas as formas de luta e protesto que a revolução de Abril tornou possíveis.

Combateremos qualquer ideia ou deriva que pretenda, a propósito deste episódio com cujos contornos, como disse já, não nos identificamos, transformar as forças de segurança em agentes de repressão do legítimo direito ao protesto consagrado na Constituição e património inalienável das populações e dos trabalhadores numa sociedade livre e democrática.

Claro que à direita falta assunto, porque o PS lho retira, fazendo a sua política no Governo. E como não será fácil, perante a governação do PS, pedir mais privatizações (tantas são elas), mais cortes nos direitos dos trabalhadores (tantos são eles) ou pedir uma mais rápida degradação do Serviço Nacional de Saúde e do ensino público, resta-lhes pedir mais bastonada, mais repressão, mais autoritarismo.

Entretanto já procuraram alargar este debate para a dramatização de uma situação, eventual, de aumento grave da criminalidade, contribuindo, aliás, para uma situação de alarme social. Importa não confundir, como sempre se diz nestas situações, a visibilidade mediática dos crimes que, de tempos a tempos, assume grande destaque na comunicação social com a situação real, que pode ou não estar a sofrer um aumento mas que não se mede pelas notícias e pelo destaque na comunicação social.

Mas já sabemos que certas forças políticas não perdem oportunidade para procurar impor uma filosofia e uma prática de cariz repressivo na actuação das forças de segurança.

Pela nossa parte, manifestamos a nossa preocupação em relação à capacidade das forças de segurança, no quadro da reestruturação em curso, para responder eficazmente às missões para que são solicitadas, designadamente quando esta reestruturação prevê, por razões estritamente financeiras, a não admissão de novos agentes até 2009.

Estas são as preocupações que seriamente devem ser colocadas num debate, que não deve ser sobre o alarme, que não se sabe se tem justificação ou não.

Como eu estava a dizer, estas são as preocupações que seriamente devem ser colocadas num debate, que não deve ser sobre o alarme, que não se sabe se tem justificação ou não, e que não podem conduzir a qualquer deriva no sentido de um maior autoritarismo e de uma menor civilidade por parte das forças de segurança no exercício das suas missões no nosso país.

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