Gostaria de agradecer a todos a presença neste concerto, inserido no programa do PCP de comemorações do V Centenário do nascimento de Luís de Camões.
Permitam-me uma saudação particular aos artistas, aos trabalhadores da cultura, a todos os que se empenharam na concretização desta iniciativa.
É justo questionar como é que com tanta coisa para fazer e em tempos tão difíceis que exigem tanto e cada vez mais de todos nós, tempos de aperto na vida da maioria dos jovens, das mulheres, dos trabalhadores, tempos de injustiça, promoção do ódio, divisão, de incertezas, perigos e de desesperança para o povo, porque razão o PCP se lança de forma tão profunda e empenhada nas comemorações dos 500 anos do nascimento de Camões com um programa tão diversificado como aquele que estamos a levar por diante?
Pois bem, avançamos com estas iniciativas porque Camões é, como afirma o lema das comemorações, “o poeta do povo num mundo em mudança”.
Avançamos pela sua actualidade e porque é fundamental que o povo conheça a obra do poeta que lhe deu voz.
Avançamos nestas comemorações porque é imperativo intervir pela verdade histórica que confronta a mentira e a manipulação.
A obra de Luís de Camões foi manipulada pelo fascismo, procurando com ela dar cobertura ideológica a um regime opressivo e ao colonialismo com tudo o que o envolve.
Camões não é o poeta dessa gente, não é o poeta do medo, do individualismo, da resignação, da manipulação de consciências, da censura, da repressão, do terror.
Camões é do Renascimento, desse pensamento novo que confronta o velho pensamento dogmático de classes dominantes que procuraram reprimir e conter, nomeadamente através da Inquisição.
Camões nunca foi protegido pelo poder nem pelos privilegiados do seu tempo, é o poeta de Os Lusíadas que tal com como Álvaro Cunhal, referiu e cito:
«Camões não é a voz da reacção e do colonialismo. Camões é a voz do nosso povo, dos Lusíadas, a voz da insubmissão ante os privilégios, a voz do progresso social e científico, a voz da nação portuguesa, num elevado sentido humanista».
Camões é o poeta da aventura portuguesa nos oceanos, da descoberta mútua e das relações entre os povos, das trocas comerciais e culturais, das novas rotas, novas estrelas e dos novos céus.
Camões é o poeta do aguçar dos sentidos, das capacidades de descrição, raciocínio, experimentação e do conhecimento.
Como afirmou Garcia de Orta: «sabe-se mais num dia agora pelos portugueses do que se sabia em cem anos pelos romanos».
Assinalar Camões pelo que foi, o que representa e quem representa na sua obra, é dar um contributo para o combate a ideias e concepções retrógradas, reaccionárias e bafientas que alguns procuram recuperar e difundir.
Mas é mais, é dar voz a esse povo por ele sempre exaltado, esse povo que lutou para defender a independência nacional, esse povo que com as suas mãos contraria sempre, mais cedo ou mais tarde, o conformismo que alguns querem impor.
É esta a nossa história e assim foi nesse momento maior da vida do povo que foi a Revolução de Abril.
Essa data maior e única que alguns procuram fazer esquecer da memória colectiva, para fazer esquecer e pôr fim às suas conquistas e valores.
Essa data maior e única que alguns querem reescrever e substituir por outra qualquer, de forma a consolidar um rumo e uma política que aperta a vida da maioria e concentra a riqueza, benesses e privilégios nas mãos de uns poucos.
Um rumo de dezenas de anos, levado a cabo agora pelo Governo de turno de PSD e CDS, com uma política apoiada pelo Chega e pela Iniciativa Liberal, e que conta com a cumplicidade do PS.
Um rumo que coloca Portugal nas mãos dos grandes grupos económicos e das multinacionais, um rumo e uma política contrárias às necessidades da maioria dos que cá vivem e trabalham, de desinvestimento e ataque ao SNS, à escola pública, à cultura, à generalidade dos serviços públicos; de baixos salários e pensões, brutais dificuldades na habitação, manutenção e agravamento da precariedade e das condições laborais; de insistência no caminho de abdicação da soberania e da produção nacional.
Como assinalou Camões: «O fraco rei faz fraca a forte gente».
Este rumo e esta política submissa perante os poderosos enfraquece o povo e a sua vida.
Comemorar Camões é também contribuir para fazer mais forte a nossa forte gente.
É afirmar o pensamento avançado, descobrir e respeitar as diferentes culturas, dar combate às injustiças e desigualdades, é afirmar a cooperação, solidariedade, respeito e soberania dos povos, fazer frente à guerra e lutar pela Paz.
Comemorar Camões e a sua obra é lembrar sempre que as lutas de hoje – pelos salários, as pensões e os direitos, contra o pacote laboral e na construção da greve geral, pelo direito à habitação, à escola pública, à cultura – se inscrevem no mesmo processo histórico de denúncia e combate às injustiças e desigualdades em que Camões, ressalvada a diferença de contexto e de tempo, se inseriu.
É também por isto tudo que o PCP se lança, nestes tempos, de forma tão empenhada nas comemorações dos 500 anos do nascimento de Camões e que realizamos hoje mesmo este concerto.
Associemos agora ao engenho e arte de Luís de Camões, o engenho e arte dos artistas que hoje aqui vão intervir.





















