No início do ano lectivo de 2023/2024, o PCP alertou para o facto de o Governo do PS não ter tido vontade política para tomar um conjunto de medidas que fosse ao encontro da resolução dos problemas que há muito afectam a Escola Pública e a qualidade do ensino, o que fazia prever que o ano lectivo não iria correr bem. Deste modo, em vez da necessária normalização do processo ensino/aprendizagem, o que caracterizou o ano lectivo foi a instabilidade, em resultado da intensificação de uma linha de desvalorização social e profissional dos trabalhadores da Educação.
Não faltaram problemas e a carência de professores foi um dos mais sentidos. Em Maio, de acordo com números do actual Governo, eram 22 116 alunos sem aulas a uma disciplina e, destes, 939 estavam nessa situação deste Setembro, ou seja todo o ano lectivo.
A consideração dos profissionais do sector como meros «recursos humanos», sujeitos a regras economicistas de gestão, sob a alegada capa de racionalização; os níveis altos de precariedade, que mesmo após o resultado do último concurso se irão manter; o excessivo número de alunos por turma, sem respeito, muitas vezes, pela integração de alunos com necessidades específicas; a manutenção dos exames nacionais que apenas servem para alimentar os rankings no final do ano lectivo e fazer publicidade, que é enganosa, aos colégios privados; a carga excessiva dos horários de trabalho dos professores, trabalhando em média mais de 50 horas semanais; o subfinanciamento crónico das escolas; a manutenção de mega-agrupamentos; a insistência num modelo de gestão não democrático e centralizado na figura do director; a generalização do processo de transferência de “competências” para as autarquias e que o actual Governo pretende aprofundar, entre outras questões – são problemas que exigiam resposta urgente por parte do Governo do PS e que o novo Governo do PSD/CDS deveria dar prioridade.
O Governo de PSD/CDS, no seu Programa, aponta, no essencial, para um conjunto de alterações orientado para a concretização dos projectos da direita, visando uma alteração radical da organização e dos conteúdos do sistema educativo, apresentando um conjunto significativo de ambiguidades em relação às políticas educativas e que tem como alvo principal a desvalorização da Escola Pública e a promoção dos grupos privados, não sendo alheia a esse objectivo a revisão anunciada da Lei de Bases do Sistema Educativo. Não diferindo muito do que o PS já propunha, e apenas aprofundando as suas políticas, é um programa que incorpora um conjunto de medidas desgarradas que funcionam como remendos, para tentar colmatar e/ou encobrir problemas mais graves e de resolução premente. Os primeiros 100 dias de Governo comprovam exactamente esta ideia.
Aproxima-se um novo ano lectivo e não se prevê um ano muito diferente do que acabou, até pelo atraso que se verifica na sua preparação. Veja-se o que está a passar com os constrangimentos na matrícula dos alunos, num portal financiado pelo PRR, que tem deixado os pais em stress. Para dar resposta à carência de professores e educadores na Escola Pública, o Governo do PSD/CDS apresentou um programa de emergência, o Plano +Aulas +Sucesso. Este Plano, elaborado sem qualquer auscultação à comunidade educativa, apresenta apenas medidas avulsas, que não enfrentam o essencial do problema da falta de professores, a desvalorização sistemática da sua carreira e o desrespeito pelos seus direitos. É na valorização da carreira, através da eliminação das quotas de avaliação e das vagas para o 5.º e 7.º escalões, na garantia de respeito pelo horário de trabalho e as suas diversas componentes, pela reposição do tempo de serviço a todos os docentes, sem deixar um professor para trás, que tornará a carreira atractiva e que levará a que mais jovens queiram optar pela profissão.
A recuperação do tempo de serviço, agora reivindicada como uma vitória do Governo do PSD/CDS, é fruto de uma intensa luta dos professores, que obrigou o Governo a iniciar um caminho de recuperação. Todavia, o acordo que alguns sindicatos assinaram deixa de fora da recuperação total ou parcial cerca de 25 mil professores e educadores, e continua a gerar algumas distorções entre docentes que se encontram a meio da carreira. Nesta matéria, o PCP mantém a sua posição de sempre, todos os professores devem ver o seu tempo devidamente contabilizado, quer para efeitos de progressão, quer, quando tal não for possível, de aposentação.
O próximo ano lectivo necessita de medidas que valorizem a Escola Pública, que rompam com o caminho iniciado pelo PS e que este Governo mantém. Na passada semana, o Ministro da Educação, Ciência e Inovação, em audição regimental na Comissão de Educação, apresentou um conjunto de promessas que mais não são do que estudos e avaliações do sistema educativo, em suma, um diagnóstico. Estas avaliações são importantes e devem ser realizadas, contudo, há problemas que há muito estão diagnosticados e que é necessário que se avance na sua resolução. São disso exemplo os níveis de precariedade dos técnicos especializados, a solução para estes trabalhadores que, anos atrás de anos, dão resposta a necessidades permanentes das escolas, sendo necessária a sua integração nos quadros, ou a grande necessidade de auxiliares de acção educativa, que só se resolverá com a alteração da portaria de rácios e a criação de uma carreira específica, bem como as obras de recuperação de muitas dezenas de escolas onde já é muito difícil trabalhar.
Para um País que considere a Educação como um pilar fundamental da Democracia e como um dos mais basilares direitos do povo, é necessária a tomada de medidas que rompam com o caminho iniciado pelo PS e prosseguido por PSD e CDS. Para que o País recupere o caminho da valorização da Escola Pública e da democratização da Educação, o PCP defende:
- aumento do investimento público, como prioridade estratégica na Escola Pública, tomando medidas para que se garanta a universalidade e gratuitidade da educação em creche, sendo criada uma rede pública, e na educação pré-escolar, bem como o investimento necessário na recuperação das escolas;
- criação de uma rede pública de ensino artístico especializado;
- aprovação de um modelo de financiamento adequado do ensino profissional, de um plano de educação e formação de adultos e de um programa de formação ao longo da vida;
- reforço efectivo de horas atribuídas às escolas para o desenvolvimento de tutorias e mentorias;
- redução do número de alunos por turma e de níveis por professor;
- flexibilização da organização das turmas, permitindo o seu desdobramento e evitando a junção de vários anos na mesma turma, no caso do 1.º ciclo do ensino básico;
- reforço dos apoios no âmbito da Acção Social Escolar, incluindo a manutenção da gratuitidade dos manuais escolares e o seu alargamento aos livros de fichas e a garantia da gratuitidade do material escolar e das refeições;
- reforço dos recursos humanos e materiais no âmbito da educação inclusiva, em especial a contratação de trabalhadores e a sua formação especializada;
- reforço dos apoios a crianças e jovens que não têm o português como língua materna;
- criação, urgente, do grupo de recrutamento da Intervenção Precoce;
- implementação de um modelo verdadeiramente democrático de gestão das escolas e reversão do processo de transferência de competências para os municípios;
- revogação do estatuto do aluno e aposta nos mecanismos de participação estudantil;
- valorização dos recreios e da promoção do seu papel pedagógico lúdico e social;
- valorização da avaliação contínua, eliminando os exames nacionais e revendo o regime de provas de aferição.
A garantia de uma Escola Pública, gratuita e de qualidade, inclusiva e para todos, exige a consagração de políticas que tenham em vista o seu reforço, enquanto garante da educação como direito fundamental e condição determinante para o desenvolvimento integral da juventude, da população em geral e dos trabalhadores em particular.
A questão central que está colocada hoje é travar o desenvolvimento da política de direita na Educação, da responsabilidade de PS, PSD e CDS. É fundamental travar o processo de privatização, de desvalorização social e profissional dos trabalhadores da Educação, garantir a igualdade no acesso de todos aos instrumentos de aprendizagem, objectivos que não se atingem com medidas economicistas e imediatistas, mas com a resolução dos problemas estruturais que afectam a Escola Pública.