Pergunta ao Governo N.º 1791/XIV/1

Assistência à família em período de interrupção lectiva e lay-off na TAP

Destinatário: Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social

Enfrentamos um momento de grande complexidade e incerteza. No entanto, a situação que o país e o Mundo atravessam, com medidas excecionais para situações excecionais, não poderá servir de argumento dos patrões para o atropelo dos direitos e garantias dos trabalhadores. Não pode ser usado e instrumentalizado para, aproveitando legítimas inquietações, servir de pretexto para o agravamento da exploração e para o ataque aos direitos dos trabalhadores.

Os últimos dias dão um perigoso sinal de até onde sectores patronais estão dispostos a ir espezinhando os direitos dos trabalhadores. Indiciando um percurso que a não ser travado lançará as relações laborais numa verdadeira “lei da selva”, tem-se assistido à multiplicação de atropelos de direitos e arbitrariedades.

No passado mês de março muitos tripulantes de cabine da TAP foram obrigados a recorrer ao apoio excecional à família para trabalhadores por conta de outrem, previsto no Decreto-Lei n.º 10-a/2020, de 13 de março, devido à suspensão das atividades letivas e não letivas decretada pelo Governo, tendo em vista a assistência inadiável a filho ou outro dependente. Esta necessidade de assistência e de acompanhamento verifica-se, também, durante as férias da Páscoa, iniciadas no dia 1 de abril.

Por exigência da empresa, os trabalhadores têm, em qualquer circunstância, de apresentar os requerimentos de licença até ao dia 10 do mês anterior ao do gozo, o que estes trabalhadores fizeram. No entanto e conforme imposição da empresa e, mais tarde, por decisão do Governo através do Decreto-Lei n.º 10-K/2020, de 26 de março, as faltas dos trabalhadores a prestar assistência a filho durante o período de interrupção letiva, seriam consideradas justificadas, mas sem direito a qualquer apoio ou remuneração.

Acontece que a TAP, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março, requereu o apoio extraordinário à manutenção de contrato de trabalho em situação de crise empresarial que, de acordo com a informação fornecida aos seus trabalhadores, entraria em vigor no dia 2 de abril.

Perante este fato os trabalhadores que haviam requerido a licença e que a gozariam no período das interrupções letivas requereram ao Recursos Humanos da empresa a anulação do pedido, uma vez que esta se encontraria em situação de suspensão de atividade e os trabalhadores já se encontrariam, necessariamente, nas suas residências, o que possibilitava o acompanhamento aos filhos e dependentes, com o percebimento de parte do salário, o que na situação anterior não sucederia.

No entanto, estes trabalhadores foram informados que não seria possível tal anulação, pois a mesma teria de ter sido requerida até ao dia 10 do mês anterior ao do gozo, pelo que o gozo tornar-se-ia efetivo, sem o percebimento de qualquer valor.

Esta decisão da empresa, para além de significar um profundo desrespeito pelos seus trabalhadores, pressupõe uma dupla penalização. Se por um lado, devido ao regime da suspensão de atividade, estes trabalhadores já irão sofrer um corte bastante significativo nos seus salários, por outro e apesar da suspensão do contrato, a empresa obriga-os a gozar uma licença, cujo gozo implica a perda da remuneração dos dias em que durar.

Para além de ser legalmente questionável a manutenção de uma licença, mesmo que querida com anterioridade, enquanto o contrato de trabalho se encontra suspenso, demonstra, também, a profunda desconsideração de que estes trabalhadores são alvo, pois mesmo após prejudicar, de forma significativa, os seus trabalhadores com os cortes salariais de, pelo menos, um terço do seu salário, ainda pretende, a empresa, subtrair mais rendimentos.

A situação que o país enfrenta exige do Governo as medidas necessárias para assegurar aos trabalhadores a manutenção da totalidade dos seus salários, não deixando nenhum trabalhador para trás, nem votando nenhum ao abandono. Para mais, numa empresa, em que o Estado português detém uma participação significativa.

Assim, ao abrigo da alínea d) do artigo 156.º da Constituição e nos termos e para os efeitos do artigo 229.º do Regimento da Assembleia da República, solicitamos ao Governo os seguintes esclarecimentos:

  1. Tem o Governo conhecimento da situação acima descrita?
  2. Que medidas vai tomar o Governo para assegurar que estes trabalhadores não sofrem uma dupla penalização nos seus salários?
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