Pergunta ao Governo N.º 1040/XII/3.ª

Aquisição de obras de Joan Miró por entidade controlada pelo Estado

Aquisição de obras de Joan Miró por entidade controlada pelo Estado

Na sequência do estranho processo de alienação de uma colecção de 85 obras de Joan Miró pelo Estado Português, através de entidades empresariais controladas pelo Estado, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português tentou compreender o percurso dessas obras no período que antece a titularidade estatal. Compreender o seu percurso é fundamental para decifrar que interesses podem ter estado ou estar ainda associados às obras, na totalidade ou em parte da colecção.
É sabido que o conjunto tem origem no processo de "nacionalização" do BPN e que o Estado veio a ser titular de parte destas obras por força da sua intervenção que resultou na manutenção privada do benefício e na socialização dos prejuízos do referido Banco. Uma parte do património do BPN corresponderia a obras de arte, entre as quais as que integram a colecção. No entanto,
num contexto de indefinição e alguma disputa sobre a titularidade de algumas obras, nomeadamente entre BPN e SLN, há uma parcela de obras que, até à data da elaboração do último relatório de Comissão Parlamentar de Inquérito, não tem titularidade absolutamente definida e concretizada.
No entanto, no esforço de detecção da origem que este Grupo Parlamentar levou a cabo, identificou a indicação de um conjunto de obras de arte, nomeadamente da autoria de Joan Miró, numa transacção entre uma entidade bancária e uma entidade controlada pelo Estado. De acordo com o "Relatório e Contas - Banco BIC" correspondente ao exercício de 2012 surge "No
exercício de 2012, estes bens foram alienados a uma entidade controlada pelo Estado, pelo correspondente valor contabílístico (Nota 22). Em 31 de Janeiro de 2011, a rubrica "Bens recebidos em dação de crédito - Obras de Arte" incluíao montante de 15.350 mEuros referentes a obras de arte do pintor Joan Miró recebidas em dação por recuperações de créditos concedidos pelo Banco. O Banco dispunha de uma imparidade de 1.535 mEuros para estes activos."
Ora, da leitura desse documento depreende-se que há um conjunto de obras de arte da autoria de Joan Miró que passam a integrar o património de uma entidade controlada pelo Estado. Nãoé, portanto, despropositado, assumir que essas obras adquiridas pelo Estado são agora integradas na colecção de 85 obras que a Parvalorem e a PARUPS pretendem alienar em leilão.
Todavia, várias questões se colocam tendo em conta o desenvolvimento do processo que é hoje conhecido.
Sem pretender agora aprofundar a já clara situação de ilegalidade que constituiu a expedição da obra para fora do país, importa no entanto, compreender o processo político e financeiro e quais os objectivos políticos que presidiram à actuação do Estado. Tais objectivos não aparentam coincidir com o interesse público.
Vejamos: o Estado Português adquire ao BIC um conjunto de obras de Joan Miró por mais de 15 milhões de Euros para depois ficar o próprio Estado responsável pela sua venda em leilão.
Essa aquisição verificou-se durante 2012. Nesse mesmo ano, o BIC adquire ao Estado Português, num processo de privatização ruinoso para o interesse nacional, o BPN. Ao que tudo indica, o BPN é a origem da dação de crédito referida no relatório e contas do BIC.
Assim, ao abrigo dos termos constitucionais e regimentais em vigor, requeiro a V. Exa se digne solicitar ao Governo, através do Ministério das Finanças, resposta às seguintes perguntas:
1. A aquisição por entidade controlada pelo Estado, de obras de Joan Miró, ao BIC ocorreu em que dia de 2012?
2. Que entidade realizou essa aquisição?
3. Quantas obras compunham o conjunto adquirido pela entidade ao BIC?
4. Que motivos levaram a entidade controlada pelo Estado a adquirir as referidas obras e por que exacto valor foi realizada a aquisição?
5. Qual o interesse político da compra, na medida em que fica provado que a tal entidade e o Estado não tinham intenção de a valorizar no contexto da política cultural?
6. Tinha a entidade o objectivo de comprar as obras para as alienar posteriormente? Qual é o interesse público em operações de transacção de obras de arte?
7. Que medidas tomou o Governo para inventariar e eventualmente proceder à classificação das obras adquiridas?
8. Sendo que é possível, apesar de improvável, que as obras de arte de Joan Miró a que se refere o Relatório e Contas do Banco BIC de 2012 não integrem o conjunto das 85 obras de arte que estão agora envolvidas num processo ilegal de expedição e alienação, qual o paradeiro e quais os objectivos do Governo para essas obras?

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