Intervenção de Honório Novo na Assembleia de República

Aprova uma sobretaxa extraordinária sobre os rendimentos sujeitos a IRS auferidos no ano de 2011, alterando o Código do Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442- A/88, de 30 de Novembro

(proposta de lei n.º 1/XII/1.ª)

Sr.ª Presidente,
Sr. Ministro de Estado e das Finanças,
Quero assinalar, à partida, que, depois de ouvir o Sr. Deputado Nuno Magalhães, ficou claro que com o CDS no Governo os direitos dos contribuintes deixaram de existir, pura e simplesmente.
Sr. Ministro das Finanças,
De facto, tem razão quando diz que é «de PEC em PEC, até ao desastre final», mas esqueceu-se de dizer «de braço dado com o PSD». Faltou este elemento no seu aforismo popular, passe a expressão.
Sr. Ministro, no debate do Programa do Governo, perguntei-lhe o seguinte: «Porque é que o senhor não reconhece, desde já, que, mais tarde ou mais cedo, vai ter de renegociar juros e prazos da dívida?» E perguntei-lhe também: «Porque é que o senhor não reconhece, desde já, que a nossa dívida, a sete anos, com estes juros, é impagável?!» O senhor respondeu-me laconicamente, como aliás é o seu estilo, o seguinte: «Relativamente à questão da dívida soberana e ao facto de ela ser impagável, não reconheço esse facto, porque não é verdadeiro».
Devo dizer-lhe, Sr. Ministro, que alguns sinais que vêm de Bruxelas, não obstante manterem intocável a rota da recessão económica, dizem que, afinal, o senhor não tem razão e que a dívida era, e é, mesmo impagável.
Para parte da nossa dívida os juros vão baixar para 3,5% e os prazos vão aumentar para 15 anos. Isso é a confissão expressa de que a parte financeira das propostas apresentadas pelo PCP, e aqui irresponsavelmente rejeitadas pelos senhores do PS, do PSD e do CDS na passada quarta-feira, cujo discurso populista e demagógico importa aqui e agora recordar, são um caminho inevitável, caminho este que tem de ser aprofundado, alargado e, em parte substancial, modificado.
Sr. Ministro, a propósito deste imposto, ou seja, a propósito do saque correspondente a 50% do subsídio de Natal, o senhor insistiu em dois conceitos: equidade fiscal e universalidade. Com este imposto preventivo, não cobra um cêntimo sobre os rendimentos do capital — artigo
71.º do Código do IRS — e sobre os dividendos distribuídos pelas empresas aos seus accionistas.
Sr. Ministro, para que possamos entender-nos e para que o País o possa entender de vez, pergunto-lhe qual é, afinal, o seu conceito de equidade e de universalidade. É que o seu
conceito de equidade e de universalidade não corresponde ao que vem nos dicionários da língua portuguesa.
O senhor não quer cobrar um cêntimo ao Eng.º Belmiro, ao Sr. Amorim, ao Sr. Soares dos Santos e ao Sr. Mexia pelos dividendos que recebem das suas empresas! Pergunto-lhe, Sr. Ministro: trata-se de um esquecimento colossal ou é uma clara opção ideológica da direita mais liberal e fundamentalista? Diga-nos, se faz favor!
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr. Ministro das Finanças,
Srs. Deputados:
Registo que o Sr. Ministro não corrigiu as suas afirmações do debate do Programa do Governo relativamente às condições impagáveis da dívida nacional.
O Sr. Ministro apresenta este imposto preventivo extraordinário falando de equidade e de universalidade. Desafiei-o a explicar os conceitos, e o senhor também não o fez. O Sr. Ministro
— passe a expressão — não começa bem.
Também o Primeiro-Ministro, no debate do Programa do Governo, falou de equidade e de universalidade. Eu afirmo, e reafirmo, que ambos estão a faltar à verdade.
Este imposto extraordinário não cobra um único cêntimo aos rendimentos de capital nem aos dividendos que as empresas e grupos económicos distribuem aos seus accionistas, isto é, aos poderosos do País.
Mas quanto à não tributação de juros, o senhor disse recentemente que isso seria inconsistente com os esforços da poupança. Se o senhor fosse consistente e quisesse realmente incentivar a poupança, teria, antes, dito que os juros não serão taxados com um imposto extraordinário se forem reinvestidos em poupança; se não o forem, serão taxados. Isso, sim, seria, ao menos, consistente.
Pelo contrário, o que o senhor disse foi de uma enorme inconsistência.
Já agora, os salários dos portugueses, Sr. Ministro, não podem ser parcialmente afectados à poupança?
Será que para este Governo quem trabalha não pode e não tem direito a poupar? É que com o saque extraordinário correspondente a 50% do subsídio de Natal, o Governo só incentiva à poupança quem já tem rendimentos de capital e recebe dividendos, isto é, os poderosos.
Finalmente, Sr. Ministro, o pretexto usado para lançar um imposto que não constava nem consta dos programas eleitorais do CDS e do PSD, nem tão-pouco está previsto no Programa
do Governo.
Em 2002, Durão Barroso e Paulo Portas descobriram que o défice de Guterres não era de 2,1% mas 4,1% e que o País estava «de tanga» e aumentaram o IVA de 17% para 19%.
Em 2005, José Sócrates descobriu que o défice de Barroso não era 2,8% mas 6,8% e, claro está,
aumentou o IVA de 19% para 21%.
Em 2010, José Sócrates e Passos Coelho descobriram qualquer coisinha mais, «dançaram o tango» e subiram o IVA para 23%.
A receita, Sr. Ministro, já a conhecemos, é sempre a mesma. Não são precisos pretextos, pesadas herança nem défices colossais, a receita é sempre a mesma e o objectivo comum e permanente: fazer pagar a crise aos trabalhadores e a quem menos tem, reforçar a austeridade para a maioria do povo e permitir que a banca, os grandes grupos e os seus accionistas continuem a viver «à grande e à francesa» à custa do resto do País.

  • Economia e Aparelho Produtivo
  • Regime Democrático e Assuntos Constitucionais
  • Assembleia da República
  • Intervenções