Intervenção de Paula Santos na Assembleia de República

Apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 92/2013, de 11 de julho, que define o regime de exploração e gestão dos sistemas multimunicipais de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público,...

...de recolha, tratamento e rejeição de efluentes e de recolha e tratamento de resíduos sólidos
(apreciação parlamentar n.º 58/XII/2.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Entendemos chamar à discussão na Assembleia da República o Decreto-Lei n.º 92/2013, que estabelece o regime dos sistemas multimunicipais de água, efluentes e resíduos, porque ele constitui mais uma peça na estratégia privatizadora deste Governo.
Aliás, com a lei, já aprovada, da delimitação do setor, com a proposta de lei que introduz alterações nos sistemas municipais de abastecimento de água, saneamento e resíduos sólidos e urbanos e mais este Decreto-Lei, o Governo pretende criar um edifício jurídico e legal que permita concretizar os seus objetivos, ou seja, entregar de bandeja aos grupos económicos setores públicos fundamentais, sem nenhum risco para estes e garantidos chorudos lucros.
Podemos referir também que um conjunto de investimentos já foi realizado nas infraestruturas pelo erário público para benefício do interesse público e agora, entregando de bandeja aos grupos económicos, são eles, sem qualquer investimento, que vão explorar e obter lucros com esse mesmo investimento que foi feito.
Com o objetivo de privatização da água e do saneamento, o Governo traçou este processo em três fases: uma primeira, de fusão; uma segunda, de verticalização; e uma terceira, a que chamou «subconcessão» — mas não vale a pena virmos aqui com jogos de palavras porque o que significa é a sua privatização — e, neste concreto, este Decreto-Lei que estamos hoje aqui a discutir propõe fundir e criar megassistemas multimunicipais. Não vêm, no concreto, esses megassistemas, mas, na verdade, o Governo já apresentou a sua proposta. São quatro: um, para o Norte; um, para o Centro Litoral; um, para Lisboa e Vale do Tejo, que vai do Alentejo a Foz Côa; e um para o Sul. E o Decreto-Lei vem dar corpo a isto.
Este Decreto-Lei menoriza também a participação dos municípios em todo este processo, remetendo-os para uma participação minoritária e esquecendo-se das competências que são dos municípios e que estão aqui a ser tratadas. Aliás, vem sendo uma prática deste Governo desrespeitar a autonomia do poder local democrático que consideramos inaceitável, autonomia esta que está consagrada na nossa Constituição. Mas também sabemos bem qual é o peso da Constituição para este Governo: basta ver o conjunto de medidas que este Governo pretende implementar e que, bem, o Tribunal Constitucional considerou que eram inconstitucionais.
Por isso, este Governo impõe aos municípios a obrigação de aderir a determinados sistemas multimunicipais e que determina, previamente, quais é que são esses sistemas multimunicipais. Não podemos esquecer, de facto, qual é a orientação política que está subjacente, que está por detrás disto tudo. Há aqui grandes interesses do capital, porque está na natureza do capital pretender que tudo aquilo que esteja relacionado com bens essenciais ao ser humano, bens essenciais à vida, possa ser objeto de negócio e de lucro. É isto que está na génese de todo este processo.
Neste caso concreto, a água enquadra-se perfeitamente nestes princípios. Ninguém vive sem água. Por que não, então, ter um negócio em torno da água? Se todos precisamos de água para viver, então, a água é mais um dos objetos de negócio e de lucro do capital.
E o que faz o Governo português perante esta situação? Em vez de defender os interesses públicos e os interesses da população, não, o Governo português submete-se aos interesses dos grandes grupos económicos.
Aliás, esta é claramente a opção ideológica que está em cima da mesa, a qual o PCP não aceita, rejeita por uma questão de princípio.
Neste sentido, o PCP apresenta hoje aqui um projeto de resolução para cessação da vigência do decreto-lei em causa, porque consideramos que não é desta forma que defendemos o serviço público, não é desta forma que defendemos os interesses da população.

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