Intervenção de

Alteração ao Código do IVA<br />Intervenção de Honório Novo

Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças,Permita-me que comente a sua introdução a este debate através da leitura de duas transcrições para as quais chamo a atenção especial de V. Ex.ª. Primeira transcrição: «A situação orçamental com que nos deparamos exige o recurso a algumas medidas de efeito imediato. Não são por isso suficientes medidas do lado da despesa, cujo efeito é retardado no tempo. É neste contexto de verdadeira emergência que se impõe o recurso temporário ao aumento da taxa do IVA, deixando inalteradas as taxas reduzidas que incidem sobre bens essenciais.» Mais adiante, continua esta primeira transcrição: «Estamos conscientes de que este é o caminho para reanimar a actividade económica, para recuperar a confiança dos agentes económicos, para definir a sua perspectiva de longo prazo.» E a transcrição termina, dizendo: «Sabemos que os portugueses corresponderão ao esforço solidário que a todos pedimos para vencer os obstáculos que se nos deparam a fim de retomar decisivamente o caminho do progresso e do desenvolvimento económico.» Permita-me, Sr. Ministro, que lhe leia uma segunda transcrição: «O aumento do IVA afecta as expectativas dos agentes económicos, penaliza famílias de menores rendimentos, sobrecarrega a despesa pública nas aquisições de serviços e empreitadas de obras públicas e contribui, no quadro da obsessão financeira, para criar um ambiente propício à recessão económica a que Portugal escapou, mesmo no 11 de Setembro.» E continua: «Hoje, renova-se a opção pela dramatização e pelo confronto, um caminho que tem efeitos negativos sobre a economia, que vão muito para além de duvidosas vantagens orçamentais de medidas que produzem efeitos inflacionistas imediatos e penalizam as famílias de rendimentos médios e baixos.» Sr. Ministro, quero apenas que me responda e me tire esta dúvida: em qual dos dois discursos se revê o Governo e o Sr. Ministro? No primeiro discurso, que defende o aumento do IVA, cuja autoria é da Dr.ª Manuela Ferreira Leira, ou no segundo discurso, em que se defende que esse aumento iria prejudicar os mais desfavorecidos, cuja autoria é do ex-Deputado Eduardo Cabrita, hoje membro do seu Governo, e que acrescentava que esse aumento iria mesmo comprometer a economia e o crescimento económico? Em qualdeles se revê V. Ex.ª? Senhor Presidente Senhores Membros do Governo Senhoras e Senhores Deputados O aumento do IVA parece ser o recurso mais fácil e eficaz de que sucessivos Governos se servem para penalizar os portugueses, em especial os trabalhadores e os mais desfavorecidos. Sempre que chegam ao Governo lá descobrem que as contas públicas estão afinal pior do que pensavam e, por isso, em vez de diminuírem ou não aumentarem impostos, lá dão mais uma pequena contribuição na subida das taxas dos impostos que penalizam o País e os Portugueses. No passado, Manuela Ferreira Leite invocara o défice para fazer subir o IVA de 17% para 19%. Também na altura a medida era transitória; também aí apelava aos portugueses em nome do crescimento económico; também era para equilibrar as contas e respeitar o Pacto de Estabilidade. Agora, com José Sócrates, os pretextos são os mesmos, os argumentos iguais, os objectivos idênticos, o espartilho do Pacto de Estabilidade, (apesar das suas mais que insuficientes alterações), é novamente o alfa e o ómega da obediência e da obsessão orçamental. A única coisa diferente é que em 2002 a taxa subia de 17 para 19%, agora, passa de 19 para 21% (e nas regiões autónomas de 13% para 15%). O IVA, o imposto que “está mais à mão”, o tal imposto cego e injusto que penaliza sobretudo os mais desfavorecidos e as famílias de menores recursos, é de novo o expediente do Governo, a mais importante das medidas fiscais que constam do Programa de Estabilidade e Crescimento aprovado no início do mês. Mas essa é uma solução errada quer no plano social quer no plano económico. O Governo nem quer ouvir falar dos efeitos do aumento do IVA na competitividade da economia portuguesa. Quando importa moderar salários ou atacar direitos de trabalhadores interessa invocar (mesmo que de forma falsa) a competitividade da economia. Mas quando se aumenta o IVA e se faz com que a sua taxa normal seja 5 pontos percentuais acima do que é praticado no vizinho ibérico, a competitividade da economia portuguesa já não conta! O Governo também não quer ouvir falar dos efeitos do IVA na evasão fiscal. E o curioso – mas que dá bem a noção da gestão sobretudo mediática que o Governo faz da aprovação das suas políticas – é que, no mesmíssimo dia onde, pela enésima vez, se anuncia um pacote de medidas de combate à evasão fiscal, esteja a ser debatido e vá ser aprovado o aumento de um imposto que é exactamente o campeão da fuga fiscal, e para cujo aumento vai certamente contribuir este agravamento de taxas. A melhor maneira de promover a evasão fiscal no IVA é certamente a escolhida pelo Governo ao aumentar a taxa do IVA de 19% para 21%! Ao optar pelo aumento do IVA, o Governo nem sequer avaliou (e não parece interessado em avaliar) os impactos negativos que esse agravamento fiscal terá no consumo, e quais as consequências que em cadeia poderão fazer-se sentir no crescimento económico. Quanto às consequências sociais os efeitos são infelizmente bem conhecidos. Mesmo admitindo, e não está provado, a necessidade de aumentar impostos, o Governo toma partido contra os mais desfavorecidos. Em vez de subir impostos directos, os impostos directos que penalizassem os que mais ganham e têm, o Governo opta por voltar a aumentar os impostos indirectos cujos efeitos atingem sobretudo quem já paga e pouco pode. Em vez de tributar o património mobiliário ou as grandes fortunas, o Governo serve-se do imposto cego que atinge sobretudo os mais pobres. As repercussões do aumento do IVA no aumento de inflação e na penalização directa dos mais desfavorecidos mostra bem quem vai ser penalizado. A opção pelo aumento da taxa do IVA como medida central do Programa de Estabilidade e Crescimento confirma bem a insensibilidade social do Programa e mostra que os sacrifícios afinal não são para todos, vão sobretudo afectar os mais desfavorecidos, as famílias de menores rendimentos e os trabalhadores deste País. Esta é a marca profundamente injusta do aumento do IVA e do Programa de Estabilidade que lhe está na origem. Disse.

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