Intervenção de Jorge Machado na Assembleia de República

Altera o mecanismo de prova de condição de recursos, permitindo a atualização permanente dos rendimentos do agregado familiar

Intervenção de Jorge Machado na Assembleia da República sobre o projecto de Lei do PCP que Altera o mecanismo de prova de condição de recursos permitindo a actualização permanente dos rendimentos do agregado familiar.

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(projeto de lei n.º 124/XII/1.ª)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Desde a primeira hora, o PCP alertou para o problema que o Decreto-Lei n.º 70/2010 — a chamada «condição de recursos» — iria criar na sociedade portuguesa. Votámos contra e, desde a primeira hora, denunciámos que este mecanismo legal visava limitar o acesso a prestações sociais.
Hoje, há muitas pessoas que precisam de apoios sociais e não os recebem por culpa desta «condição de recursos» criada pelo PS, com o agrado e o aplauso do PSD e do CDS-PP.
O Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho, desferindo um rude golpe às mais fundamentais prestações sociais, como o abono de família, a bonificação por deficiência, o rendimento social de inserção, o subsídio social de maternidade e paternidade, o subsídio social de desemprego, entre tantos outros, foi um passo fundamental para a destruição dos direitos das pessoas.
A título exemplificativo, o abono de família, que abrangia 1,8 milhões de crianças e jovens em 2010, em maio de 2011 passou a abranger 1,190 milhões de crianças e jovens. Isto é, 637 000 crianças e jovens ficaram sem abono de família, além de milhares que viram a sua prestação social reduzida.
Este diploma, ao alterar os requisitos para a verificação da condição de recursos, incluindo rendimentos que anteriormente não eram contabilizados, veio vedar o acesso de milhares de pessoas a um conjunto significativo de prestações sociais.
Sem deixar de afirmar a injustiça e a necessidade de revogar a condição de recursos — o Decreto-Lei n.º 70/2010 —, há uma realidade, um problema que urge atender. Hoje, fruto da crise económica e social, fruto de opções políticas, fruto do pacto de agressão a que se assiste no nosso País, há cada vez mais famílias que sofrem alterações significativas dos seus rendimentos: de um momento para o outro, há famílias da dita «classe média» que passam para uma situação de pobreza.
Acontece que, segundo o Decreto-lei n.º 70/2010, para a atribuição de prestações sociais o que conta é a declaração de IRS do ano passado. Só que, de um momento para o outro, tudo muda, graças ao desemprego por exemplo, mas para o acesso às prestações sociais tudo fica na mesma! Impede-se, assim, o acesso a prestações sociais com base em rendimentos que já não existem.
Esta injustiça foi denunciada, e muito bem, pela CGTP e pelo Sr. Provedor de Justiça. Aliás, importa aqui citar o Sr. Provedor de Justiça, quando diz: «O critério geral estabelecido no diploma legal supramencionado para o apuramento de rendimentos dos agregados familiares é gerador de manifesta iniquidade, nomeadamente nas situações em que se verifique uma redução anómala dos rendimentos das famílias, impondo-se…» — continua o Sr. Provedor — «… a adoção de um critério que atenda aos rendimentos efetivamente auferidos pelo agregado familiar».
Nessa medida, o PCP entende que é urgente alterar a lei e permitir uma reavaliação das prestações, uma atualização sempre que se verifiquem alterações significativas dos rendimentos dos agregados familiares.
O PCP apresenta um projeto de lei que responde a este problema e, independentemente das divergências que temos em torno do Decreto-Lei n.º 70/2010 e as injustiças que tal Decreto-Lei comporta, importa corrigir esta manifesta injustiça!
(…)
Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
A atribuição das prestações sociais é, efetivamente, uma questão de rigor.
É que, hoje, uma família em que, fruto do desemprego, um ou até os dois membros do agregado familiar fiquem desempregados em fevereiro, no que diz respeito às prestações sociais, só em janeiro de 2013 é que vai ter acesso a prestações sociais, porque só nessa altura é que são considerados os verdadeiros rendimentos.
Trata-se aqui de ter em conta a situação real das famílias. Hoje, uma família que passa para o desemprego não tem nenhum benefício, não pode concorrer ao abono de família, não pode ter direito ao subsídio social de desemprego, porque o que conta são os rendimentos do ano passado.
Que lógica é que isto tem, Srs. Deputados? Absolutamente nenhuma! Mas parece que a bancada do PSD não percebeu esta questão, que é tão simples, e dá um tiro totalmente ao lado. Totalmente ao lado!… E isto é verdadeiramente inaceitável, porque é de uma insensibilidade total. Do que se trata aqui é de ter em conta as condições reais efetivas das famílias!
Termino, Sr. Presidente, contando com a mesma benevolência que deu ao CDS-PP.
Dizem o PS e o PSD que a segurança social não tem condições para se adaptar, que isto iria criar problemas, que seria difícil. Bem, a segurança social terá de adaptar-se. Hoje, há soluções informáticas.
Termino perguntando se é ou não verdade que, quando foi para cortar nas prestações sociais e para cortar nas pensões de reforma, os serviços da segurança social tiveram em conta os rendimentos reais. É ou não verdade que para o rendimento social de inserção são tidos em conta os rendimentos reais, calculados e verificados mensalmente? Então, por que é que para a atribuição de prestações sociais a quem fica no desemprego não é tida em conta a situação real? É inaceitável!

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