...simultaneamente, precisando o tempo e o modo de fixação pelo Governo da percentagem de receitas do IMI, decorrentes da realização da avaliação geral dos prédios urbanos
Preâmbulo
A LEI DAS FINANÇAS LOCAIS, que estabelece o regime financeiro dos municípios e das freguesias, dispõe no seu artigo 13º, nº 4 que “quando a liquidação e ou cobrança dos impostos municipais seja assegurada pelos serviços do Estado, os respectivos encargos não podem exceder 1,5% ou 2,5% dos montantes liquidados ou cobrados, respectivamente”. Este normativo tem aplicação concreta no caso do IMI, imposto não estadual, cujas receitas revertem para os municípios, mas que é gerido pela administração fiscal do Estado. Trata-se, na realidade, de assegurar que a atividade que o Estado desenvolverá, liquidando e cobrando um imposto cuja receita não lhe pertence, será suficientemente compensado dos custos ou encargos que para si poderão resultar do serviço que prestará aos municípios.
Esta, aliás, a mesma lógica que já presidia ao Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro, que aprovou o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis e o Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (alterou o Código do Imposto do Selo, assim como o Estatuto dos Benefícios Fiscais e os Códigos do IRS e do IRC e que revogou o Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, o Código da Contribuição Autárquica e o Código do Imposto Municipal da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações). Este diploma, confirmando o IMI como um imposto não estadual, cujas receitas revestem para os municípios, não deixa de estabelecer, no nº 5 do artigo 15º que: “quando se proceder à avaliação geral dos prédios urbanos ou rústicos, será afetada para despesas do serviço de avaliações uma percentagem até 5, a fixar e regulamentar por portaria do Ministro das Finanças, do IMI cobrado nos anos em que se realizar aquela avaliação”.
Este diploma, e também nesta matéria em concreto, seria objeto de nova alteração com a Lei nº 60-A/2011, de 30 de novembro, que aditaria um novo artigo, o 15º-M que ao determinar nos nºs 1 e 2 deste artigo que: ”1 - Para despesas relacionadas com a avaliação geral dos prédios urbanos é afecta uma verba resultante da execução das receitas tributárias do imposto municipal sobre imóveis relativo aos anos de 2011 e de 2012, a arrecadar em 2012 e 2013, respectivamente, ao abrigo do disposto no n.º 5 do artigo 15.º “ e que: ”2 - A verba a afectar à avaliação geral é estabelecida por portaria do Ministro das Finanças, ouvida a Associação Nacional de Municípios Portugueses”. – vem “confirmar” a mesma lógica: a) o Estado deverá ser pago dos encargos que contrair com os serviços prestados aos municípios; b) tais encargos não poderão exceder 1,5% ou 2,5% dos montantes liquidados ou cobrados e c) a avaliação geral dos prédios rústicos ou urbanos e as despesas para os serviços de avaliação inerentes seriam cobertas, até uma percentagem de 5% a afetar da cobrança do IMI cuja fixação caberia d) ao Ministro das Finanças por portaria.
Este diploma revela, pois, uma lógica sistemática e um espírito e letra que não deveriam suscitar dúvidas. Ao estabelecer um intervalo que poderia ir “até 5% do IMI cobrado nos anos em que ser realizar a avaliação geral dos prédios urbanos” tributados em IMI, o legislador visou garantir a intangibilidade das receitas do IMI consignadas aos municípios, caso as despesas com a concretização da avaliação viessem, a superar o limite dos 5% e, simultaneamente, instituiu como padrão ou referencial único e exclusivo de fixação pelo Governo da percentagem de receitas do IMI, o critério das despesas ou encargos, casuisticamente considerados, efetivamente incorridos com a realização da avaliação geral.
Com um quadro legal tão explicitamente definido, com critérios tão evidentes, seria de convir que o Ministro das Finanças procurasse concretizar, através da necessária portaria, os encargos efetivamente suportados pelo Estado com o desempenho da tarefa da avaliação e não produzisse um texto regulamentar, como o que se consubstancia na Portaria nº 106/2012, de 18 de abril, que, em simultâneo, ou numa penada, se revela desconforme com o critério legal definido pelo legislador no art. 15º, nº 5, do Decreto-Lei nº 287/2003, ao demitir-se da fixação de um valor em função da demonstração dos custos efetivos a suportar, a final, pelo Estado – incorrendo em ilegalidade e, como se não bastasse, revela-se constitucionalmente inadmissível.
O critério que subjaz à Portaria é inadequado, injustificado e arbitrário, viola grosseiramente os princípios da proporcionalidade e da proteção da confiança, enquanto emanações do princípio do Estado de Direito democrático. A ser admitido este expediente, dinamitar-se-ia a sistemática da regulação jurídico-constitucional das relações (financeiras) entre o Estado e os municípios (Estado em sentido “lato” versus Estado em sentido “estrito”), e impor-se-ia um verdadeiro imposto aos municípios.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
(Aditamento ao artigo 15º - M.º do Decreto-lei n.º 287/2003, de 12 de novembro)
São aditados um nº 3 e nº 4 ao artigo 15.º - M do Decreto-lei n.º 287/2003, de 12 de novembro com a seguinte redação:
3 — A portaria do Ministro das Finanças fixará o valor da contrapartida a pagar ao Estado por parte dos municípios com base na demonstração dos custos efetivos suportados por aquele.
4 – O montante que vier a ser determinado nos termos no número anterior será deduzido nas transferências a efetuar no primeiro ano em que ocorram os efeitos fiscais dessa atualização.
Assembleia da República, em 6 de Junho de 2012