Projecto de Lei N.º 674/XII/4.ª

Adota medidas urgentes para a reparação dos direitos lesados pela paralisia da plataforma informática CITIUS e para a normalização do funcionamento dos tribunais judiciais

Adota medidas urgentes para a reparação dos direitos lesados pela paralisia da plataforma informática CITIUS e para a normalização do funcionamento dos tribunais judiciais

Preâmbulo

Como é do conhecimento geral, a plataforma informática CITIUS, tornada um elemento essencial para o funcionamento dos tribunais judiciais, por servir de base à desmaterialização dos processos e por ser plataforma obrigatória para a entrega de peças processuais nos tribunais cíveis, embora também seja utilizada em parte muito significativa dos processos de natureza criminal, entrou em colapso.

A anomalia, que o Governo anunciava ser reparada em poucas horas, prolonga-se há semanas. A minimização do problema, considerado pela Ministra da Justiça como um mero percalço, revelou-se uma falsidade. Passado um mês sobre a entrada em vigor do “mapa judiciário”, imposta teimosamente pelo Governo de modo irresponsável, os tribunais judiciais passam por uma situação caótica, com a plataforma CITIUS a poder ser utilizada apenas para a ínfima minoria dos processos entrados a partir de setembro de 2014. Quanto aos demais processos, em número superior a 3,5 milhões, não se conhece ainda, da parte do Governo, qual a solução para tão grave problema, havendo uma enorme incerteza e um justo receio de que a situação caótica criada assuma proporções de catástrofe quanto ao funcionamento da Justiça e dos tribunais.

Apesar da leviandade com que o Governo tem encarado a situação, negando que esta tenha repercussões graves no exercício de direitos por parte dos cidadãos, o próprio Conselho Superior da Magistratura deu conta das suas inquietações e apresentou ao Governo sugestões de intervenção legislativa para tentar reparar problemas legais decorrentes da situação existente, relacionados designadamente com prazos judiciais que a partes se vejam impossibilidades de cumprir devido à paralisia do CITIUS. Estas preocupações juntaram-se às que os advogados, enquanto maiores utentes do sistema, têm vindo a manifestar insistentemente.

O PCP, que sempre discordou deste “mapa judiciário” e da sua entrada em vigor em 1 de setembro de 2014, e que propôs inclusivamente que a entrada em vigor de qualquer reforma não entrasse em vigor antes de setembro de 2015, para que pudessem ser atentamente estudadas todas as suas implicações, propõe-se contribuir para uma solução legislativa que permita pelo menos minorar os problemas existentes.

Na verdade, importa acautelar as situações em que, por inoperacionalidade do CITIUS, os advogados não conseguem ter acesso aos processos; as situações em que por inoperacionalidade do CITIUS os advogados não podem praticar atos que dele estão dependentes; e as situações em que por inoperacionalidade do CITIUS e falta de acesso aos processos físicos (que não se sabe onde estão ou não se conseguem encontrar) os advogados estão impedidos de praticar atos ou exercer o mandato.

A declaração de justo impedimento da prática de atos processuais por via do sistema CITIUS, publicada em 9 de setembro, embora necessária, não pode considerar-se suficiente, na medida em que não acautela as situações de atos processuais (nomeadamente recursos) que não possam ser praticados por não haver acesso aos processos a que se referem.

Apesar das repetidas afirmações da Ministra da Justiça de que o “percalço” do CITIUS não lesaria quaisquer direitos e que não seria necessária qualquer medida legislativa, a realidade encargar-se-ia de desmentir tais afirmações, sentindo-se o Governo obrigado a aprovar em Conselho de Ministros no dia 2 de outubro, a medida de suspensão dos prazos judiciais que considerava desnecessária. Porém, subsistem dúvidas sobre a constitucionalidade orgânica dessa medida legislativa, caso não seja aprovada pela Assembleia da República mediante lei material ou Autorização Legislativa.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º
Suspensão de prazos judiciais

1 - Entre 27 de agosto de 2014 e a data de publicação da declaração referida no artigo 3.º, consideram-se suspensos todos os prazos para a prática de atos em juízo relativos a processos em que é legalmente obrigatório a utilização do sistema CITIUS ou cuja prática dependa do acesso a informação nele contida.

2- Sem prejuízo do número anterior, fica ressalvada a validade dos atos processuais entretanto praticados com conhecimento de todos os intervenientes processuais.

3 – Durante o período de suspensão referido no n.º 1, os atos processuais praticados pelas partes, seus mandatários ou outros intervenientes, por qualquer meio alternativo, designadamente em suporte de papel, telecópia, correio eletrónico ou outro, consideram-se validamente praticados e sem sujeição a qualquer penalização em matéria de custas processuais.

4 – Enquanto não for declarada a operacionalidade do sistema CITIUS nos termos da presente lei, aos atos das partes, aplica-se o regime previsto nos artigos 150.º a 153.º do Código de Processo Civil na redação anterior à reforma operada pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, não podendo haver qualquer penalização em matéria de custas processuais, pelo não uso de meios eletrónicos.

Artigo 2.º
Comissão de Acompanhamento

1 – Para efeitos de acompanhamento das medidas destinadas a assegurar o regresso à normalidade do funcionamento dos tribunais judiciais e a total operacionalidade do sistema CITIUS, é criada uma Comissão de Acompanhamento a funcionar junto do Ministério da Justiça, composta por:

a) Um representante do Ministério da Justiça, que preside;
b) Um elemento designado pelo Conselho Superior da Magistratura;
c) Um elemento designado pelo Conselho Superior do Ministério Público;
d) Um elemento designado pela Ordem dos Advogados;
e) Um elemento designado pelo Conselho dos Oficiais de Justiça, sob proposta das organizações representativas dos funcionários de justiça.

2 – A designação dos elementos que integram a Comissão de Acompanhamento deve ser feita pelas respetivas entidades no prazo de cinco dias após a entrada em vigor da presente lei.

Artigo 3.º
Termo da suspensão

1 - A suspensão dos prazos judiciais estabelecida pela presente lei cessa em cada comarca mediante declaração formal do Ministério da Justiça, a publicar no Diário da República e na plataforma CITIUS, sob proposta da Comissão de Acompanhamento, quando esta considerar que o sistema informático se encontra totalmente operacional.

2 – Os atos processuais em suporte físico ao abrigo do regime transitório previsto na presente lei podem ser praticados até cinco dias úteis após a publicação da declaração referida no número anterior.

Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.

Assembleia da República, em 3 de outubro de 2014

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