Pergunta ao Governo N.º 3970/XI/1

Administração da Carris procura impor repressão com processos disciplinares ilegais

O Grupo Parlamentar do PCP tomou conhecimento de que a Administração da Carris decidiu
avançar com processos disciplinares para despedimento a 24 trabalhadores da empresa, por não
terem prestado os serviços mínimos durante a greve de 27 de Abril para os quais estavam
designados.
Trata-se de um processo claramente político, sem qualquer base legal, e que tem como único
objectivo a repressão da liberdade de organização e acção sindical, e o propósito de incutir medo
nos trabalhadores da empresa e do sector.
Como fica cabalmente demonstrado na resposta dos trabalhadores à Nota de Culpa, a greve
(art.º 536 nº1 do Código do Trabalho) suspende o contrato de trabalho do trabalhador aderente,
com excepção dos trabalhadores AFECTOS à prestação de serviços mínimos (art.2 537 n24) e não em
relação aos DESIGNADOS para a prestação desses serviços.
Os trabalhadores designados para o cumprimento de serviços mínimos apenas ficam
obrigados a cumprir esses serviços se a sua designação for conforme à lei, se não existirem
trabalhadores não aderentes à greve em número suficiente para o cumprimento desses serviços e
se os ditos serviços se destinarem, efectivamente, à satisfação de necessidades impreteríveis.
Ora, como o Governo conhece, o número de trabalhadores não aderentes à greve de 27 de
Abril, escalados para serviço noutras carreiras não abrangidas nos serviços mínimos, eram
suficientes para garantir a prestação desses serviços. Só este facto, é suficiente para demonstrar a
total legalidade da acção dos trabalhadores que aderiram à greve apesar de estar DESIGNADOS para
os serviços mínimos. Mas a esta situação acresce ainda o legítimo direito destes trabalhadores se
recusarem à aceitar a legalidade dos serviços mínimos decretados para a greve de 27 de Abril.
Não nos restam dúvidas de que, independentemente das decisões da Administração da
Carris, os Tribunais terminarão por dar razão aos trabalhadores da Carris. Aliás, estamos seguros de
que nesta matéria a própria Administração da Carris tão pouco terá dúvidas.
No entanto, o comportamento da Administração da Carris mais se agrava quando, ao arrepio
do art.º 541 do Código de Trabalho (que determina a punição com falta injustificada do
comportamento de que estes trabalhadores são acusados) avança com processos disciplinares para
o seu despedimento.
Entramos agora claramente no âmbito do art.º 540 do Código, que considera nulo «o acto
que implique coacção, prejuízo ou trabalhador por motivo de adesão ou não a
greve», e aponta este comportamento da entidade patronal como contra-ordenação muito grave.
Aliás, a fragilidade jurídica destes processos disciplinares é dos aspectos que mais releva o
seu carácter político e o seu simples objectivo de intimidar a luta e a acção sindical na Carris.Ao
ameaçar com a mais brutal forma de punição ao seu alcance -o despedimento com justa causa – a Administração da Carris claramente visa parar o processo de luta na Empresa e intimidar os
trabalhadores da Empresa, e fá-lo recorrendo a formas de coação e assédio claramente puníveisà
luz do Código de Trabalho, como se pode ler no artº 29 "Entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em factor de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.”
A gravidade desta situação tem pois um carácter duplo. Por um lado, a gravidade de 24
trabalhadores ameaçados brutalmente de perderem o seu posto de trabalho, o seu sustento e dos
seus. Mas por outro, a gravidade de um conjunto de Administradores Públicos envolvidos no
cometimento de uma série de ilegalidades,e afrontando claramente a lei. Perante a gravidade da
situação, e sendo a Carris uma empresa tutelada pelo Ministério dos Transportes, importa clarificar
qual o posicionamento do Governo perante este comportamento da Administração da Carris, para além de dar conta da posiçãoda Administração.
Assim, ao abrigo do disposto na alínea d) do Artigo 156.º da Constituição da República
Portuguesa e em aplicação da alínea d), do n.º 1 do artigo 4.2 do Regimento da Assembleia da
República, perguntamos ao Governo, através do Ministério das Obras Públicas. Transportes e
Comunicações o seguinte:
1. Está o Ministério solidário com este acto da Administração da Carris, de abrir processos
disciplinares para despedimento a 24 trabalhadores da Empresa?
2. Vai o Ministério ordenar o arquivamento imediato destes processos, como se impõe?
3. Face ao exposto, vai o Ministério proceder para que sejam aplicadas à Administração da
Carris as punições previstas no Código do Trabalho para o seu comportamento?
Assembleiada República,30deJunhode2010.
BrunoDias
OsDeputados, --h '
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MiguelTiago

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