Intervenção de Jorge Pires, Comissão Política do Comité Central , XXII Congresso do PCP

A educação - Escola Pública

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Camaradas,
Amigos,

A educação que devia constituir um tema de esperança para o nosso povo, é hoje, pelo contrário, um tema de grande ansiedade e de profundas preocupações, tal é o resultado da ofensiva política e ideológica contra o direito ao ensino e a Escola Pública.

Uma ofensiva que tem na sua matriz uma aposta muito forte no objectivo de manter o ensino como aparelho de reprodução do capitalismo, para recriar as condições materiais e ideológicas da sua própria existência.

A crescente desresponsabilização do Estado, o financiamento publico do ensino privado e a subalternização de critérios pedagógicos em prol de critérios economicistas e elitistas, a que se junta nas últimas décadas a desvalorização sistemática dos trabalhadores da educação (aproveito para saudar a partir desta tribuna, os trabalhadores da educação – professores, auxiliares de acção educativa, assistentes técnicos, psicólogos, pelas dezenas de lutas travadas ao longo dos últimos quatro anos, em defesa dos direitos laborais e da Escola Pública), principalmente os professores e educadores, são elementos estruturantes da campanha contra o ensino e a escola pública.

A escola e a sociedade, a educação e a democracia condicionam-se mutuamente. Esta realidade é clara desde as sociedades antigas em que a escola se destinava aos poucos que desempenhavam funções prestigiadas socialmente, até hoje, em que a escola está cada vez mais virada para os interesses e as necessidades do mercado de trabalho. Por este motivo sempre existiu um confronto na construção do modelo educativo, entre os que defendem a democratização da sociedade e os que defendem os interesses das classes dominantes.

Já em 1996 a própria OCDE declarava que, quanto à escola pública do futuro, ela não faria mais que, e passo a citar, “assegurar o acesso à aprendizagem daqueles que nunca constituirão um mercado rentável e cuja exclusão da sociedade em geral se acentuará, à medida que outros continuarão a progredir”, ou seja, no futuro o ensino público será, na opinião da OCDE, para os pobres diabos dos filhos dos trabalhadores sem recursos financeiros para frequentar as escolas de elite.

O Estado não pode limitar-se a reconhecer o direito à educação, ao ensino e à igualdade de oportunidades na formação escolar entendida no sentido material. Dever obrigar-se, a eliminar obstáculos à sua realização, e a criar as condições que permitam na prática o acesso a todos, a todos os níveis do conhecimento, ao contrário do que acontece hoje.

No quadro da ofensiva, da responsabilidade dos sucessivos governos do PS, PSD e CDS, agora com o apoio do Chega e da IL, destaca-se a desvalorização social e profissional dos trabalhadores da educação, em particular dos professores e educadores, um problema cuja gravidade, para além das consequência imediatas, nomeadamente o numero muito significativo de alunos sem pelo menos um professor a uma disciplina, só mais tarde será devidamente avaliada, nomeadamente as implicações negativas na qualidade das aprendizagens.

Perante este gravíssimo problema, para o qual o PCP há muito alertou, qual foi a opção do actual governo?

Recrutou milhares de licenciados com habilitação própria, sem formação para a docência, pondo em causa a qualidade das aprendizagens, procurou, sem sucesso, que algumas centenas de reformados, que pretendiam que fossem 500, voltassem a leccionar (apenas 63, aceitaram o desafio) e dos mais de 600 mil que saírampor motivos que não a reforma, apenas pouco mais de 600 regressaram) opções que, como os números indicam, apenas adiam a resolução do problema. Hoje, já no final do primeiro período lectivo, ainda cerca de 30 mil alunos ainda têm a falta de pelo menos um professor a uma disciplina.

Não é escondendo o problema, e muito menos mentindo aos portugueses, como fez o Ministro da Educação, que aquele se resolve. É, invertendo a degradação do estatuto profissional e social dos professores, valorizando a carreira docente, criando boas condições de trabalho e salários dignos, acabando com a precariedade, que se pode atrair mais jovens para a profissão.

Entretanto vão insinuando que os professores podem vir a ser substituídos por máquinas cada vez mais poderosas e inteligentes, como se fosse possível realizar a educação em espaços virtuais, e quando muitas das tecnologias da moda, em particular a IA, ameaçam uma educação pública, culta, criativa, humana.

O que defendemos para o nosso País, é uma reconfiguração do ensino público que habilite os estudantes a serem criadores de um País avançado, consciente, democrático.

Por isso é fundamental que a educação escolar seja sustentada numa organização do ensino capaz de unir a instrução à formação para a cidadania, visando a participação critica e activa de cada indivíduo na sociedade

Um sistema educativo que tenha na sua matriz e como objectivo central a cultura integral do indivíduo – tal como foi desenvolvido por BJC na sua obra –, valorize a educação e o ensino público, democraticamente gerido e dotado de objectivos, estruturas, programas e meios financeiros e humanos que permitam a concretização do direito à educação e ao ensino e à igualdade de oportunidades de acesso e sucesso educativo a todos os portugueses

Um ensino desgovernamentalizado, autónomo e responsável, é o verdadeiro desafio que se coloca aos trabalhadores e ao povo.

Um ensino público que pugne por programas curriculares estruturantes que preparem os seus formandos, não só para a vida produtiva, mas também para uma intervenção consciente na sociedade.

Um sistema educativo que crie uma rede pública de creches que integre, até 2030, as crianças dos 0 aos 3 anos, enquanto primeira etapa da educação de infância.

E termino com um comentário recorrendo à obra de Bento Jesus Caraça. Disse ele que «Estamos na situação do caminheiro que, após longa jornada, vê subitamente alongar-se o caminho com uma volta inesperada numa dobra de terreno. Saibamos nós, tentativos obreiros em construção de concreta cidadania humana, integra e integral, estar à altura, pela teoria e na prática, das caminhadas dificultosas que os dias de hoje, cada vez mais, reclamam.»

Viva XXII Congresso do PCP!
Viva o PCP!

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