«Desabafo civil» - Ruben de Carvalho no «Diário de Notícias»

O desabafo que se segue tem seguramente todas as desvirtudes dos desabafos: para pouco serve e arrisca-se a não encontrar grandes concordâncias. Terminou ontem o Serviço Militar Obrigatório e, ao que se diz, com generalizado contento.

Faço parte de uma geração para a qual «ir para a tropa» era puro e imediato sinónimo de ir para a guerra. Sucede porém que nem foi a existência do SMO que gerou ou sequer tornou possível – aquela guerra, nem foi o seu fim que lhe pôs termo. De certa forma, neste último aspecto, até ocorreu num dia de Abril exactamente o contrário.

Não me parece assim que o fim do princípio cidadão-soldado constitua um contributo mínimo para mais paz no mundo. Basta olhar à volta. Igualmente não parece que contribua para eliminar, ou mesmo não cultivar, sindromas de agressividade, desenvolvimento de mitologias de violência e crueldade. Basta olhar para os jogos de computador, as televisões, as playstations.

A questão é que a playstation não prepara, não esclarece, não soluciona a violência: é inimputável geradora de uma agressividade gratuita e virtual, torna a violência e a morte numa diversão irresponsável e obtusa, o mesmo é dizer, torna o cidadão – pessoal e colectivamente – ignorante e impotente perante a violência real, cada vez mais entregue a profissionais. O SMO constituía tanto uma preparação social para a violência quanto uma educação social para a evitar. Porque ali a violência não era jogo ou brincadeira.

Melhorámos? O problema é que, habitualmente, quando este tipo de dúvidas se esclarece é tarde.

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