Intervenção de Manuel Loff na Assembleia de República, Reunião Plenária

Pela rede pública e de qualidade de creches que assegure vaga para todas as crianças

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Sr. Presidente, Srs. Deputados

Sobre a gratuitidade da frequência de creche é absolutamente justo recordar que o caminho percorrido para a sua concretização progressivamente alargada a milhares de crianças desde 2020 só foi possível pela insistência, determinação, proposta e iniciativa do PCP, confirmada pela sua inscrição no Programa eleitoral do PCP de 2019, seguida da apresentação de proposta no Orçamento do Estado para 2020 e de outras iniciativas legislativas, do Projeto de Resolução n.º 3/XIV e do Projeto de Lei n.º 371/XIV. Quando em 2019 o PCP propôs creches gratuitas para todas as crianças, muitos julgaram-na uma proposta impossível. Também foi assim com os manuais escolares, e a verdade é que hoje são gratuitos até ao 12º ano.

Por proposta do PCP, a gratuitidade das creches começou em 2020 a ser aplicada às crianças das famílias mais pobres, abrangendo cerca de 30 mil bebés.

Em Outubro de 2021, o projecto-lei 371/XIV do PCP, que prevê a criação de uma rede pública de creches e a gratuitidade para todas as crianças, foi aprovado na Assembleia da República, embora com limitações quanto à sua aplicação.

Em resultado da iniciativa do PCP, os bebés nascidos depois de 1 de setembro de 2021 têm direito a creche gratuita. É um importante passo num caminho que tem que se fazer mais rapidamente e que, enquanto não se ampliar a todas as crianças, não resolverá o problema.

O PCP não defende apenas a gratuitidade da creche. Sem prejuízo do papel complementar e relevante que cabe às instituições de solidariedade social, que assegurando uma parte da resposta, o PCP defende a criação de uma rede pública capaz de suprir a carência de vagas que hoje se verifica em Portugal e que constitui, na prática, a negação do direito à creche e da sua gratuitidade para milhares de crianças e respetivas famílias.

É absolutamente necessário que seja efetuado um levantamento rigoroso da situação existente. Segundo um estudo apresentado em fevereiro passado sobre A Gratuitidade das Creches - Nota Rápida 11, elaborado pelo PlanAPP - Centro de Competências de Planeamento de Políticas e de Prospetiva da Administração Pública, conclui que, para a população residente entre 0-3 anos, seria necessário duplicar o número de vagas disponíveis para conseguirmos uma cobertura potencialmente universal das creches.

A situação atual é socialmente insustentável. A resposta de creche está dependente da oferta de instituições do setor social e cooperativo (na sua grande maioria) ou do setor privado, sendo a carência sentida especialmente nas áreas urbanas.

Para tanto, a criação de uma rede pública que permita, assegurar pelo menos 100 mil vagas que se estima estarem em falta, cumpre o objetivo de assegurar a universalidade da resposta de creche em Portugal, a cobertura de todo o território nacional e a garantia de condições de igualdade a todas as crianças no acesso a uma resposta de qualidade nesse âmbito, independentemente das suas condições socioeconómicas.

A gratuitidade da creche assume particular relevância na vida das famílias e constitui um estímulo à natalidade. É uma medida com um impacto muito positivo, uma vez que permite a uma família ter a segurança de saber que, tomando a decisão de ter um filho, tem assegurada a resposta de creche e que a mesma é gratuita.

As crianças, as famílias, este país precisam de uma rede pública de creches, que assegure que todos os bebés têm acesso a equipamentos de qualidade, que as famílias têm vaga garantida e que seja parte de uma estratégia de combate ao défice demográfico.

Portugal tem um grave défice demográfico, que tem vindo a agravar-se nos últimos anos. Todos os estudos demonstram que as pessoas em idade fértil querem ter mais filhos. Se muitos jovens emigrantes portugueses que procuram fora do nosso país as condições de vida que não encontram em Portugal têm filhos nos países para onde emigram, facilmente se percebe que as razões que presidem à decisão de não ter filhos ou de adiar essa decisão está naturalmente correlacionada com uma realidade que, em Portugal se caracteriza pela precariedade, o desemprego, o custo incomportável da habitação, a falta de condições de trabalho dignas, os horários desregulados, a falta de tempo para viver.

Relativamente às várias iniciativas hoje trazidas à discussão, as questões nelas colocadas confirmam o que o PCP tem afirmado: em primeiro lugar, a verdadeira articulação da vida profissional com a vida pessoal e familiar só é possível alcançar com o combate ao desemprego e à precariedade, com a revogação dos mecanismos que desregulam os horários de trabalho, como os bancos de horas e as adaptabilidades, os turnos rotativos intensos e o trabalho noturno, assim como com a aplicação da redução da jornada de trabalho semanal para as 35 horas, complementado com a valorização dos salários e melhores condições de trabalho que permitam aos pais trabalhadores terem tempo para viver em família e para acompanhar os seus filhos.

Em segundo lugar, deverá ainda ser garantido o acesso a equipamentos de apoio à infância, nomeadamente através da implementação da gratuitidade de acesso às creches para todas as crianças e o alargamento das vagas em creche, sem introduzir esquemas de seleção que possam ter impacto  negativo na vida  das famílias (e há vários na legislação atualmente em vigor) mas antes constituam um contributo à articulação da vida profissional com o tempo para viver em família, entre outras medidas de promoção dos direitos das crianças.

O PCP defende que a implementação de uma rede pública de creches é a melhor forma de garantir a universalização da gratuitidade e do alargamento das vagas necessárias à nossa população, e representa o cumprimento de uma função social do Estado cuja gestão e funcionamento deve chamar a si, permitindo criar as condições e alterar os critérios de admissão e colocação das crianças nos equipamentos de apoio à infância em verdadeira articulação com as necessidades das famílias. 

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