Debate do Estado da Nação
Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
Passou um ano de aplicação do pacto de agressão subscrito pelo PS e pelos partidos do atual Governo, com o FMI, a União Europeu e o Banco Central Europeu. Passou um ano de Governo PSD/CDS-PP e os resultados estão à vista: o estado da Nação é de profunda degradação económica, social, nacional.
Exploração, empobrecimento, injustiças e desigualdades sociais, desemprego, recessão, afundamento e desastre nacional, para benefício do capital monopolista e do continuado saque aos recursos nacionais, tais são as consequências deste ano da ação deste Governo.
Um milhão e duzentos mil trabalhadores no desemprego, alteração, para pior, do Código do Trabalho e a liquidação de direitos, essa prática de generalização da precariedade com contratação à hora por valores já abaixo do salário mínimo, o corte de salários, pensões e subsídios, a pobreza extrema, o ataque ao poder local, a destruição dos serviços públicos, a condenação de centenas de milhares de portugueses a uma morte antecipada por falta de acesso aos cuidados de saúde, a expulsão das novas gerações do País por razões económicas, a corrupção e o nepotismo, tais são algumas das chagas deste rumo que marca o presente de sofrimento e cada vez mais compromete o futuro.
Os trabalhadores e o povo português estão fartos disto. Disseram-no ao longo deste ano com uma intensidade de protesto e luta como há muito não se via. Dizem-no hoje mesmo os médicos na sua luta em defesa do Serviço Nacional de Saúde, que daqui saudamos.
Dizem-no os trabalhadores dos mais diversos sectores e a população por todo o País, numa ação que se amplia traduzindo o imenso descontentamento, que alastra.
Apenas um ano depois da sua posse, o desgaste e a erosão da base social e política deste Governo são evidentes.
O Primeiro-Ministro disfarça ou procura disfarçar isso multiplicando-se em desculpas e mistificações; o Dr. Paulo Portas aproveita a qualidade de Ministro dos Negócios Estrangeiros para andar pelo mundo a fugir do País e das consequências desastrosas da política que o seu Governo está a executar.
Prosseguindo e intensificando um rumo de décadas, o pacto de agressão com a troica está a levar a uma situação limite. Portugal não sai do pântano em que se afunda insistindo na política que o conduziu para ele. Não é saída aprofundar a agressão, como não é saída prolongá-la mais e mais anos ou instituí-la como instrumento permanente nos tratados, resoluções ou diretivas da União Europeia.
No atual estado da Nação, os responsáveis pelo descalabro esforçam-se para esgrimir este ou aquele truque propagandístico. É a exaltação do resultado da balança comercial falsificando o significado das exportações e omitindo que traduz o afundamento do consumo privado e do investimento e não a substituição de importações por produção nacional.
É de lembrar que trazem aqui um exemplo que mostra uma situação semelhante, no caso, de mais extrema miséria e degradação que se verificou no nosso País, o tempo da II Guerra Mundial. É esse o exemplo que querem dar hoje e para o futuro, mas recusamos esse caminho.
É ainda o pular de alegria, porque com a sua política só vão destruir, durante este ano, 5000 milhões de euros de riqueza do País, quando pensavam poder destruir um pouco mais.
Dizem que a recessão é mais ligeira, mas quando chegam a este ponto mostram já não ter mais nada para convocar a favor da sua política de desastre nacional. Resta-lhes o argumento do medo. Dizem «se não for assim é pior», mas, como se vê, continuar assim é ficar cada vez pior.
No estado a que a Nação chegou, medo só há que ter da continuação do rumo de afundamento que está em curso e que este Governo está a promover.
É necessária e urgente a adoção de uma política patriótica e de esquerda que liberte o País dos interesses do grande capital e abra caminho para o desenvolvimento, a melhoria das condições de vida, o aprofundamento da democracia e a afirmação da soberania nacional.
O PCP defende a rejeição do pacto de agressão contra os trabalhadores, o povo e o País. O PCP defende a imediata renegociação da dívida pública, nos seus prazos, juros e montantes. Sim! É essencial, é urgente! Renegociação da dívida nos montantes, recusando, desde logo, a componente ilegítima dessa dívida.
Não aceitamos como legítima uma dívida que resultou da imposição e aceitação da destruição das estruturas produtivas nacionais fazendo-nos comprar fora aquilo que podíamos produzir cá.
Não aceitamos como legítima uma dívida que se agravou com a canalização de dinheiro público ao serviço do grande capital para tapar buracos como o BPN ou o BPP e com muitos milhares de milhões de euros para a banca.
Não aceitamos como legítima uma dívida que resulta do sistema de extorsão montado pelo BCE, com um empréstimo, sim, um empréstimo de dinheiro a 1% aos bancos para estes o emprestarem a 7% ou 8% ao Estado português. Sim, esta dívida é ilegítima. Por que não emprestaram diretamente? Por que recorreram a este saque, a esta montagem de extorsão?
Renegociação da dívida também nos prazos e nos juros, não aceitando a extorsão que representam. Cabe aqui sublinhar que não é suportável pagar mais de 7300 milhões de euros por ano, só em juros, por uma dívida em grande medida ilegítima e que continua a aumentar.
É indispensável garantir que, no pagamento da dívida legítima, entre juros e amortizações, não se ultrapasse o valor de uma determinada percentagem das exportações — um critério idêntico ao garantido à Alemanha após a II Guerra Mundial. Já foi feito, já foi praticado, deve ser assumido nas condições de hoje.
Só assim, dizemo-lo aqui hoje, só assim será possível evitar o comprometimento das condições de vida das atuais e das futuras gerações e libertar os recursos necessários ao crescimento económico, à criação de emprego, ao desenvolvimento do País.
O PCP defende o fim das privatizações e a recuperação do controlo público dos setores estratégicos da economia nacional, incluindo a banca, colocando-os ao serviço dos trabalhadores e do povo. Não se pode aceitar que saiam milhares de milhões de euros do Estado para os bancos e continuem a ser os interesses da acumulação e da especulação a comandar a sua gestão. Se, como aconteceu recentemente, para dois dos maiores bancos o Estado canalizou uma verba três vezes superior ao seu valor nominal, há todas as razões para que a gestão desses bancos seja pública e ao serviço dos interesses nacionais.
O PCP, na salvaguarda do interesse público, defende a anulação ou a renegociação de contratos das chamadas «parcerias público-privadas» e a adoção de uma política fiscal que acabe com o escandaloso favorecimento da banca e da especulação financeira, bem como que ponha termo às rendas inaceitáveis que se verificam.
O PCP defende o desenvolvimento de uma política de defesa da produção e do aparelho produtivo nacional que substitua importações por produção nacional, assegure o aproveitamento dos recursos nacionais, estimule o crescimento económico, crie emprego, apoie as micro, pequenas e médias empresas e diversifique as relações económicas e comerciais do País.
O PCP defende o aumento dos salários, designadamente do salário mínimo nacional, das reformas e pensões, das prestações sociais, num processo de combate às injustiças e de melhoria das condições de vida, mas também de estímulo ao mercado interno, de valorização do trabalho e dos trabalhadores.
O PCP defende a afirmação dos serviços públicos na saúde, educação, segurança social, justiça, segurança das populações, cultura e transportes.
O PCP defende a assunção de uma política de defesa da soberania e da independência nacionais.
Há soluções, não há que ter medo do futuro. É preciso libertar os trabalhadores e o povo português do domínio do capital monopolista, libertar Portugal da dependência, libertar a Constituição da República da tirania que a amachuca e acorrenta.
Este é o tempo de um novo caminho. Quando é desenvolvida uma política contra a Constituição, quando o Presidente da República foge gravemente às suas responsabilidades, deveres e juramento, quando o Tribunal Constitucional aponta inconstitucionalidades, mas não obriga à sua retificação, é bom lembrar que a soberania reside no povo e que nas suas mãos está a chave do futuro. Assim foi e assim será!
O estado da nação portuguesa neste tempo em que vivemos exige a rutura e aponta o caminho: contra a política antipatriótica e de direita, uma política patriótica e de esquerda; contra o retrocesso social e civilizacional, os valores de Abril, no futuro de Portugal.
Intervenção de Francisco Lopes na Assembleia de República
"Há soluções, não há que ter medo do futuro."
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