Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

"O tempo não é de atentismo! É um tempo de participação, de acção, de construção de um futuro melhor!"

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Sr. Presidente,
Sr. Primeiro- Ministro,
Srs. Deputados:
Hoje cumpre-se um importante passo. Milhões de portugueses respirarão de alívio pelo fim de um Governo que, ao longo de mais de quatro anos, com a maior arrogância e frieza, lhes infernizou a vida e tinha como objetivo prosseguir a sua obra destruidora.
A derrota da coligação PSD/CDS é inseparável da luta que os trabalhadores e o povo travaram contra a política de retrocesso social e de declínio económico.
Os resultados das eleições legislativas do passado dia 4 de outubro, em que a coligação PSD/CDS perdeu mais de 700 000 votos, viu reduzida a sua votação em 12 pontos percentuais, perdeu 25 Deputados e perdeu a maioria absoluta, exprimem uma clara condenação à política prosseguida nos últimos quatro anos pelo Governo PSD/CDS.
Não podemos deixar de assinalar o significado e a dimensão dessa condenação num quadro em que o Governo e os partidos que lhe deram suporte chantagearam o povo português com o medo, desencadearam uma operação de instrumentalização do aparelho do Estado ao serviço dos seus interesses eleitorais e mantiveram escondida a sua verdadeira agenda e programa político.
O PSD e o CDS não querem que se diga a verdade e que se fale da realidade.
O Governo PSD/CDS deixa um enorme rasto de destruição: o desemprego real a atingir mais de 1,1 milhões de portugueses; a precariedade generalizada; a dura realidade dos baixos salários dos trabalhadores por conta de outrem e, em particular, dos que auferem o salário mínimo nacional ou um valor ainda mais baixo; a esmagadora maioria das reformas inferior ao limiar de pobreza; o brutal subfinanciamento da saúde e da educação, negando o direito ao seu acesso pleno a milhões de portugueses; os sucessivos cortes nas prestações sociais, como se verificou este ano, com mais cerca de 520 milhões de euros suprimidos; os 2,8 milhões de portugueses em risco de pobreza. Esta é uma situação marcada por níveis dramáticos de desemprego, de pobreza e de crescentes desigualdades sociais.
Este é um País a braços com uma crise demográfica, sangrado em vida pela emigração de centenas de milhares de jovens, em parte significativa, altamente qualificados.
Este é um País com um elevado grau de enfraquecimento do aparelho produtivo, com crescente dominação dos centros de decisão estratégica no estrangeiro, com a fragilização de um tecido económico já de si débil, com um encerramento recorde de empresas e com uma situação de endividamento brutal das que restam. É um Estado desfeito em muitos dos seus centros de competência e saber, empobrecido de recursos humanos, desestruturado e desanimado.
Este é um País que viu, nestes últimos quatro anos, a sua economia recuar década e meia, com a produção a cair 10 000 milhões de euros, o investimento global e público a recuar dramaticamente com pesadas e graves consequências futuras e a dívida pública a aumentar 50 000 milhões de euros.
Não, Sr. Primeiro-Ministro, não diga mais que os portugueses foram compreensivos perante os sacrifícios que os senhores lhes impuseram.
O trabalhador, com o seu salário, o seu rendimento e os seus direitos cortados, o pensionista ou o reformado, com a reforma ou a pensão cortada ou congelada, a família confiscada ou que perdeu a sua casa, o desempregado sem emprego nem subsídio, o pequeno empresário arruinado, o pequeno agricultor e o pescador impedidos de cultivar ou pescar, os homens e mulheres da cultura e da ciência desvalorizados, todos eles sentiram não compreensão mas indignação perante tanto esbulho, confisco e sacrifício, sabendo, ainda por cima, que o resultado seria para cobrir os desmandos da banca, para os grandes grupos económicos e não para resgatar o País.
Esta é uma realidade social e económica que era vontade do PSD e do CDS-PP manter e agravar, aspeto que ficou claro pelo conteúdo do Programa do Governo, aqui tão mal e tão pouco defendido pelos seus autores.
O Governo aqui se apresentou ignorando os graves problemas estruturais do País que persistem, insistindo na falsa ideia de que a sua política conduziu a um caminho de recuperação económica, repetindo proclamações vazias quanto à resolução dos problemas sociais como o desemprego e a pobreza e procurando iludir a realidade das crescentes dificuldades que atingem os trabalhadores e o povo.
O que o Governo PSD/CDS-PP deixou claro foi a perspetiva de continuidade e intensificação da política de agravamento da exploração, de empobrecimento, de assalto aos rendimentos dos trabalhadores e do povo, da injustiça fiscal, da destruição das funções sociais do Estado e dos serviços públicos, do confronto com a soberania e a degradação do regime democrático.
O PSD e o CDS-PP conduziram o nosso País a uma situação de retrocesso económico e social jamais vivida depois do 25 de Abril. Procuram, agora, resgatar-se a si próprios da derrota eleitoral que sofreram integrando no Programa do Governo medidas e promessas destinadas a criar a ilusão de que estariam em condições e na disposição de inverter o rumo da sua política, revertendo algumas das decisões com que atingiram os trabalhadores e o povo ao longo dos últimos quatro anos.
O Programa do Governo mostra o objetivo claro de assegurar os eixos essenciais da política de desastre nacional seguida nos últimos anos e coloca ainda mais a necessidade de pôr termo ao novo/velho Governo PSD/CDS pelos prejuízos que tem causado e pelos que pretendia continuar a causar aos trabalhadores, ao povo e ao País.
É neste contexto que o Programa do Governo da coligação PSD/CDS apenas serve para confirmar aquilo que sempre dissemos aos portugueses: com o PSD e o CDS-PP no poder, a política de exploração e empobrecimento para os trabalhadores e para o povo iria prosseguir, porque o PSD e o CDS-PP não têm outra forma de governar que não passe pela destruição de direitos económicos, sociais e laborais das classes trabalhadoras.
Se já muito foi destruído, mais ainda queriam destruir no domínio laboral e nas áreas da educação, da saúde e da segurança social. Assim o PSD e o CDS-PP tivessem a oportunidade de continuar a prosseguir no poder as suas políticas, como, aliás, desejariam todos aqueles que, intocáveis no alto dos seus privilégios, beneficiaram com as opções tomadas nestes anos, esses mesmos que, na iminência da derrota deste Governo e perante a real possibilidade da nova correlação de forças na Assembleia da República, em vez de reverterem os roubos de direitos e rendimentos do nosso povo, não só se lançam numa odiosa campanha de medo e chantagem como procuram, desde já, proteger os seus mesquinhos interesses, como revela a distribuição antecipada de dividendos que alguns grupos económicos têm em curso, visando evitar a justa tributação fiscal a que deveriam estar sujeitos A esse exercício do cinismo de classe, em que se fala em nome do País para proteger interesses de uma pequena minoria, nós queremos dizer basta!
A opção do povo português expressa no resultado das últimas eleições legislativas permite impedir essa coligação de prolongar, uma vez mais, a sua política de mentiras e permite travar este caminho de degradação contínua das condições de vida dos portugueses.
Por tudo isto, o PCP rejeita o Programa do Governo PSD/CDS-PP e, em conjunto com outros partidos, criou as condições para que ele seja rejeitado, pondo termo à sua nefasta ação. A posição conjunta do PS e do PCP sobre solução política expressa os termos dessa opção.
Estão criadas condições institucionais e políticas para outra solução governativa.
Existe na Assembleia da República uma base institucional que permitirá ir tão longe quanto for a disposição de cada força política que a compõe, para suportar o caminho da reposição dos salários e dos rendimentos, da devolução dos direitos, do reforço do acesso à saúde, à educação e à segurança social, do apoio às micro, pequenas e médias empresas, do apoio aos reformados e aos jovens, e que pode permitir a concretização de um conjunto de medidas e soluções que deem resposta a interesses imediatos dos trabalhadores e do povo.
É este o nosso compromisso, indissociável da indispensável política patriótica e de esquerda, dessa nossa aspiração profunda de uma política alicerçada nos valores de Abril, por um Portugal com futuro.
O tempo, Sr. Presidente, Srs. Deputados, não é de expetativa, nem de atentismo. É tempo de participação, de ação e de construção de um futuro melhor!

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