Intervenção de António Filipe na Assembleia de República

Procede à segunda alteração à Lei n.º 27/2006, de 3 de julho, que aprova a Lei de Bases da Proteção Civil

(proposta de lei n.º 319/XII/4.ª)

Sr. Presidente,
Sr.ª Ministra,
Sr.ª e Sr. Secretários de Estado,
Srs. Deputados:
Esta proposta de lei é apresentada, desde logo, com o objetivo de, sob uma forma duradoura, resolver o problema da adaptação da estrutura da proteção civil à decisão — com a qual nós concordámos —, de extinguir a figura do governador civil, apesar de o diploma de 2011 já ter procurado resolver esse problema, porque, de facto, a extinção abrupta dessa figura exigiu uma adaptação legislativa que também teve consequências ao nível da Lei de Bases da Proteção Civil. Mas agora adota-se uma solução mais definitiva, que contém alguns aspetos aos quais gostaria de me referir, em nome da bancada do PCP.
Em primeiro lugar — e embora isso tenha a ver diretamente com a questão a nível distrital do governador civil —, há uma boa medida constante desta proposta de lei, que é a extinção do comandante operacional municipal. Sempre discordámos da criação desta figura pelo Governo anterior. Criou-se uma estrutura de proteção civil em que os municípios foram envolvidos de uma forma que considerámos inadequada, com a criação da figura do comandante operacional municipal a responder diretamente perante o comandante operacional distrital, esquecendo que os municípios não são estruturas da administração central do Estado, nem sequer da administração indireta, são da administração autónoma, têm uma legitimidade própria.
Portanto, criou-se, aqui uma estrutura em que o município paga e o Governo comanda por interposição do comandante operacional distrital e sempre discordámos disso.
Parece-nos que é uma boa medida distinguir a figura do comandante operacional municipal, que nunca foi bem vista pelos municípios e daí o facto óbvio de muitos deles nunca terem sido nomeados porque as autarquias se recusaram a fazê-lo — e nós bem compreendemos essa posição. Portanto, a criação da figura que aqui se propõe de um coordenador municipal tem outra configuração e parece-nos que poderá pacificar a relação com os municípios em matéria de proteção civil no que a este aspeto diz respeito.
Relativamente ao problema que se coloca ao nível do distrito, o que acontece é que foi extinto o governador civil, algo que não contestamos, mas há como que uma reabilitação do distrito a vários níveis, porque a configuração distrital mantém-se e agora o mapa judiciário ressuscita o distrito, ao estabelecer as capitais de distrito como sedes de comarca.
Na proposta mantém-se o distrito, algo que a associação de municípios contesta. Aliás, a Associação Nacional de Municípios Portugueses dá parecer desfavorável precisamente nessa base, mas nós não lhe damos razão porque também não concordamos com a solução que propõem. Porque se algo foi clarificado, até pela jurisprudência recente do Tribunal Constitucional, é que as comunidades intermunicipais não são autarquias locais, não o podem ser.
Assim, do nosso ponto de vista, só havia uma forma de resolver este problema, que era cumprir a Constituição, com a criação das regiões administrativas. Aí o problema ficava claro.
Ou seja, se nós tivéssemos o Governo central, as regiões administrativas, tal como a Constituição determina, e os municípios, tínhamos uma estrutura de poder intermédia e legitimada entre o Governo e a administração local e o problema ficava resolvido. Enquanto não se criar essa autarquia local, tal como a Constituição prevê, intermédia, entre o Governo e os municípios, nós andaremos sempre às voltas com este problema sem saber se ele se resolve por via das NUT, por via de quaisquer comunidades ou por via do distrito, ou seja, não se resolve.
Portanto, cada Ministério vai resolvendo o problema como pode, ou seja, não vai resolvendo, vai atamancando como pode.
Enquanto não se criar uma autarquia intermédia, democraticamente legitimada, nós vamos andar aqui às voltas e vamos andar a rever mapas judiciários, estruturas de proteção civil e seja o que for, de uma forma em que continuaremos com aquele problema da incoerência total da nossa organização administrativa, em que para um efeito temos uma organização, para outro efeito temos outra e para outro temos outra ainda. Portanto, esse problema não vai ficar resolvido.
O que eu queria dizer é que há, nesta proposta de lei, alguns aspetos que nós saudamos, que até consideramos que são positivos e que dão uma base interessante para discussão na especialidade. Portanto, esta proposta de lei não terá o nosso voto contra, mas achamos que há aqui aspetos que ainda não estão bem resolvidos e que justificariam uma melhor discussão.
Saliento que não aderimos à posição da Associação Nacional de Municípios Portugueses de considerar que isto devia ser resolvido com base nas comunidades intermunicipais, não apenas por discordância relativamente à configuração que essa figura assumiu, mas porque está resolvido que as comunidades intermunicipais não são autarquias locais, de qualquer maneira há aspetos que pensamos que devem ser aperfeiçoados e, para isso, temos a discussão na especialidade.

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