Intervenção de

Lei das Finanças Locais - Intervenção de Honório Novo na AR

Lei das Finanças Locais, revogando a Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto

 

 

Sr. Presidente,
Sr. Ministro,
Srs. Secretários de Estado,
Sr.as e Srs. Deputados,

Penso que com o artigo 5.º o Governo pretende institucionalizar aquilo que, em gíria parlamentar, chamamos de «cavaleiros orçamentais». Os «cavaleiros orçamentais» passam a fazer parte de uma lei chamada Lei das Finanças Locais. Isto é, a lei aceita ser alterada todos os anos «à vontade do freguês», ou seja, à vontade do Governo que estiver «de turno».

É espantoso que este Governo apresente uma lei, chamada Lei das Finanças Locais, que se vai assumir como uma não-lei, ou seja, uma lei inexistente, porque não estipula qualquer espécie de estabilidade.

Mas, pior ainda, o Governo propõe que não só a lei possa ser alterada todos os anos como igualmente introduz uma penalização às autarquias, uma espécie de multa. As câmaras municipais mal comportadas vão passar a ser multadas pelo Governo. Por quem? Obviamente pelo «polícia de turno». E o «polícia de turno» é quem coloca na lei esta possibilidade, isto é, o Governo.

Em resumo, creio poder dizer que, com este artigo, o Governo perde o respeito por si mesmo, perde o respeito devido ao poder local e a milhares de autarcas neste País.

(...)

Sr. Presidente,

Começaria por fazer um comentário preliminar às palavras do Sr. Secretário de Estado. De facto, penso que o Governo, com a intervenção que fez, mostrou a sua verdadeira face e a sua coerência. O Governo, através da intervenção que fez, mostra que é coerentemente contra o poder local neste país.

Aliás, deixem-me acrescentar que quem defende esta proposta de lei, tanto na bancada do Governo como na da maioria parlamentar, são pessoas que têm um problema com o poder local. Mas, das duas uma: ou já se esqueceram que foram autarcas, ou têm uma espécie de problema freudiano com o poder local, que se mostra bem com esta proposta de lei.

Quanto ao artigo 8.º, Srs. Membros do Governo, o que é espantoso é que o Governo queira incluir em lei - nesta Lei das Finanças Locais e desta forma - a possibilidade de introduzir as cooperações técnicas e os auxílios financeiros, sabendo nós que esta matéria, ao longo de anos, com o PS, mas também com o PSD, tem sido por nós legitimamente designada por «fundo azul» ou «saco azul».

Ainda poderíamos admitir que o Governo quisesse introduzir esta possibilidade para projectos de interesse local ou regional. Mas não, é apenas para projectos ou auxílios financeiros que o próprio Governo entenda, segundo os seu critérios, unilateral e discriminatoriamente, que são de interesse público para o Governo! Ou seja, esta regra não é para as autarquias, não é para o poder local, não é para projectos locais nem para projectos regionais. É apenas para aqueles projectos que o Governo entenda, de acordo com o seu próprio critério, que são de interesse público. Ora, o Governo não é, seguramente, a única sede de determinação do interesse público.

(...)

Sr. Presidente,

O artigo 41.º tem a ver com o reequilíbrio financeiro municipal e prevê o estabelecimento de contratos entre o Governo e as autarquias com dificuldades financeiras, o que é absolutamente normal. Ou seja, é normal que o Governo e as autarquias estabeleçam contratos livremente entre partes, entre pessoas de bem e que nesses contratos estejam previstas as fórmulas e os mecanismos para acompanhamento dos contratos estabelecidos livremente entre as pessoas.

Sr. Presidente e Sr. Ministro,

O que não é normal e o que não podemos aceitar é que o Governo desconfie permanentemente da outra parte, do poder local, ao ponto de colocar em lei essas desconfianças de forma absolutamente expressa, quando tudo isto deveria ficar no contrato de reequilíbrio financeiro. Como é que o Governo o faz? Impondo obrigações absolutamente inaceitáveis, isto é, obrigações de cumprimento antecipado, prévio, de informação e de condicionalismo de gestão, o que, do nosso ponto de vista, não é aceitável.

Depois, como se isto não bastasse, o Governo ainda põe, ameaçadoramente, a hipótese de efectuar retenções às receitas do Estado, o que é absolutamente inaceitável.

(...)

Sr. Presidente,

Gostaria que fizesse o favor de mandar entregar ao Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna uma informação que foi prestada na terça-feira, da parte da manhã, pelo Sr. Ministro de Estado e das Finanças, durante o debate na especialidade do Orçamento do Estado, onde, como todos sabemos, o Sr. Ministro de Estado e das Finanças informou que, em relação aos 200 milhões de euros inscritos como contratos-programa e auxílios, já existem vários contratos estabelecidos, e que esses contratos estariam para publicação no Diário da República, contrariando o que o Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna acaba de dizer aqui hoje.

Isto tem uma importância política relevante. Por isso, gostaria que o Sr. Presidente fizesse o favor de entregar ao Ministério da Administração Interna uma cassete dessa reunião de terça-feira passada.

(...)

Sr. Presidente,

De facto, gostaria de referir-me ao artigo 48.º, que cria a figura da auditoria externa das contas dos municípios.

A meu ver, esta é uma norma legal que constitui uma espécie de «cereja em cima do bolo» que é esta lei.

Isto é, depois de tantas malfeitorias, o Governo chega ao artigo 48.º e ultrapassa tudo aquilo que poderia ser o produto de uma imaginação prodigiosa para tutelar o poder local. O que é que faz? Quer impor auditorias externas aos municípios! Quer impor a existência desta figura na lei!

Sr. Ministro, é lamentável. Espero que o Prof. Guilherme d'Oliveira Martins não esteja a ouvir este debate, porque senão chega à conclusão óbvia de que já não chega o Tribunal de Contas,  e que os senhores já nem sequer têm confiança no Tribunal de Contas, entidade cuja lei foi alterada recentemente e que, como toda a gente sabe, tem o poder de fiscalizar as contas não apenas dos municípios mas também do sector empresarial local, coisa que não sucedia até agora. Pois apesar disto, os senhores ainda chegam ao descaramento político de colocar em norma a figura dos auditores externos! Isto é, de facto, a «cereja em cima de um bolo legislativo» absolutamente repleto de questões inconstitucionais, Sr. Ministro!

 

 

 

 

 

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