Financiamento do Ensino Superior

 

Debate de urgência sobre o "Financiamento do Ensino Superior"

Intervenção de António Filipe na AR

 

 

Senhor Presidente,

Senhores Membros do Governo,

Senhoras e Senhores Deputados,

Ao longo deste debate, o Senhor Ministro da Ciência e do Ensino Superior não fez mais do que confirmar as nossas piores expectativas.

O seu Governo é responsável por uma asfixia financeira do Ensino Superior Público que o deveria fazer corar de vergonha; falta aos compromissos que assume; adopta uma postura de confronto, de antagonismo, e até de má-criação em relação às instituições e aos seus responsáveis democraticamente eleitos; toma decisões que comprometem de forma irremediável o presente e futuro de milhares de jovens portugueses que frequentam o ensino superior, e o senhor ministro ainda vem para aqui com o ar de quem pensa que todos lhe devem e ninguém lhe quer pagar.

O senhor ministro sabe muito bem qual tem sido a tradução da obsessão do défice no financiamento do ensino superior público. O financiamento médio por aluno baixou 15 % entre 2003 e 2008. Era de 4.449 euros em 2003, é de 3.772 euros em 2008.

O senhor ministro sabe que o financiamento do ensino superior baixou em Portugal para 0,7% do PIB em 2008, quando era de 1% em 2005 e que esse investimento fica muito aquém do que é realizado nos demais países europeus.

O senhor ministro sabe muito bem que em 2007 o Orçamento do Estado para o Ensino Superior sofreu um corte de 6,4 %, a somar ao desconto de 7,5 % dos salários para a Caixa Geral de Aposentações, e que em 2008 esse desconto passou para 11 %.

O senhor ministro sabe que estes encargos, somados a inevitáveis actualizações salariais e à inflação, corresponderam a uma contracção de cerca de 20 % da capacidade aquisitiva das instituições de ensino superior público nos últimos dois anos.

O senhor ministro sabe muito bem que obrigou as instituições do ensino superior a sobreviver com orçamentos fictícios e que ainda não estamos a meio do ano civil e que oito Universidades Públicas, pelo menos, vão entrar em ruptura antes do fim do ano, não tendo a mínima possibilidade de honrar os seus compromissos financeiros.

O senhor ministro não só sabe tudo isto muito bem, como fez tudo o que era necessário para que assim fosse, para obrigar as Universidades a ter de aceitar os chamados contratos de saneamento financeiro que não são mais que um estratagema que o Governo inventou para acabar de forma humilhante com a autonomia financeira das instituições de ensino superior público.

Este Governo não tem estratégia para o ensino superior nem para a ciência. A FCT está paralisada. Não houve concursos para projectos, nem em 2007, nem em 2008, até à data. O FEDER não é utilizado para a Ciência, por decisão do Governo, não havendo qualquer programa comunitário a que as instituições de ensino superior possam, especificamente, recorrer. Não tem havido admissões de jovens docentes para o Ensino Superior. Os institutos politécnicos estão na iminência de ter de despedir milhares de docentes e de ter de fechar cursos devido aos constrangimentos financeiros a que são forçados e correm o sério risco de ver inviabilizadas algumas das suas instituições. Nada se sabe quanto ao estatuto da carreira docente do ensino superior público.

O Governo faz do Plano Tecnológico a sua bandeira, mas não há nenhum plano integrado entre os Ministérios da Economia e da Ciência e Ensino Superior.

Quando confrontado com a sua ausência de estratégia para o ensino superior, o Governo desculpa-se, invocando um suposto investimento na Ciência e publicitando até à náusea os programas com o MIT e o Carnegie Melon. Mas também quanto a isso, é tempo de dizer que "o rei vai nú". o que o Governo não diz é que cada doutoramento ao abrigo desses programas custa seis vezes mais ao Estado Português que os doutoramentos conferidos por Universidades Portuguesas, que a maioria dos doutorandos envolvidos nem sequer são portugueses, e que os doutoramentos afinal nem sequer são conferidos por aquelas instituições.

A verdade é que este Governo, em vez de ter uma política de desenvolvimento do Ensino Superior e da Ciência ao serviço do país, tem uma política de alimentação de clientelas à custa dos recursos públicos afectos à investigação científica.

Se assim não é, senhor ministro, fica aqui o desafio para que nos desminta. Mas terá de o fazer, não com base em tiradas retóricas, mas com base em factos. Fica aqui o desafio, que hoje mesmo formalizámos através dos mecanismos regimentais apropriados, para que o senhor ministro envie a esta Assembleia uma lista completa dos subsídios da FCT aos laboratórios associados, para que todos possam tirar daí as devidas conclusões. O senhor ministro desminta-nos, se puder, mas digo-lhe já que não temos qualquer receio do seu desmentido.

Senhor Presidente,

Senhores Deputados,

Perante a falta de resposta do Governo à gravíssima situação financeira com que as instituições de ensino superior se vêem confrontadas, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou hoje na Mesa desta Assembleia um Projecto de Resolução que recomenda o reforço da dotação orçamental para o funcionamento dos estabelecimentos do ensino superior.

O que esperamos do Governo e do PS é que, em vez das diatribes do costume em que nem os senhores acreditam e que já ninguém tem paciência para ouvir, aceitem uma discussão séria e responsável deste Projecto de Resolução.

Não precisam de nos dizer que o país está óptimo graças a este Governo, que os portugueses estão a viver muito melhor e que o Ensino Superior nunca teve tanto dinheiro para gastar. Os senhores sabem tão bem como nós que isso não é verdade e que as restrições financeiras que o Governo impôs às Universidades e aos Politécnicos criaram uma situação insustentável. Os senhores sabem tão bem como nós que se não houver um reforço das dotações orçamentais, a maior parte das instituições não têm dinheiro para pagar os salários até ao fim do ano. A questão é de saber se o Governo está disposto a proceder a esse reforço de dotações segundo critérios objectivos e transparentes, ou se prefere, como até aqui, usar o estrangulamento financeiro como arma de arremesso e de chantagem para com as instituições do ensino superior.

Nós assumimos as nossas responsabilidades: Esperamos agora que o Governo e o PS assumam as suas.

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