Intervenção de

Dia do Estudante<br />Intervenção da Deputada Margarida Botelho

Sr. Presidente, Srs. e Sr.as Deputadas, Há 49 anos que se celebra o a 24 de Março. Até ao 25 de Abril, comemorá-lo representava um acto de coragem e uma prova de determinação do movimento estudantil em romper as amarras impostas pelo regime fascista. Ao longo dos últimos anos, o 24 de Março retomou o seu carácter de manifestação da vontade dos estudantes portugueses na conquista de melhores condições de estudo. Correspondendo a um apelo da Federação Mundial da Juventude Democrática de que se celebrasse em Março a semana da Juventude, o Movimento de Unidade Democrática Juvenil decidiu, em 1947, organizar um acampamento. Hoje seria banalíssimo, mas o regime fascista e a PIDE reprimiram-no brutalmente, fazendo prisioneiros os dirigentes do MUD-Juvenil. O seu crime foi, apenas, discutir os problemas da juventude de então. A onda de solidariedade pela libertação destes jovens foi tão forte que nunca mais se deixou de comemorar a 28 de Março o Dia da Juventude. Ambas as datas têm o significado e a força que têm porque nasceram da iniciativa e da luta dos jovens portugueses. Estranho é que o Governo do Partido Socialista tenha promovido, em 1998, um novo dia da Juventude, algures em Agosto, a propósito não se sabe bem de quê. Estará o PS a tentar desideologizar e retirar carácter reivindicativo ao Dia da Juventude? Se está, falhou. Março é mês de luta e celebração juvenil. O 24 e o 28 de Março são hoje datas maiores do movimento associativo juvenil e estudantil português. Este ano não foi excepção. A luta dos estudantes do ensino secundário pela suspensão da revisão curricular prolongou-se para Março, mesmo depois do autismo do Governo e do Partido Socialista, sozinhos nesta Assembleia a defender o indefensável, há cerca de um mês. Decorre neste momento nas escolas básicas e secundárias uma semana de contestação, que é um sério aviso ao Governo sobre o destino da revisão curricular. Os jovens trabalhadores encerraram ontem em Lisboa, frente ao Ministério do Trabalho, um mês de denúncia da precariedade, que afecta, segundo o Instituto Nacional de Estatística, 42% dos jovens trabalhadores, num atentado grave a um dos direitos mais fundamentais de quem está em início de vida: o direito ao emprego com direitos. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Em Coimbra, no Porto, em Viseu, em Évora e em Lisboa, os estudantes do ensino superior marcaram o dia de ontem como o culminar de uma semana de reivindicações. O PCP saúda e solidariza-se com estas manifestações. O ensino superior português enfrenta uma realidade caótica que deriva das opções políticas tomadas pelos sucessivos Governos, que não servem nem os estudantes, nem o corpo docente, nem o desenvolvimento do país. O financiamento do ensino superior tem sido insuficiente, quer para as necessidades básicas de funcionamento das instituições, quer para toda e qualquer perspectiva de desenvolvimento do ensino superior, entendido como instrumento ao serviço de todos, progressivamente gratuito, indiscutivelmente público e de qualidade garantida. A ausência ou a má qualidade das instalações, das salas de aulas, das salas de estudo, de equipamentos, de laboratórios, de bibliotecas, de espaços de lazer, de investigação, do respeito mais básico pelos direitos dos trabalhadores-estudantes são quotidianos dramáticos para milhares de jovens. Sabemos bem do que falamos: só nesta sessão legislativa, o Grupo Parlamentar do PCP, em conjunto com a Juventude Comunista Portuguesa, teve reuniões com 27 direcções de associações de estudantes, académicas e federações. As críticas que trazemos a este Parlamento têm um fundamento profundo na vida dos estudantes e das instituições. O esforço exigido às famílias portuguesas continua a ser o maior de toda a União Europeia. Para além das despesas de frequência - alojamento, material escolar, alimentação - há que contar com as propinas e com as taxas e emolumentos que todos os anos lectivos representam mais nas receitas próprias das instituições. E não basta que o Secretário de Estado do Ensino Superior decrete a morte das propinas e diga que isso é já só uma preocupação do PCP para esconder que o dinheiro das propinas paga salários, contas da água e da luz. Os 'contratos de qualidade' celebrados com as instituições no ano 2000 não são mais senão o Governo a reconhecer que as instituições estão sub-financiadas. A Acção Social Escolar, uma das reivindicações mais fortes dos estudantes, caracteriza-se em meia dúzia de números: dados do próprio Ministério mostram que mais de metade dos estudantes carenciados não são abrangidos; 1/3 das bolsas corresponde ao valor da propina que tem de ser paga; a taxa de cobertura da rede de residências em todo o país é de cerca de 10% dos estudantes deslocados. Onde fica a correcção das desigualdades sociais? É justo também que se refira que no ensino superior particular e cooperativo assistimos neste momento a uma situação de gravíssimas dificuldades financeiras de algumas instituições, onde as principais vítimas são os estudantes. A inexistência de um regime contratual que defenda os estudantes perante uma qualidade de ensino que é exigida, bem como de aumentos significativos das propinas pagas à instituição, coloca milhares de estudantes e as suas famílias numa posição instável. Com este quadro, é natural que venha o Sr. Ministro da Educação a terreiro reconhecer que um curso superior em Portugal demora, em média, 9 anos a ser concluído. Pudera! As causas que estão na origem do insucesso e do abandono escolar estão longe de ser combatidas e afectam principalmente os estudantes mais carenciados. Prova-se que tínhamos razão quando por duas vezes na legislatura passada apresentámos a nossa própria proposta de financiamento do ensino superior, rejeitando a actual Lei. O desinvestimento do Estado que então denunciámos prova-se hoje na prática. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do PS:Onde estão as respostas sérias às questões sérias que os estudantes colocaram ao Sr. Ministro em Novembro? O que espera o Governo para fazer o que se lhe exige? Disse. (...) Sr. Presidente, Srs. Deputados Ana Catarina Mendonça e Ricardo Almeida, Agradeço as questões que me colocaram. Sr.ª Deputada, se a situação do ensino superior português mudasse, nós, com certeza, mudaríamos de discurso e os senhores deixariam de ser confrontados com manifestações de estudantes várias vezes por ano. Parece-me que 100 000 estudantes do ensino secundário não são tão poucos como isso e parece-me que o facto de se manifestarem na rua não é muito comum. Por outro lado, parece-me que os 6000 estudantes que se manifestaram ontem em Lisboa, no Porto, em Coimbra, em Viseu e em Évora não são assim tão poucos! Quanto à questão do subfinanciamento, devo dizer-lhe que só mudaremos a nossa «cassete» quando ele deixar de existir. Caso contrário, seremos forçados a dizer que o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) também tem uma «cassete», já que o seu presidente, em solidariedade com os estudantes, fechou a Universidade do Algarve na terça-feira passada. Deve ser, com certeza, um militante activo da «cassete» do PCP! Mas há mais: a Universidade Nova, neste momento, não tem dinheiro para salários, e reconhece-o! Quanto à acção social escolar, o investimento «brutal» do Partido Socialista nesta área ficou bem patente na discussão do último Orçamento do Estado, já que o orçamento de investimento da acção social escolar desceu 12%. Isto num momento em que a taxa de residências é exactamente aquela que referiu o Sr. Deputado Ricardo Almeida. De resto, no que respeita à questão do ensino particular e do ensino cooperativo, não podemos deixar de salientar que os problemas com a acção social escolar são gravíssimos, tanto ao nível dos apoios directos como dos apoios indirectos. Aliás, há, neste domínio, um projecto do PCP que consideramos que o Partido Socialista deveria aprofundar. Quanto às iniciativas que o PCP supostamente não apresenta, penso que valeria a pena fazer uma lista daquilo que apresentámos nas duas últimas legislaturas. Para além disso, penso que a Sr.ª Deputada deveria analisar com atenção o número de iniciativas que o PCP apresentou nesta área, de que são exemplo as relativas aos numerus clausus, à lei-quadro, à lei de financiamento (sobre a qual apresentámos já duas iniciativas), à acção social escolar ou aos 2 milhões de contos para bolsas que propusemos quando da discussão do Orçamento do Estado para 2001. Todas estas iniciativas foram sistematicamente chumbadas pelo Partido Socialista.

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