A valorização do transporte ferroviário assume uma importância estratégica e estruturante para a economia e o desenvolvimento harmonioso do País e da mobilidade dos trabalhadores e das populações.
A nacionalização da CP, em 1975, constituiu-se como factor e condição na melhoria das infra-estruturas e no material circulante, nas condições de trabalho disponibilizadas aos seus trabalhadores, na oferta aos utentes.
Passados 43 anos , as opções políticas seguidas por sucessivos Governos do PS, PSD e CDS-PP e a política de direita por estes concretizada, a submissão às imposições da União Europeia e ao Euro, as sucessivas opções de favorecimento dos interesses dos grupos monopolistas, o desmembramento da CP e a alienação, a interesses privados, de importantes áreas, conduziu o Sector Ferroviário em geral e esta empresa em particular, para uma situação insustentável e a um grave retrocesso no direito à mobilidade do povo português.
O que os acontecimentos das últimas semanas - constantes atrasos, supressões, redução de oferta - evidenciam é tão só o que o PCP vem denunciando e que o último relatório da IP - Infraestruturas de Portugal confirma: 60% das vias férreas portuguesas têm um índice de desempenho medíocre ou mau. Situação que, a não ser invertida, conduzirá ao colapso do Sector Ferroviário.
A situação com que se deparam milhares de utentes dos comboios no nosso País, é o resultado de uma política de desinvestimento e abandono do Sector, nas quais as populações perderam mais de 1.500 km de caminho de ferro, onde foram destruídos mais de 19.000 postos de trabalho, cancelaram-se ou adiaram-se, ad aeternum, importantes investimentos de que são exemplo, o concurso de aquisição de material circulante para a linha de Cascais em 1999; o concurso de aquisição em 2001 de Automotoras Diesel Ligeiras, assim como para a remodelação de carruagens dos comboios Inter-regionais; a remodelação de 25 Automotoras UTD 600 entre 2000 e 2004; ou mais recentemente, em 2010, o concurso para aquisição de Automotoras Regionais Diesel e o concurso para aquisição de material circulante eléctrico para as linhas suburbanas. Investimentos que, a terem sido concretizados, evitariam parte da degradação do serviço com que o País está hoje confrontado. Investimentos ainda mais necessários já que, com a degradação que tem vindo a registar-se, são as próprias condições de segurança do transporte ferroviário que ficam fragilizadas. Para o PCP, não será necessário esperar por um problema de maior dimensão, para que se tomem já hoje, as medidas que foram sendo adiadas.
Por outro lado, a pulverização do Sector Ferroviário (onde se inclui a segmentação da CP em várias empresas), concretizada ao longo de décadas, por opções erradas de sucessivos Governos, criou múltiplas oportunidades de negócio para os grupos económicos privados, mas degradou a oferta, a fiabilidade e a segurança da operação, precarizou as relações laborais, provocou o aumento de custos para os utentes e para o Estado - como disso é exemplo a PPP com a Fertagus -, comprometeu a soberania nacional.
Os acontecimentos das últimas semanas, não são fruto do acaso. São consequência directa destas opções políticas, são o espelho da situação no Sector.
As recentes medidas anunciadas pelo Governo, a propósito do “Portugal 2030”, não podendo ser desvalorizadas, não devem iludir o facto de que importantes investimentos para o Sector Ferroviário, apontados no “Portugal 2020”, ainda estão por concretizar.
É preciso parar com uma política onde os anúncios de investimentos estratégicos se sucedem regularmente, sem que a maioria desses investimentos seja efectivamente concretizada, servindo apenas para criar a ilusão de se estarem a resolver problemas profundamente sentidos pela população.
É preciso, igualmente, garantir o investimento na modernização e manutenção da linha férrea existente. Garantir que para operar, manter e reparar o actual material circulante se admita a contratação dos trabalhadores necessários. Garantir que se criam as condições que permitam concretizar o Projecto de Resolução do PCP “Por um Plano Nacional de Material Circulante Ferroviário”, aprovado na Assembleia da República.
Aliás, o actual Governo, não concretizou o lançamento de um único concurso para a aquisição de material circulante; manteve a política de não contratação dos trabalhadores operacionais necessários nas empresas ferroviárias; continuou o desmantelamento da Engenharia ferroviária pública e a aposta numa subcontratação cada vez mais internacional. E o destino prioritário dos recursos públicos continuou a ser o pagamento de rendas aos privados nas denominadas Parcerias Público-Privadas.
Para o PCP, a par de uma política de investimentos articulada com a dinamização do aparelho produtivo nacional, coloca-se ainda a necessidade de uma inversão destas políticas, que passa necessariamente pela reconstrução de uma Empresa única, nacional e pública, para todo o Sector Ferroviário, devolvendo ao Sector a coerência e articulação, ao Estado Português os instrumentos estratégicos de que necessita, e à economia nacional um poderoso e estratégico instrumento para o seu desenvolvimento.
Este processo, implica a reversão de um conjunto de medidas graves, que ao longo dos anos foram sendo tomadas, designadamente:
- A reversão da fusão da REFER com a Estradas de Portugal, fusão que se destinou a solidificar a pulverização do Sector Ferroviário e a criar uma gigantesca gestora de subcontratações, subconcessões e Parcerias Público-Privadas;
- A reunificação da REFER e da CP, reunificando o gestor da infra-estrutura e a exploração dessa infra-estrutura;
- A reunificação da EMEF e da CP, travando o processo de desmembramento da EMEF, que está em curso, acabando com uma separação que mais não fez que aumentar os custos de manutenção e reparação e a sua dependência das multinacionais;
- A renacionalização da Medway, com a sua integração na CP, devolvendo ao País o Sector das mercadorias, instrumento estratégico do seu desenvolvimento económico soberano e sustentado;
- O reforço do investimento em material circulante e na contratação de mais trabalhadores, dotando a CP dos equipamentos e dos trabalhadores necessários para garantir a segurança, a fiabilidade e o conforto dos utentes.
Assume ainda, neste quadro, por razões de actualidade a reversão da Parceria Público-Privada do serviço de passageiros concessionada à FERTAGUS com a integração da operação hoje a cargo desta empresa na CP, bem como dos respectivos trabalhadores, material circulante (que é público) e instalações. Objectivo que o PCP já traduziu com a apresentação esta semana, na Assembleia da República, de um Projecto de Resolução nesse sentido.
O transporte ferroviário tem que ser uma prioridade, quer no que respeita ao transporte de mercadorias, potenciando o desenvolvimento do aparelho produtivo nacional, quer no que respeita ao transporte de passageiros, como vertente fundamental do transporte público e do direito à mobilidade. Prioridade que exige uma outra política, que promova em condições de acessibilidade o seu uso generalizado à população, que acabe com o adiamento de reparações e manutenções por razões «economicistas», que acabe com a precariedade e a subcontratação de actividades que podem e devem ser realizadas pela empresa, que contrate os trabalhadores em falta, necessários para a renovação da sua capacidade produtiva, que aposte na modernização e desenvolvimento da Rede Ferroviária Nacional, canalizando os recursos nacionais necessários, e subordinando-os ao interesse nacional.
A prioridade do Sector Ferroviário tem que ser o servir o povo português, a sua mobilidade e o seu desenvolvimento económico, com segurança e fiabilidade.
O PCP defende e propõe esse caminho, por um desenvolvimento soberano e sustentado, apostado na defesa do aparelho produtivo, na defesa da soberania nacional, na defesa de serviços públicos eficientes e universais, na valorização do trabalho e dos trabalhadores.