1 - As conclusões do Conselho Europeu não iludem o indisfarçável aprofundamento da crise social, económica, política e institucional em que a União Europeia está mergulhada. Simultaneamente, evidenciam, na linha de anteriores reuniões, a inexistência de qualquer linha política e económica que, de facto, possa contrariar o rumo de desastre em curso.
À excepção da proposta de aprofundamento da União Económica e Monetária, em termos práticos, estas conclusões mais não são do que um mero e já várias vezes repetido enunciado de objectivos, orientações e medidas que, para além de não resolverem nenhum dos problemas existentes, estão na origem da crise e a aprofundam a cada passo dado.
2 - Mais uma vez, insiste-se em medidas como o aprofundamento do mercado único, o investimento em projectos que vão ao encontro do interesse das multinacionais europeias - tais como o "Connecting Europe Facility" (para o qual se quer agora desviar verbas do Fundo de Coesão), o "mercado único digital" ou o "mercado único da energia" - e que visam a liberalização e transferência para o capital privado de sectores estratégicos da economia.
Mantém-se a opção estratégica de preservar todos os instrumentos que viabilizam a especulação financeira e a fuga de capitais. Questões como os paraísos fiscais, a cooperação para a taxação das transacções financeiras e a luta contra a evasão fiscal são, mais uma vez, e a exemplo de Conselhos Europeus anteriores, atiradas para o campo da indefinição, em hipócritas manobras de diversão que mais não visam do que manter intocáveis os milionários lucros do capital financeiro.
3 - Simultaneamente, estas conclusões demonstram uma profunda e chocante insensibilidade face ao sofrimento imposto aos trabalhadores e aos povos da Europa. Tal é mais uma vez patente na inexistência de quaisquer linhas de combate à pobreza, ao desemprego, às desigualdades e à fome - os reais problemas com que os trabalhadores e os povos da Europa estão confrontados, que se agravam vertiginosamente e cuja resolução o Conselho Europeu devolve aos Estados-Membros, demonstrando a falsidade dos discursos da solidariedade e da coesão social.
O Conselho Europeu não tem uma única proposta para melhorar as condições de vida dos trabalhadores e dos povos da Europa. Contudo, multiplica e amplifica medidas não só para manter, mas para aprofundar os processos de concentração e centralização do poder político e económico no seio da UE, de canalização directa de mais financiamento público para a banca privada, de regressão civilizacional dos direitos sociais e laborais e de intolerável ataque à democracia e à soberania dos povos.
4 - As conclusões relativas ao aprofundamento da União Económica e Monetária (UEM), baseadas no relatório intercalar apresentado por Van Rompuy, são, na sua natureza, essência e linhas orientadoras, uma perigosa fuga em frente face aos evidentes elementos de agravamento da crise económica e aos sinais de desintegração da UEM na sua actual configuração.
O aprofundamento da UEM só poderia conduzir ao agravamento dos défices estruturais de países como Portugal, pondo em causa o seu direito ao desenvolvimento económico. O seu resultado será maior divergência, dependência e dívida. Isto mesmo o demonstram as consequências das “reformas estruturais” que a UE vem impulsionando. Reformas que agora querem levar mais longe, forçando os Estados a contratualizarem compromissos com as instituições europeias, criando novos mecanismos de domínio por parte das grandes potências, que se somam ao Pacto Orçamental e à chamada “governação económica reforçada”, numa lógica de domínio colonial nas relações entre Estados na UE. Uma lógica que visa impor o neoliberalismo como lei, a transferência directa de riqueza e recursos públicos para o grande capital como regra, a destruição de direitos sociais e laborais, o empobrecimento e a restrição de direitos democráticos como linha orientadora.
Mais uma vez, não pode deixar de ser assinalada a flagrante coincidência de posições entre as conclusões do Conselho Europeu e as exigências das associações do grande patronato europeu, dadas a conhecer no início desta semana, através da sua confederação – a BusinessEurope.
5 - Independentemente das fortes contradições internas (quer entre sectores do grande capital, quer entre potências como a Alemanha e a França) que a crise e a luta dos povos está a determinar - que estiveram bem patentes neste Conselho Europeu e que estão na origem da dilatação dos prazos iniciais para a concretização de medidas como a União Bancária - o PCP alerta para a necessidade urgente de por via da luta e da multiplicação de movimentos de opinião, travar desde já o passo ao objectivo do aprofundamento da UEM. A concretização dos objectivos agora traçados pelo Conselho Europeu representaria uma ainda mais profunda e inaceitável expropriação de vários elementos de soberania dos Estados no plano económico, orçamental, fiscal e da gestão dos seus sistemas bancários, transferindo-os para instâncias supra-nacionais que, como a vida vem demonstrando, estão ao serviço dos interesses do capital financeiro e sob seu domínio.
6 - Ao dar o seu acordo às conclusões deste Conselho Europeu, o governo português pactua com medidas e orientações profundamente lesivas dos interesses e dos direitos do povo português. O governo não cumpriu, mais uma vez, as responsabilidades a que está obrigado perante a Constituição da República Portuguesa, comprometendo assim a soberania nacional e o futuro do nosso país, e continuando a assumir o seu papel de mordomo do grande capital nacional e estrangeiro, os únicos que poderão ter algo a ganhar com este processo.
O PCP apela aos trabalhadores e ao povo português para que, através do desenvolvimento e fortalecimento da luta de massas, imponham a ruptura com a política de direita e com as imposições de uma União Europeia que, acossada pelas suas próprias e insanáveis contradições, cada vez mais se coloca numa linha de irreconciliável conflito com os interesses, aspirações e direitos sociais, laborais e nacionais do povo português.