Intervenção de Diana Ferreira na Assembleia de República

Reforçar os direitos dos trabalhadores no regime de trabalho nocturno e por turnos

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Sr. Presidente,
Srs. Deputados,

O dia-a-dia de centenas de milhares de trabalhadores do nosso país é marcado por horários desregulados, pelo ritmo fortemente desgastante do trabalho por turnos e do trabalho nocturno.

Mais de 16% dos trabalhadores trabalham por turnos, correspondendo a cerca de 835 mil trabalhadores, dos quais mais de 423 mil são mulheres. Em 2009 seriam mais de 440 mil os trabalhadores em trabalho por turnos; em dez anos, o número quase que duplicou.

Quase 11% dos trabalhadores trabalham à noite.

São trabalhadores em contraciclo. São mães e pais que não estão com os filhos. Que saem de casa com as crianças ainda a dormir; que chegam quando estas já estão deitadas. São as festas e as muitas actividades dos filhos a que não se vai, porque o turno não deixa. São fins de semana que não há. São mães, pais e filhos que não têm tempo para viver em conjunto. São crianças que crescem privadas do tempo de descanso, de lazer; famílias que se constroem nos intervalos dos turnos.

A esta realidade familiar acrescem as consequências profundamente negativas deste trabalho para cada um dos trabalhadores que trabalha por turnos ou em horário nocturno – alterações do ritmo circadiano, perturbações do sono, aumento do risco de outros problemas físicos ou psíquicos.

É evidente que o trabalho diurno é o trabalho adequado ao ser humano e o trabalho nocturno, o trabalho por turnos, de um modo geral, causa graves danos aos trabalhadores. Há estudos que apontam para o risco acrescido das mulheres com trabalho nocturno desenvolverem cancro da mama.

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,

Oito horas de trabalho, oito horas para descanso, oito horas para lazer, convívio familiar e cultura – um avanço civilizacional que a luta dos trabalhadores conquistou. Um marco histórico para a construção de uma sociedade mais justa e socialmente saudável.

O capital respondeu recorrendo a vários instrumentos ardilosos para tornear e afastar a lei, transformando todo o período normal de trabalho em tempo de trabalho efectivo, eliminando pausas, inventando as mais diversas “flexibilizações” e aumentando, assim, a intensidade e os ritmos de trabalho.

À boleia da competitividade foram produzidas sucessivas alterações à legislação laboral que significaram sempre degradação dos direitos dos trabalhadores.

Adaptabilidades, bancos de horas individuais e grupais, horários concentrados e outros conceitos impostos, que de novo nada têm, pois traduzem e recuperam velhas ideias de desumanização do trabalho.

Os horários de trabalho, a sua fixação e cumprimento, o respeito pelos tempos de descanso, as respectivas condições de pagamento e de compensação, a articulação com a vida familiar, pessoal e profissional continuam hoje, pelos piores motivos, a assumir enorme actualidade.

A par dos salários também o horário de trabalho continua a ser alvo dos maiores ataques por parte do patronato, sendo também das mais firmes e corajosas lutas e reivindicações dos trabalhadores.

O trabalho nocturno e o trabalho por turnos têm que ser uma excepcionalidade efectiva – na Lei e na prática. Os trabalhadores que trabalham em horário nocturno ou por turnos têm que ser devidamente compensados pelo esforço acrescido que este tipo de trabalho significa, devendo ser reconhecidas as características penosas específicas deste regime de trabalho.

Sem prejuízo de disposições mais favoráveis em contratação colectiva, propomos:
• Limitação do trabalho nocturno e por turnos às situações técnica e socialmente justificadas;
• Fixação do trabalho nocturno com início às 20h e até às 7h e impedimento de aplicação de mecanismos de desregulamentação do horário de trabalho;
• Limitação do recurso ao sistema de turnos 3x8, estabelecendo a redução semanal do horário de trabalho;
• Ciclos curtos para a equipa nocturna e mais um intervalo de descanso para os trabalhadores nocturnos;
• Periodicidade no gozo dos dias de descanso rotativos, incluindo sábado e domingo;
• Direito a um dia de férias suplementar, por cada três anos de trabalho nocturno ou por turnos;
• Valor mínimo de subsídio de turno de 25% e direito aos subsídios de turno e nocturno nas situações que o trabalhador trabalhe à noite e por turnos;
• Antecipação da idade de reforma e bonificação no cálculo da pensão;
• Exames médicos com periodicidade, com especial atenção para as mulheres;
• Direito a sair do regime de turnos, sem perda de direitos.

É inadiável o reforço dos direitos destes trabalhadores, o reconhecimento das características penosas específicas deste regime de trabalho e a compensação devida e justa a todos os trabalhadores que, dia-a-dia, meses seguidos, anos seguidos trabalham nestas condições.

Disse.

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