Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

Procedimento de mudança de sexo e de nome próprio no registo civil

Cria o procedimento de mudança de sexo e de nome próprio no registo civil e procede à 18.ª alteração ao Código do Registo Civil (proposta de lei n.º 37/XI/1ª)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:
As iniciativas legislativas que hoje discutimos merecem a concordância genérica do PCP.
O que está em causa, hoje, nesta discussão é uma questão muito concreta e objectiva, que é a de saber se o Estado português deve ou não continuar a exigir a pessoas a quem foi diagnosticada a perturbação da identidade de género, mais comummente designadas transexuais, que se sujeitem a um processo judicial invasivo da sua intimidade e até da sua integridade para que possam alterar o seu registo civil.
A realidade que hoje vivem estas pessoas é, de facto, a da sujeição a uma devassa da sua intimidade e da reserva da sua vida privada, quando não mesmo o condicionamento da sua integridade física e biológica, apenas para que possam ver garantida a concordância do registo civil com a sua identidade pessoal.
Passando à margem dos juízos morais, que alguns, certamente, não resistirão em fazer, como já hoje aqui aconteceu, sobre como e se a sociedade deve ou não aceitar os comportamentos dos cidadãos perante si mesmos, o que o PCP destaca como nuclear nesta discussão é o respeito e a dignidade que qualquer pessoa deve merecer do Estado português, particularmente perante a justiça.
Uma alteração do registo civil como a que está em causa não deve implicar uma acção intentada em tribunal, obrigando ao pagamento de custas, à constituição de advogados, à realização de audiência de julgamento, à inquirição de testemunhas, à associação de quem intenta a acção e a um sem número de condicionamentos à sua dignidade pessoal e até à sua integridade física e psíquica, antes deve ser um processo expedito, em que o Estado se baste com a constatação da nova condição dessa pessoa perante o registo civil, bem como que nesse processo houve e continuará a haver o devido acompanhamento clínico.
Apesar de diferentes entre si, ambas as iniciativas legislativas avançam nesse sentido e, por isso, serão acompanhadas pelo PCP. À partida, a proposta de lei parece-nos mais acertada em dois aspectos.
Por um lado, ao estabelecer a necessidade de apresentação de um relatório elaborado por uma equipa clínica multidisciplinar que comprove o diagnóstico de perturbação de identidade de género, a proposta de lei permite maior adequação das exigências à situação concreta de cada pessoa, permitindo igualmente maior validade da formulação legal, face à evolução científica e clínica que neste domínio possa vir a registar-se.
Parece-nos ser preferível esta solução à alternativa apresentada pelo BE de fixar o conjunto de requisitos a verificar.
Por outro, ao fazer intervir uma equipa clínica multidisciplinar na produção de um relatório global e não, como faz o BE, apenas um médico para cada um dos requisitos fixados, a proposta de lei parece ser mais ajustada e mais eficaz do ponto de vista da economia processual.
Colocam-se ainda em ambas as iniciativas outras questões e dúvidas quanto à definição de prazos, à possibilidade de rejeição do pedido de alteração do registo, à aplicação da lei quando esteja pendente acção judicial ou outras, que, no entanto, julgamos poderem ser ultrapassadas em sede de discussão na especialidade.
Para o PCP, o que importa é que este processo legislativo permita pôr fim ao verdadeiro calvário que vivem os cidadãos que apenas pretendem que o seu registo perante o Estado corresponda à sua verdadeira identidade.

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