Intervenção de

Política de trabalho e segurança social - Intervenção de Jorge Machado na AR

Debate sobre política de trabalho e segurança social

Sr. Presidente,
Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social

O Sr. Ministro fez referência a um «acordo» quanto às alterações ao
subsídio de desemprego. Em bom rigor, o que aconteceu foi que foram
consensualizados alguns aspectos onde o Governo aceitou as propostas
dos parceiros sociais.

Apesar disso, o último texto proposto não passa de um
conjunto de princípios e generalidades que importa concretizar e verter
em diploma legal, que, na nossa opinião, deve ter a forma de proposta
de lei e não de decreto-lei.

Não podemos deixar de salientar, para já, a nossa
preocupação quanto a diminuição do apoio aos desempregados. Isto
porque, com as novas regras, o período de tempo a que o desempregado
tem direito ao subsídio depende não de toda a carreira contributiva
mas, sim, do tempo que decorre desde a última vez que esteve
desempregado. Com os níveis de precariedade que existem em Portugal,
facilmente se percebe que esta medida visa reduzir o tempo a que os
desempregados têm direito ao subsídio de desemprego e, assim, poupar
dinheiro à custa de uma menor protecção social.

O Sr. Primeiro-Ministro disse que o acordo representa
«um elemento de confiança e de esperança na redução do desemprego». Sr.
Ministro, em que medida vão estas alterações reduzir o desemprego?
Quantos postos de trabalho vai o subsídio de desemprego criar, Sr.
Ministro?

Vão os trabalhadores da Panibel, em Lisboa, vão os
trabalhadores da Triveni, em Gondomar, ou os trabalhadores da Sorefame
recuperar os seus postos de trabalho por causa das novas regras do
subsídio de desemprego?

Segunda questão: quando se fala da redução do número
de desempregados no País é importante saber se essa redução se está a
efectuar à custa de engenharia estatística ou não.

Por exemplo, seria bom que o Sr. Ministro informasse
quantos desempregados estão a prestar funções permanentes na segurança
social ao abrigo dos POC. Sabemos que existem desempregados que estão a
exercer funções permanentes, por exemplo, no processamento de dados
sobre desempregados e, até, no atendimento ao público. É preciso saber
quantos desempregados, ao abrigo dos POC, estão a trabalhar na
Administração Pública.

Sr. Ministro, fomos recentemente confrontados com
estudos que vêm confirmar aquilo que já todos nos receávamos: o número
de idosos vítimas de abandono e de abuso é preocupante. Outro facto
preocupante é a informação de que a maior parte destes abusos se
verificam no seio da família Infelizmente, tínhamos razão quando
afirmámos que a solidariedade familiar não se impõe por decreto e que
há situações em que são os próprios familiares a causa do abandono dos
idosos e, por isso, importava corrigir as regras de atribuição do
complemento solidário para idosos. Infelizmente, a maioria socialista
assim não entendeu e rejeitou as propostas do PCP, pelo que pergunto ao
Sr. Ministro como é que vai resolver o problema da atribuição do
complemento solidário para idosos em casos de vítimas de abandono e
abuso. Vai exigir que o idoso peça aos seus familiares que entreguem as
declarações de IRS?

Vai exigir que os idosos vítimas de abusos intentem
acções contra os seus familiares? Já imaginou o Sr. Ministro as
consequências desses actos?

Sr. Ministro, tivemos conhecimento de um facto que
nos deixou muito preocupados. Por circular do Sr. Procurador-Geral da
República, este informa que existe um elevado número de menores
institucionalizados ilegalmente. Os dados disponíveis permitem-nos
afirmar que existem cerca de 2440 crianças entregues ilegalmente às
instituições.

Na verdade, existem casos em que são as famílias que
entregam directamente as crianças às instituições, mas existem outras
situações onde as comissões de protecção de menores entregam os menores
sem comunicar esse facto ao Ministério Público, logo sem qualquer
processo de promoção e protecção.

Veja-se a situação do distrito de Vila Real, Sr.
Ministro, onde 58% das crianças institucionalizadas não tinham qualquer
controlo judicial. Isto é, são 2440 crianças entregues em instituições
que fogem ao controlo da lei, encontrando-se estas crianças num limbo
jurídico e, consequentemente, com menos garantias quanto à defesa dos
seus direitos e quanto a sua protecção.

A falta de formação e de meios das comissões de
protecção de menores e a crescente desresponsabilização do Estado são
os responsáveis por esta situação. Que medidas vai o Governo tomar para
pôr cobro a esta situação?

Sr. Ministro, surgiu recentemente na comunicação
social a informação dada pela Associação Nacional de Empresas de
Segurança de que cerca de metade das empresas deste sector não cumprem
as suas obrigações com a segurança social. Que medidas vai o Sr.
Ministro tomar para pôr cobro a esta situação?

Sr. Ministro, para terminar, a falta de recursos
humanos e materiais, bem como a utilização abusiva de contratos
precários nos centros regionais de segurança social, leva a que se
verifiquem atrasos nas prestações, como o fundo de garantia salarial,
que em Braga conta com atrasos de dois anos, e do rendimento social de
inserção, que no Porto tem atrasos de cerca de seis meses. Considera
estes atrasos aceitáveis, Sr. Ministro? Que medidas vai tomar, uma vez
que essas prestações são prestações de emergência?

(…)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Sr. as e Srs. Deputados,

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social disse, quanto ao
subsídio de desemprego, que o decreto-lei não tem de ser discutido em
sede de concertação social. Lamentamos que o Governo opte por um
decretolei, quando podia, e devia, optar por uma proposta de lei,
trazendo, assim, a discussão desta importante questão, que tanto afecta
os portugueses, a esta Assembleia.

Sr. Ministro, porque é que tem medo de trazer à Assembleia da República esse diploma?

Porque não apresenta uma proposta de lei? Tem medo do contraditório, Sr. Ministro?

Sr. Ministro, está em curso nas empresas e locais de trabalho uma
violenta acção das organizações patronais, que procuram eliminar a
contratação colectiva e os direitos que esta consagra; viola-se o
direito à greve e o direito da organização e acção sindical;
promovem-se acções repressivas sobre os dirigentes e activistas
sindicais, chegando-se, em alguns casos, a chamar-se a GNR e a PSP,
usando-as como instrumentos dessas acções ilegais. Da Cimpor à Repsol,
da Lusosider ao Hotel Tivoli, os exemplos não param. Enquanto isto está
a acontecer, o Sr. Ministro e os seus serviços tomam que atitude?

«Lavam as mãos»? O que é que faz a Inspecção-Geral do
Trabalho? Como usa os meios que tem ao seu dispor para actuar,
fiscalizar e impedir estes atropelos?

O Sr. Ministro, depois de ter dado o dito por não
dito quanto à alteração do Código do Trabalho, promoveu algumas
alterações ditas urgentes, parte das quais vem ainda agravar em vários
aspectos, dizendo que o Governo iria, daqui a um ano, promover as
alterações globais ao Código do Trabalho. Passou-se esse ano e as
alterações ao Código do Trabalho que o PS voltou a prometer perderam-se
no tempo.

O Sr. Ministro dirá que não, que ainda na terça-feira
passada divulgou um Livro Verde e anunciou um Livro Branco , mas, na
verdade, as alterações que deviam estar clarificadas pelo Governo, ao
fim de um ano são agora remetidas para o trabalho de uma comissão, que
vai elaborar um Livro Branco com propostas que o Governo irá,
posteriormente, analisar e discutir. Até quando? Qual é o prazo, Sr.
Ministro?

Entretanto, na negociação do contrato colectivo da
FAPEL, que abrange, entre outras empresas, a Renova, o mediador
indicado pelo Ministério apresentou como proposta nada mais nada menos
do que a proposta patronal. O que é que o Sr. Ministro tem a dizer
sobre isto e o que é que se propõe fazer para evitar que esta
organização patronal, boicotando a negociação, consiga fazer caducar a
contratação, criar um vazio contratual e eliminar os direitos dos
trabalhadores?

Sr. Ministro, as coisas hoje estão bastante mais
claras. Já o sabíamos. Mas, agora, o responsável do Livro Verde sobre
as Relações Laborais também veio declarar que a principal consequência
do Código do Trabalho foi a diminuição da força negocial dos
sindicatos.

É, assim, por demais evidente a necessidade de agir
para com a legislação de trabalho, corrigindo os desequilíbrios nas
relações laborais, defendendo os direitos dos trabalhadores, no
respeito pelos princípios constitucionais, e confrontando aqueles que
querem aprofundar os malefícios do Código. É isso que é preciso fazer
com urgência. Qual é a posição do Sr. Ministro? É, mais uma vez, adiar
ou é, mais uma vez, fazer um discurso de preocupação com os
trabalhadores e juntar-se aos interesses das confederações patronais?

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