Intervenção de Paula Santos na Assembleia de República

"A situação das urgências hospitalares e da sua ruptura têm causas e responsáveis - a política de saúde deste Governo"

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Sr.a Presidente,
Srs. Deputados:
O ano de 2015 inicia-se num momento de profunda degradação da situação política, económica e social do País.
Ao contrário do fim das nuvens negras, anunciado pelo Primeiro-Ministro, o novo ano não trará vida nova mas, sim, mais exploração e empobrecimento dos trabalhadores, mais desemprego, emigração e desigualdades, e mais dificuldades no acesso a direitos fundamentais.
PSD e CDS-PP insistem em iludir o povo com mentiras e mistificações, insistem na tese da saída limpa da troica ou da recuperação económica, mas o que é real é que hoje os trabalhadores, os reformados e o povo vivem pior e que a política da troica se mantém, como consta das medidas inscritas no Orçamento do Estado.
Ao contrário dessas falsas promessas e anúncios, o que o Governo PSD/CDS reservou para os portugueses em 2015 são mais dificuldades na vida de quem trabalha.
O início do ano aí está a confirmar isso mesmo: aumento da carga fiscal sobre os trabalhadores e o povo; despedimentos na Administração Pública; novos cortes na educação, na saúde e no poder local; continuação das privatizações de empresas estratégicas como a TAP.
É esta vida velha que o Governo PSD/CDS tem para oferecer aos portugueses no ano novo, a confirmar que não há remendo que valha à política de direita. Sem derrotar este Governo e a política de direita que executa, não há solução para os problemas nacionais.
Sr.a Presidente e Srs. Deputados: O ano 2014 chegou ao fim deixando claro o quadro de degradação social, económica e política a que a política de direita tem conduzido o País e a vida nacional.
Foram trazidos a público novos casos de crimes económicos, fuga e branqueamento de capitais, gestão danosa, fraude e corrupção, que são consequência direta da política de direita, como comprovam os vistos gold, apadrinhados por Paulo Portas, ou o escândalo do BES/GES.
O que o Governo prepara para 2015 é mais do mesmo.
Os trabalhadores da Administração Pública terão novos cortes nos salários, nas pensões e mais despedimentos. Dos 12 000 trabalhadores que o Governo quer agora despedir da Administração Pública, juntando-se aos 80 000 que saíram desde 2011, há 700 trabalhadores da segurança social na linha da frente para o despedimento através da requalificação. Sem pudor, em vésperas de ano novo, o Governo divulgou a lista com os nomes dos trabalhadores a despedir. Não se conhece nenhum argumento válido para esta decisão. Estes trabalhadores desempenham funções permanentes na segurança social e de uma enorme relevância no apoio à infância ou aos idosos, pelo que o seu despedimento só se explica com a estratégia do Governo de destruição dos serviços públicos e das funções sociais do Estado.
No que respeita à segurança social, o Governo insiste no mesmo caminho de degradação das pensões e cortes nas prestações sociais. Às mais de 600 000 crianças a quem foi cortado o abono de família o Governo acrescentou entretanto mais 1700, só entre outubro e novembro.
Quanto ao desemprego, os últimos dados oficiais dizem-nos que este aumentou, com mais 30 000 trabalhadores no desemprego em comparação com o período homólogo e a destruição de mais 25 300 postos de trabalho.
Esta ruína para a vida dos trabalhadores contrasta com os privilégios e benefícios aos grandes grupos económicos e financeiros.
Para alimentar a insaciável gula dos especuladores e dos agiotas, que acumulam riqueza à custa dos rendimentos do trabalho e do saque dos recursos públicos, 2015 inicia-se com o processo de privatização da TAP em curso. Privatizar a TAP, uma empresa pública de um setor estratégico da nossa economia, é criminoso do ponto de vista político e económico. A TAP deve estar ao serviço dos portugueses e do interesse nacional, sob controlo público e não de um qualquer grupo económico.
Noutro plano, constata-se que, se o início deste ano letivo foi um desastre, há problemas que continuam a não estar resolvidos. No primeiro dia de aulas em 2015, cerca de 700 alunos com necessidades especiais não tiveram aulas. O que se passou não é mais do que o reflexo do desinvestimento na escola pública e da opção de não alargamento da rede pública no ensino especial para continuar a financiar entidades privadas. O resultado está à vista de todos: os penalizados são os alunos e suas famílias.
Sr.a Presidente e Srs. Deputados:
No final de 2014 e início de 2015, o País foi novamente brindado, pela negativa, com as consequências da política de desinvestimento na saúde e a realidade a desmentirem a propaganda do Governo.
A situação das urgências hospitalares e da sua rutura não é um problema pontual e não é de hoje, é frequente, vem de há muito e tem vindo a agravar-se. Os elevados tempos de espera para o atendimento nos serviços de urgências hospitalares, de 22 horas no Hospital Amadora-Sintra e no Hospital de Santa Maria da Feira, ou de 18 horas no Hospital de Évora, ou a ausência de assistência médica às duas pessoas que morreram nos serviços de urgências têm causas e responsáveis: a política de saúde deste Governo.
O desinvestimento no Serviço Nacional de Saúde, a limitação na contratação de profissionais de saúde, o incentivo à precariedade e à instabilidade conduziram a uma enorme carência de profissionais de saúde, à redução da capacidade de resposta das unidades hospitalares públicas e à degradação dos cuidados de saúde prestados.
A subcontratação de profissionais de saúde em falta através de empresas de trabalho temporário não é parte da solução para resolver a carência de profissionais mas parte do problema, porque implica uma enorme rotatividade dos profissionais de saúde, desrespeita o conceito de equipa, os profissionais de saúde não conhecem a organização e não reconhecem a hierarquia e ainda por cima consumindo recursos financeiros que poderiam ser canalizados para a contratação de profissionais de saúde integrados numa carreira, garantindo os seus direitos e o seu desenvolvimento profissional.
Por outro lado, verificou-se também a redução do número de camas de agudos nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde. Entre 2011 e 2013, o País perdeu 944 camas de agudos. A falta de camas para internamento tem também contribuído para os elevados tempos de espera para atendimento nos serviços de urgência hospitalares, obrigando a que as ambulâncias fiquem retidas nos hospitais longas horas porque não têm cama para colocar o doente e libertar a maca, correndo o risco de as ambulâncias não estarem disponíveis para outras emergências, comprometendo o socorro a outras pessoas.
A resolução deste problema não se compadece com paliativos. É preciso de uma vez por todas por fim à contratação de empresas e integrar nos quadros os profissionais de saúde em falta, criando condições para a sua fixação e valorizando as suas carreiras. O PCP vai entregar uma iniciativa legislativa neste sentido.
Sr.a Presidente, Srs. Deputados: A solução para os problemas nacionais não está na política de direita. Está mais do que demonstrado que esta política é a causa dos problemas dos trabalhadores, do povo e do País e que só a rutura com essa política pode abrir espaço para a sua resolução.
Como o povo vem reclamando e lutando, é urgente a demissão deste Governo, mas é também necessária a rutura com a política de direita e a construção de uma política alternativa, patriótica e de esquerda.
Neste início de 2015, o compromisso que reiteramos com todos os portugueses é o de continuar a lutar pela construção dessa alternativa com confiança e esperança no futuro. Confiança na luta e na unidade dos trabalhadores, dos reformados, dos jovens, dos democratas, dos patriotas e de todos aqueles que querem pôr fim a este rumo de retrocesso político, económico e social e retomar o caminho dos valores de Abril.
(…)
Sr.ª Presidente,
Cumprimento a Sr.ª Deputada Luísa Salgueiro e agradeço a sua questão.
De facto, os portugueses hoje estão confrontados com inúmeros problemas e com inúmeras dificuldades e eu salientava as dificuldades no acesso a direitos fundamentais. A Sr.ª Deputada referiu as prestações sociais e também a educação, a saúde, aspetos que colocámos na nossa intervenção e que, de facto, a nossa Constituição consagra, mas que muitos portugueses se veem privados de poder ter acesso a esses mesmos direitos.
Sr.ª Deputada, o PCP tem apresentado um conjunto vasto de propostas no sentido da defesa do Serviço Nacional de Saúde. De facto, não ficamos pela retórica e apresentamos propostas concretas que vão ao encontro daqueles que são os princípios constitucionais do direito universal, público e gratuito à saúde para todos.
Neste sentido, temos apresentado propostas, por exemplo, para revogar as taxas moderadoras, porque elas constituem um obstáculo no acesso aos cuidados de saúde, para atribuição de transporte de doentes não urgentes a todos os doentes e utentes que necessitem desse instrumento para poder aceder aos cuidados de saúde, seja a consultas, a exames, a tratamentos, a cirurgias, para impedir a concentração de serviços e o encerramento de serviços quer ao nível dos cuidados de saúde primários, quer ao nível dos hospitais.
De facto, o PCP tem apresentado inúmeras propostas.
Também nos preocupamos com as questões relacionadas com a contratação de profissionais. De facto, a situação que vivemos neste momento no nosso País nos serviços de urgências hospitalares não é uma situação pontual, ocorre com muita frequência de norte a sul do País e é devida não só à carência de profissionais, mas também ao desinvestimento e à redução da capacidade de resposta a que os hospitais têm sido sujeitos.
Sr.ª Deputada, perante este conjunto de propostas e de posições que o PCP tem vindo a apresentar, também valia a pena conhecer a opinião do Partido Socialista e saber quais são os compromissos que assume em relação a estas propostas concretas, a esta visão, às soluções que o PCP propõe à Assembleia da República, numa perspetiva de garantir a todos os utentes, a todos os portugueses, que não haja discriminações e que todos tenham direito ao acesso à saúde e aos cuidados de saúde que lhes pertencem.
É esse compromisso que gostávamos também de conhecer da parte do Partido Socialista.
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr.ª Deputada Helena Pinto,
Agradeço a questão colocada.
De facto, o encerramento de serviços, nomeadamente ao nível dos cuidados de saúde primários, e a concentração de serviços hospitalares têm levado a uma concentração de utentes. E se, perante uma necessidade das pessoas, o centro de saúde está fechado, se não há mais nenhuma alternativa e o único serviço aberto é o serviço de urgência dos hospitais, obviamente é justo que os utentes recorram a esse serviço para poderem resolver o seu problema de saúde.
A verdade é que a política que tem vindo a ser seguida por este Governo tem uma estratégia muito clara: vai no sentido do desinvestimento para descredibilizar os serviços públicos de saúde e, no final, justificar o financiamento a entidades privadas. Ora, isto fica muito claro num conjunto de medidas que têm vindo a ser adotadas por este Governo.
Quando se reduz o horário de funcionamento dos centros de saúde, quando se encerram muitos serviços de urgência e serviços de atendimento permanente em muitos centros de saúde, quando se leva à concentração dos hospitais está, de facto, a reduzir-se a capacidade dos serviços públicos e, deste modo, a transferir os utentes para as entidades privadas. Aliás, os dados do INE referem exatamente isto.
A situação que se vive neste momento nas urgências — de resto, a época de Natal e Ano Novo já passou e as urgências continuam sobrelotadas, por isso, o que era pontual está a arrastar-se há já mais de duas semanas — não acontece só neste período, é muito frequente e tem acontecido ao longo do ano, em vários períodos.
E a verdade é que não há só a concentração dos doentes nos serviços de urgência, há também, tal como a Sr.ª Deputada referiu — e nós também já o tínhamos mencionado na intervenção que aqui hoje fizemos —, a concentração das ambulâncias à porta dos serviços de urgência. Ora, esta situação, para além das implicações que tem não só em termos de congestionamento, mas também de funcionamento dos serviços, revela a carência de camas nos hospitais, que os sucessivos Governos têm vindo a reduzir nos últimos anos.
A realidade é que Portugal tem um número de camas por habitante muito inferior à média dos países da Europa, o que tem, obviamente, consequências. Fecharam camas que agora estão a abrir em alguns hospitais, porque são necessárias. A realidade está a demonstrar que esses serviços são necessários e que está a ser reduzida a capacidade de resposta das entidades públicas para prestar cuidados de saúde de qualidade aos utentes.
Sr.ª Deputada, obviamente, são necessárias medidas urgentes, são necessárias medidas extraordinárias, mas há uma outra coisa que é necessária porque com este Governo, com o PSD e com o CDS, tendo em conta a sua orientação política e aquilo que têm vindo a implementar, não é possível resolver os problemas que hoje existem no Serviço Nacional de Saúde. Os problemas do Serviço Nacional de Saúde só serão resolvidos se houver uma rutura nesta política e com uma mudança por uma verdadeira alternativa que vá ao encontro dos valores de Abril.
(…)
Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada Carla Rodrigues,
Agradeço a questão que colocou, mas a verdade é que a preocupação que o PSD diz ter com a saúde não se reflete na política de saúde que os senhores têm aprovado e que o vosso Governo tem imposto ao profissionais de saúde.
Se, hoje, se verifica uma carência de profissionais de saúde, há responsáveis por isso. Os responsáveis são os sucessivos Governos, e o seu Governo tem muitas e muitas responsabilidades.
Porque é que os médicos saem antecipadamente do Serviço Nacional de Saúde? Porque é que os médicos saem do Serviço Nacional de Saúde e vão celebrar contratos com entidades privadas? Porque é que há médicos que ainda estão em formação e ponderam emigrar, uma vez que o Serviço Nacional de Saúde não lhes dá resposta em termos de carreira, não lhes dá garantia de desenvolvimento profissional? Estas são as questões que os senhores não querem discutir, que os senhores escondem e que, de facto, são a realidade concreta do dia a dia dos profissionais de saúde.
É verdade, Sr.ª Deputada, que, se o Serviço Nacional de Saúde vai dando uma resposta, isso não se deve de forma alguma ao Governo, que só tem contribuído para criar dificuldades; deve-se, sim, aos profissionais de saúde que, mesmo perante todos os ataques, com cortes nos salários, com a retirada de direitos, com a desvalorização profissional e social a que têm sido sujeitos, continuam a contribuir para que os utentes possam ter melhores cuidados de saúde, contrariando até as orientações do Governo, que quer degradar, degradar e degradar cada vez mais as condições de saúde.
Sr.ª Deputada, eu diria que a sua intervenção foi até, de certa forma, ofensiva para os utentes que estão, neste momento, em muitos centros de saúde e em muitos hospitais à espera de ser atendidos e que não o são exatamente porque há falta destes profissionais de saúde.
A verdade é que muitos utentes não têm médicos de família e não têm acesso aos cuidados de saúde como deveriam exatamente por esse motivo.
Sr.ª Deputada, não venha com essas teorias, porque a verdade é que o Governo, com a sua atuação, é responsável por empurrar milhares e milhares de profissionais para fora do País e para fora do Serviço Nacional de Saúde.
Quanto à situação que vivemos neste momento, os senhores continuam a afirmar que é uma situação pontual, mas não é, Sr.ª Deputada!
Sabemos que situações como estas acontecem neste período, mas o Governo não se precaveu. O Governo só tomou essas medidas extraordinárias que referiu, e que são temporárias, porque aconteceu aquilo que aconteceu no Natal, porque, infelizmente, morreram pessoas nas urgências, o que obrigou o Governo a tentar mostrar um sinal de que está preocupado e de que está a tentar resolver o problema. Mas hoje as dificuldades permanecem, continuam no dia-a-dia.
Sr. Presidente, para terminar, queria dizer que não somos só nós que consideramos que este problema não tem a ver com o momento do ano em que estamos mas, sim, com as políticas. Também a Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares diz que a situação que se vive nas urgências não é devido a um aumento da procura, que não há mais doentes nas urgências do que noutros anos na mesma altura, as equipas é que estão no «fio da navalha» e não é possível haver mais elasticidade.
Ouça o que dizem, porque são os profissionais que estão, no dia a dia, a gerir os hospitais que desmentem o Governo, que desmentem o PSD e o CDS e que colocam em cima da mesa os problemas: a falta de recursos humanos derivada da política deste Governo!

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