Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

«O Governo está a fazer uma política de terra queimada»

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No debate quinzenal no dia seguinte ao anuncio das medidas que vão ser apresentadas no Orçamento do Estado, Jerónimo de Sousa afirmou que estas medidas são gravíssimas e violentas para os trabalhadores e para o povo, enquanto que o capital financeiro continuará a roubar o país. A resposta a esta ofensiva terá a firme luta para as derrotar.
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Debate com o Primeiro-Ministro, que respondeu às perguntas formuladas pelos Deputados

Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
O senhor começa a aproximar-se cada vez mais da forma de estar e de dizer que caracterizaram o ex-primeiro-ministro Sócrates e que era a de dizer uma coisa e fazer outra bem diferente.
Anunciou, ontem, um conjunto de medidas «violentas» (a expressão foi sua). Pois, eu creio, Sr. Primeiro-Ministro, que, mais uma vez, estamos a assistir a um «filme» já visto.
Lembra-se, com certeza, de Durão Barroso, em nome do País que estava «de tanga», agitar o défice como «a questão das questões», «o problema dos problemas» a nível nacional…! Depois, veio Sócrates criticar o défice deixado por Durão Barroso e Santana Lopes. Agora, vem o Sr. Primeiro-Ministro afirmar que o problema está no défice deixado pelo PS…, o que, sendo um problema, não é «o problema central» que atravessa o nosso País!
Sr. Primeiro-Ministro, as medidas anunciadas ontem não revelam que tenha mau feitio ou que tenha resolvido diabolizar os portugueses. Não é isso! São opções que resultam, naturalmente, da matriz do pacto de agressão a que o nosso País está sujeito, mas também da natureza classista deste Governo.
Por muito que fuja a esta questão, quando vamos ao concreto, verificamos que é verdade.
Anunciou medidas violentas e fala em incompreensões naturais que possam existir entre os portugueses. Sr. Primeiro-Ministro, sabe lá o que é a vida, sabe lá quais são as consequências e os dramas sociais a que vamos assistir com estas medidas draconianas que estão em curso!?…
A primeira pergunta que lhe deixo é a seguinte: é capaz de explicar, mesmo, admitindo, por estimativa ou por alto, quanto é que nesta factura pagam os rendimentos do trabalho ou quem vive dos seus pequenos rendimentos, da sua reforma ou da sua pensão e quanto é que pagam o capital e os grupos económicos, particularmente o capital financeiro que tem graves responsabilidades na situação em que nos encontramos?
Diga lá, Sr. Primeiro-Ministro! É porque aqui é que se definem as opções!
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Não gostaria que entendesse a minha intervenção como uma questão de fulanização. Falei da natureza da política do seu Governo e acabou por demonstrar, precisamente, que tenho razão.
Falou e sublinhou as medidas, a austeridade, os sacrifícios que os portugueses que trabalham, que vivem da sua reforma, da sua pensão ou do seu pequeno negócio vão «pagar com língua de palmo», mas em relação à factura ao capital financeiro, aos grandes grupos económicos aquilo que disse foi zero!
Aliás, ontem, na sua intervenção, foi tão clarinho, tão preciso em relação aos cortes, em relação às medidas brutais, mas, quando chegou à parte da taxação dos offshores, o Sr. Primeiro-Ministro — que até costuma ler tão bem… — atrapalhou-se e foi pouco claro, porque com certeza não é capaz de ser tão preciso e claro como é, rude, em relação a quem trabalha.
Nesta linha, porque recorreu à ideia da competitividade, pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro: como é que decidiu o caminho do aumento da competitividade? Não foi visando corrigir os custos dos factores de produção que atingem hoje as nossas pequenas e médias empresas! Não foi salvaguardando, em relação à taxa intermédia do IVA, sectores que precisam, «como de pão para a boca», que o IVA não aumente e que vão ao charco, designadamente a restauração ou a hotelaria, entre outros!… Não!! Optou por agitar a esses sectores com a obrigação de os trabalhadores portugueses trabalharem mais meia hora por dia, ou seja, mais duas horas e meia por semana!!
Imagine, portanto, os dias a mais trabalhados gratuitamente, Sr. Primeiro-Ministro!!
Por outro lado, ainda diz que vai haver a possibilidade de despedimentos mais baratos — sendo o congelamento dos salários na Administração Pública um exemplo concreto —, piores horários e menos direitos…
Este é o grande equívoco em que V. Ex.ª está a incorrer: fique sabendo que, quando se desvaloriza e ataca a força principal da economia, que é a força do trabalho, com estas medidas de alteração da legislação laboral, de penalização sobre quem trabalha, está-se a penalizar a força dinâmica e determinante para o desenvolvimento e para o crescimento e que, por isso, está condenado ao fracasso e vai falhar. E vai falhar também no plano do crescimento! E sobre isto quero aqui fazer o exercício possível da «quadratura do círculo»: explique lá, Sr. Primeiro-Ministro, como é que quer crescimento económico se há menos investimento, se vão existir mais falências e mais desemprego, menos consumo, salários mais baixos, reformas mais baixas?!… É porque a economia pode não ter uma precisão «ao milímetro», mas tem leis!…
Mas não! Os senhores não estão a querer o crescimento. Estão a fazer uma «política de terra queimada» em relação à nossa economia.

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