Intervenção de

Linhas e instalações de alta tensão - Intervenção de Agostinho Lopes na AR

Garantia do princípio da precaução face às radiações provenientes de campos electromagnéticos produzidos pelas linhas e instalações de alta tensão

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Os problemas a que o projecto de lei n.º 410/X, apresentado pelo Bloco de Esquerda, pretende responder estão hoje razoavelmente identificados.

Variadas investigações concluíram não ser inócuos para a saúde humana os efeitos de determinados campos electromagnéticos. Releva particularmente a posição da Organização Mundial de Saúde, aliás, alterando a posição anterior, no sentido de classificar os campos magnéticos de 50 ou 60 Hz no grupo dos possíveis cancerígenos, tendo mesmo em 2001 aprovado a exigência de determinadas medidas de precaução para reduzir a exposição dos seres humanos.

Dos diversos efeitos induzidos pelas linhas e instalações de muito alta tensão, três merecem a principal atenção pelas suas consequências no meio circundante: interacções com o ordenamento do território e o urbanismo; impactos na paisagem rural e urbana pelo valor sóciocultural colectivo; consequências psicofisiológicas - já referidas - nos seres humanos que habitam ou trabalham nas proximidades de uma infra-estrutura desta natureza.

Mas se dúvidas permanecem sobre as consequências para a saúde humana como outros estudos não conclusivos indiciam, o valor da vida humana sobejamente justifica que se aplique de forma rigorosa o princípio da precaução.

O Grupo Parlamentar do PCP dá o seu acordo ao que é proposto no projecto de lei n.º 410/X,

independentemente do seu aperfeiçoamento em sede de especialidade.

Srs. Deputados, dito isto, serve esta ocasião para denunciar o inaceitável comportamento do Governo PS no conjunto de situações que vieram a público pela contestação e luta das populações afectadas e que aqui quero saudar. Refiro-me às situações de Silves, Sintra, Almada, Batalha e também Serzedelo, em Guimarães.

Não é aceitável a insensibilidade, a passividade e em alguns casos a cumplicidade com que os

responsáveis do Governo assistiram a estas situações como se não tivessem a ver com elas.

Não é aceitável que, por vezes, tivessem corroborado a argumentação terrorista com que se pretendeu responder às inquietações e reclamações das populações e posições das autarquias.

É, ainda, inaceitável a forma como o Ministério da Saúde, pelo menos no caso de Serzedelo, foi respondendo às questões levantadas pelo Grupo Parlamentar do PCP, que levou a que tivesse de apresentar três requerimentos sobre o mesmo problema.

Relevemos, no entanto, o «terrorismo» argumentativo agitando o papão dos elevadíssimos custos do enterramento das linhas que seriam - e não poderia ser de outra maneira nos esquemas mentais dominantes - despejados sobre os consumidores contribuintes. Por que razão não se terão lembrado, por um breve momento que fosse, que seria possível fazer esses investimentos um pouco à custa do lucro anual? De facto, é puro «terrorismo» verbal quando nos lembramos que em algumas das situações do que se tratava não era sequer de enterrar a linha mas, apenas, de usar outros traçados propostos, inclusive, pelas autarquias.

De facto, é «terrorismo» porque nunca se tratou de enterrar os cerca de 1500 km da linha de 400 kW, mas apenas de algumas dezenas de quilómetros.

Finalmente, Srs. Deputados, queria assinalar e sublinhar a inquestionável imbricação do tratamento deste problema com o processo em curso de privatização da REN (Rede Eléctrica Nacional) ou, pelo menos, da sua gestão, ainda que sob capital público, na lógica exclusiva da maximização dos resultados lucros, subvertendo a sua eminente natureza de prestadora monopolista de essencial serviço público.

Evitar a progressão desenfreada e anárquica de linhas aéreas de transporte de electricidade de muito alta tensão e outras e o seu confronto com valores naturais e paisagísticos relevantes ou aglomerações urbanas já estabelecidas ou em consolidação exige uma supervisão e regulamentação efectiva e democrática do

planeamento e da gestão do instrumento e a exploração dessas infra-estruturas, o que é pouco compatível - para não dizer incompatível - com a desregulamentação, liberalização e privatização crescentes no sector energético português.

A inaceitável lógica da REN privatizada não será nunca de reduzir ou de eliminar os impactos sociais e ambientais negativos, a não ser quando eles possam significar a redução dos custos de investimento e operacionais.

Também pelo problema em debate é necessário travar essa nova abjecção neoliberal, que é a privatização de uma rede monopólio natural, básica, estratégica para o País e estruturante do seu território.

 

 

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