As nossas cordiais saudações a todos os presentes que aqui vieram debater os problemas dos transportes públicos e da mobilidade da Área Metropolitana de Lisboa, mas igualmente os contributos e soluções que se impõem para os ultrapassar.
As opiniões que aqui foram expressas confirmam a gravidade da situação em que se encontra o sector dos transportes, particularmente dos transportes públicos e a existência de bloqueios agudos à mobilidade na Área Metropolitana de Lisboa com evidentes prejuízos para a qualidade de vida das populações e com impactos muitos negativos no plano social, ambiental, energético e na economia.
Uma grave situação que é resultado, como igualmente aqui se afirmou, de uma errada política de transportes que tem vindo a concretizar-se nos últimos anos, particularmente desde o início da década de noventa e que se acelerou nestes anos de PEC e de Pacto de Agressão.
Anos de política de direita e de integração capitalista europeia, com a mercantilização dos serviços públicos e a concentração monopolista, que em matéria de transportes públicos se caracteriza pela contínua redução da oferta de serviço público, aumentos brutais de preços, limitações à utilização do passe social intermodal e tentativas para o extinguir, redução das velocidades de circulação e a sua consequente sobrelotação.
Está hoje muito claro e todos os dados confirmam que os anunciados benefícios para os utentes que resultariam da privatização do sistema de transportes públicos se traduziram, afinal, não só numa crescente incapacidade para promover uma política integrada de transportes, essencial para a superação dos graves bloqueios à circulação existentes, como se traduziriam, em geral, em enormes custos para os utentes dos transportes e sem qualquer contrapartida na qualidade dos serviços prestados e na prometida diversificação da oferta de carreiras e serviços.
A incapacidade revelada por esta política na promoção de um sistema integrado de transportes é o resultado da sua opção de favorecimento dos interesses das empresas privadas de transporte e da evidente secundarização do transporte público.
Uma política que fez do ataque às empresas públicas de transporte, instrumento determinante na concretização de um sistema de transportes com efectiva prioridade ao serviço público, o seu eixo condutor principal.
A política errada seguida pelos sucessivos governos está bem patente nos enormes custos económicos que resultam do crescente peso que tem o transporte individual no movimento pendular diário entre a residência e o local de trabalho e de estudo, e o número de horas perdidas nas deslocações diárias que, prolongando a jornada de trabalho de milhares e milhares de pessoas, tem evidentes consequências no equilíbrio familiar e na produtividade global do País.
Os resultados desta política estão à vista hoje com as consequências nos transportes públicos na AML: entre 1991 e 2011, o transporte colectivo que pesava 51% do total das pessoas, na repartição destas pelos diferentes modos de transporte, passou para 28%, e, em contrapartida, o transporte individual passou de 26% em 1991 para 45% em 2011, ou seja, foram empurrados para o transporte individual cerca de 19%.
Estes números são, por si só, demonstrativos da imperiosa necessidade de inverter a política de transportes que tem vindo a ser concretizada.
Enquanto nos principais países desenvolvidos se afirmam crescentemente e concretizam políticas privilegiando o transporte público, em Portugal, persiste-se numa política contrária, acentuando todos os fenómenos negativos que resultam dos enormes fluxos diários de transporte individual, com a agravante de, com tal política, se pôr em causa o direito constitucional ao transporte e à mobilidade de largas camadas da população.
Não é por acaso que Portugal é o país da União Europeia onde os passageiros pagam a maior percentagem dos custos dos transportes públicos.
Na verdade, hoje, os transportes públicos são caros, consequência directa dos aumentos brutais dos últimos anos e de forma agravada nos últimos cinco (superiores a 30%, tendo chegado a ultrapassar os 180%, com a conjugação do desaparecimento de títulos e de descontos).
Aumentos que provocaram uma significativa perda de passageiros.
Não somos só nós que o dizemos. Isso o reconheceu o Relatório do próprio Grupo de Trabalho da AMTL, em 2014, que identificava duas fases importantes no desenvolvimento do sistema tarifário: uma fase de expansão até 1992, com a consagração do sistema de passes sociais intermodais e uma de retracção, a partir daí, com o desenvolvimento dos passes combinados e a explosão de títulos, na sequência da privatização dos Centros Operacionais suburbanos da Rodoviária Nacional.
Por muito que argumentem em contrário, de facto, os custos dos transportes públicos em Portugal são mais caros que na Europa.
Faça-se a comparação entre o SMN e o custo dos transportes, e descobriremos que os transportes públicos são mais caros em Portugal que na França, na Alemanha ou em Espanha. Compare-se com o salário médio, e as diferenças ainda serão mais gritantes.
É preciso reverter o movimento gerado pelo brutal aumento de preços (que provocaram a diminuição de mais de 100 milhões de passageiros só na AML)!
Esta é uma batalha que temos que continuar a travar, com iniciativa e com propostas concretas, mas também com a dinamização da luta das populações, a começar pela exigência da reversão de algumas das medidas mais gravosas impostas nos últimos anos, nomeadamente a reintrodução da redução de 50% nos passes para estudantes e reformados, e dos passes individuais do Metropolitano e da Carris.
Está em curso a elaboração de uma proposta legislativa do PCP para a reposição dos apoios a estudantes e reformados, mas esta é também uma batalha que não prescinde na sua concretização do empenhamento e da luta das populações que se impõe continuar a dinamizar.
Mas se é preciso reduzir preços é urgente também alargar a oferta, a qualidade e a fiabilidade dos transportes públicos.
Hoje existem vastas regiões da Área Metropolitana, onde os transportes públicos não chegam a partir da hora de jantar ou mesmo todo o fim-de-semana, havendo inclusive Estações de Caminho de Ferro encerradas ao fim de semana.
Vieram aqui exemplos. As reduções impostas pelo governo à oferta no Metropolitano de Lisboa (alargamento dos intervalos de circulação, redução da velocidade operacional, redução do número de carruagens a circular), na Carris (redução e encurtamento de carreiras, redução dos horários) e na Transtejo e Soflusa.
No modo ferroviário a oferta tem igualmente diminuído, particularmente na Linha de Cascais e na Linha de Cintura.
A fiabilidade e a segurança da operação degradou-se igualmente a níveis assustadores. O caso da Linha de Cascais da CP, com supressões diárias na oferta, e alguns acidentes que até agora não tiveram consequências demasiado graves, é o exemplo mais paradigmático.
Outro exemplo gritante. A Carris que está a suprimir uma média de 100 «chapas» por dia, por falta de trabalhadores.
As rodoviárias privadas, que reduzem sistematicamente a oferta e cortam serviços sempre que pretendem, como se não estivessem obrigadas a níveis mínimos de serviço por contrato.
Nós pensamos que isto tem que mudar e que é preciso inverter a degradação a que se assiste, com medidas que ataquem as suas causas.
Desde logo, é preciso repor, nas empresas públicas, o número de trabalhadores necessários aos sectores operacionais. Na Carris, no Metropolitano, na CP Lisboa. Faltam trabalhadores também para os sectores operacionais da Transtejo e da Soflusa.
Neste âmbito e como aqui foi salientado, a intensificação da luta dos trabalhadores é necessária para pôr termo à destruição de postos de trabalho. Mas igualmente para a criação de condições dignas de trabalho e da criação de condições de participação dos trabalhadores na solução dos problemas e na implementação de medidas para elevar a qualidade do serviço prestado o que implica um combate decidido à precarização das relações laborais, completando os quadros operacionais das empresas com trabalhadores efectivos, a par da dignificação das carreiras e aumentos salariais que reponham o poder de compra perdido e a elaboração de planos de formação permanente que garantam a preparação dos trabalhadores para responderem às exigências técnicas do futuro, valorizando a contratação colectiva.
Em segundo lugar são necessários investimentos na CP, mas igualmente no Metropolitano de Lisboa, na Carris, Soflusa e na Transtejo. Investimentos que devem ser planeados para o médio e longo prazo, em infraestruturas, equipamentos e material circulante, utilizando plenamente os recursos públicos (nacionais e comunitários), respeitando as prioridades - Linha de Cascais, Linha do Oeste, Linha Verde do Metropolitano – mas projectando já o desenvolvimento da rede – nomeadamente a expansão do Metropolitano de Lisboa e do Metro Sul do Tejo.
Esta é outra linha de trabalho que precisamos de dinamizar com a nossa iniciativa e proposta no plano das instituições e com o envolvimento das populações.
Por outro lado, uma resposta metropolitana, enquadrada com as prioridades nacionais e coordenada com as necessidades de cada um dos municípios, exige um verdadeiro sistema de transportes funcionando em rede.
É por isso que sempre defendemos a existência de Autoridades Metropolitanas de Transporte, e apontamos como profundamente negativo o seu encerramento decretado pelo anterior governo.
Elas terão que ser reconstruídas, hoje partindo da AML, garantindo o planeamento, a coordenação e a gestão metropolitana dos transportes públicos, e promovendo, de facto, a participação do conjunto de entidades envolvidas – autarquias, AML, governo central, empresas, utentes e trabalhadores.
É no sentido de promover a criação de novas Autoridades Metropolitanas de Transportes que o PCP avançará com uma proposta de um novo Regime Jurídico.
Uma questão que está no centro da resposta metropolitana no plano da mobilidade e dos transportes públicos é a questão do Passe Social Intermodal, como aqui foi chamado a atenção.
O passe social intermodal constitui um avanço social e um elemento determinante de atracção ao sistema de transportes públicos com evidentes benefícios para as populações, mas também é um indesmentível contributo positivo para a mobilidade, o ambiente, a qualidade de vida e para a economia nacional.
A sua defesa é parte constituinte de uma verdadeira política patriótica e de esquerda, comprometida com os legítimos interesses e direitos dos trabalhadores e das populações.
Ele é um elemento estruturante de uma política de transportes coerente na AML.
A descaracterização e enfraquecimento do passe social intermodal constituiu ao longo dos anos um dos eixos de pressão que as empresas privadas têm usado na sua estratégia de expansão e condicionamento do sector. Como foi o caso da aposta em sistemas (como os passes combinados) que reduzem a oferta de transportes à deslocação mínima obrigatória (casa-trabalho, escola-trabalho), tendo promovido esses sistemas aproveitando as dificuldades económicas de inúmeras famílias, que aproveitam reduções de preço de 2/3 euros a troco de uma redução de mobilidade de 50 a 60%.
Paralelamente, o ataque ao passe intermodal implicou que um conjunto de operadores tivesse autorização para operar fora do passe (praticando preços mais caros).
O actual passe intermodal representa uma importante conquista dos utentes. Ele tem sido o principal elemento de contenção dos preços na AML ao mesmo tempo que promove uma mobilidade alargada.
Uma das questões centrais para o desenvolvimento de um verdadeiro sistema de transportes na AML é que o tarifário passe a assentar na plena intermodalidade do mesmo, integrando todos os operadores, modos de transporte e respectivos serviços no sistema.
Ou seja, que garanta a possibilidade de circulação completa na Área Metropolitana de Lisboa utilizando conjugadamente, e sem acumulações exorbitantes de preço, qualquer operador e modo de transporte.
Para o alcançar, o passe social intermodal deverá manter-se como o elemento estruturante do sistema tarifário, com preços acessíveis e ampliando a oferta de mobilidade que estes têm garantido.
Com todas as concessões de transportes a aproximarem-se do seu fim, existe agora uma boa oportunidade para a integração de todos os operadores no sistema intermodal.
Isso implica alargar e aumentar as actuais coroas, cobrindo toda a área metropolitana e consagrando-o como título válido em todos os operadores de transporte colectivo, públicos e privados, na respectiva área assegurando que um único passe permita a utilização de todos os meios de transporte colectivo sem aumento de preço para os utentes e criar bilhetes multimodais válidos em todos os operadores.
É para dar resposta a questão central que o PCP irá avançar em breve com uma iniciativa legislativa.
Uma eficiente política de transportes públicos, a pensar na mobilidade das populações e no seu bem-estar exige, naturalmente, outras soluções e medidas que têm que resultar de uma assumida e coerente orientação que tenha como objectivo central a defesa e desenvolvimento do transporte público, nomeadamente o aumento da importância das empresas públicas de transporte, motor de um verdadeiro sistema de transportes públicos, com transportes coordenados e frequentes.
O que implica afirmar um conjunto de fortes e saudáveis Empresas Públicas, revertendo processos de privatização/concessão e outros processos ditos de reestruturação e fusão que ocorreram no sector.
Esta é a única forma de garantir a efectiva prioridade ao serviço público, com transportes coordenados, frequentes, seguros, com boa qualidade e a preços sociais, recebendo as respectivas empresas, adequada e atempadamente, as indemnizações compensatórias pelo serviço público prestado; retoma pelo estado das empresas e actividades privatizadas, reversão dos processos de desmembramento do sector ferroviário nacional, saneamento financeiro das empresas, tendo por base acordos com o Estado no sentido da sua viabilização e melhoria da gestão.
Nestes últimos meses com o desenvolvimento de uma nova fase na vida do País com a derrota do governo PSD/CDS, em resultado da luta e do voto dos trabalhadores e do povo, e do contributo decisivo do PCP no encontrar de uma solução política, estamos hoje em melhores condições para continuar a luta que temos vindo a desenvolver de exigência de ruptura com a política de direita e pela inversão do rumo de exploração e empobrecimento que tem sido seguido por sucessivos governo e, particularmente, neste últimos quatro anos.
Foi com o empenhamento do PCP e dando expressão à luta dos trabalhadores e do povo que foi possível tomar já medidas positivas de reposição de direitos e rendimentos extorquidos nestes anos de PEC e de troika.
Nestes escassos meses desde a derrota do governo PSD/CDS, foi possível, ainda que forma limitada, dar resposta a aspirações mais imediatas dos trabalhadores e do povo que não podem ser desvalorizadas.
Medidas como aquelas que permitiram travar a concessão e privatização das empresas de transportes terrestres de passageiros, derrotando os processos de privatização do Metro, Carris, Soflusa, Transtejo. Processos que tiveram o contributo decisivo da luta de resistência dos trabalhadores que daqui saudamos ao mesmo tempo que apelamos para a sua continuação.
Nestes pouco mais de cem dias de vida da nova fase foi possível repor os complementos de reforma aos trabalhadores das empresas do Sector Empresarial do Estado, fazendo justiça aos reformados do Metro e da Carris; eliminar o corte dos feriados retirados, mas também ainda que de forma insuficiente e aquém das propostas defendidas pelo PCP, deixarem de ser aplicados cortes salariais aos trabalhadores da Administração Pública; ser assegurada a redução da sobretaxa do IRS, na base da progressividade, e a sua eliminação em 2017, entre outras.
Este caminho que a luta, o voto e iniciativa do PCP abriram haverá de dar mais frutos com a luta dos trabalhadores, do nosso povo e o empenhamento e a iniciativa de todos nós.
As medidas que aqui apresentámos para a solução dos problemas dos transportes e mobilidade das populações, mostram que a alternativa existe e que ela implica uma ruptura com o caminho que tem sido seguido.
Há soluções, uma política capaz de responder aos problemas com que o Povo e o País se confrontam.
Uma política patriótica e de esquerda, que no plano dos transportes públicos impõe o respeito pelos direitos dos trabalhadores, dos utentes e populações.