Intervenção de Hélder Guerreiro, Mesa Redonda «Energia e recursos na transição energética. Soberania, segurança, ambiente e desenvolvimento»

Galp/Petrogal: os últimos dois anos de pandemia representaram um salto significativo na destruição da empresa

Se procurarmos a raiz dos problemas que estamos a viver no que à Galp/Petrogal, o preço dos combustíveis, o abastecimento do país em termos de combustíveis líquidos e gasosos e a desindustrialização teremos que recuar há dez anos atrás, 2012, para não ir mais longe, à data da venda da participação da Caixa Geral de Depósitos, com isso rasgado o acordo parassocial que deixou um Grupo com a centralidade para o país e para economia portuguesa nas mãos do Grupo Amorim. Tudo isto no governo de Passos Coelho e Paulo Portas e cujo Presidente da República era Cavaco Silva.

Desde então para cá foram distribuídos dividendos aos accionistas em crescendo e totalizaram nesse período 2625M€ em, porém foi na Assembleia de 24 de Abril de 2020, em plena pandemia que se deu o escândalo maior em que foram canalizados para o mesmos acionistas 580 M€ (mais que os resultados obtidos) em plena pandemia de Covid-19 cujo futuro era totalmente imprevisível.

Nas duas Assembleias que lhe seguiram, em 2021e 2022, foram canalizados para os accionistas mais de 800 milhões de euros e que mostra que apenas nos últimos dois anos, os valores transferidos para os accionistas equivalem a um terço do volume total entregue em dez anos e demonstra o agravamento do saque pelos accionistas e a correspondente descapitalização da Empresa e do Grupo que se traduziu ao aumento da dívida líquida na mesma ordem de grandeza dos dividendos, apesar da venda de activos da Galp Gás Natural Distribuição – 368 M€, o encerramento da Refinaria do Porto – 90M€/ano e a já anunciada venda da participação da Exploração em Angola.

A Administração anunciou em 2020 um plano de redução de custo no valor de 1000 milhões de euros e apesar dos alertas efectuados na altura, o roubo consumou-se com a aquiescência do Governo e iniciou uma nova fase de acumulação capitalista acelerada e apressou também o esvaziamento da empresa, assente no aproveitamento da pandemia para empurrar borda-fora um terço dos ttrabalhadores por reformas antecipadas e por rescisões de mútuo acordo conseguidas com recurso a um clima de intimidação e chantagem sobre os trabalhadores que se encontravam isolados em teletrabalho, tendo a Administração nesse mesmo ano realizado dois despedimentos colectivos em que os trabalhadores visados não aceitaram rescindir o respectivo contrato pela sua mão, isto é, mútuo acordo.

Foi também nos primeiros meses de pandemia que a Administração da Galp decidiu fazer o primeiro ensaio para o encerramento da Refinaria do Porto com a paragem de diversas unidades, algumas que nunca viriam a retomar a laboração.

A descontinuação daquela refinaria representou a destruição de cinco mil postos de trabalho e 1% do PIB da Área Metropolitana do Porto, segundo o estudo da Faculdade de Economia e Gestão da Universidade do Porto e mostra bem a dimensão devastadora da decisão tomada em articulação com o Governo do PS.

O impacto em termos económicos não se limitou ao norte, mas também do ponto de vista nacional com impacto no aumento importações e diminuição de exportações de combustíveis e na segurança de abastecimento energético do país.

A relevância dos combustíveis em termos de soberania nacional não é nova, porém foi completamente ignorada, mesmo quando a tensão originada pela política de confronto do imperialismo americano já se fazia sentir e as consequências são aquelas com que somos agora confrontados, por exemplo, com o corte da importação de gasóleo de vácuo da Rússia em que esta representa metade de toda a oferta mundial deste produto, apesar dos nossos governantes continuarem a alardear que não dependemos do petróleo Russo.

O encerramento da Refinaria eliminou uma fábrica de Gasóleo de Vácuo que produzia 1 milhão de toneladas de Gasóleo de Vácuo e alimentava a Refinaria de Sines e agora vê-se na contingência de reduzir a produção nesta por falta do produto. A redução da produção de combustíveis em Sines, deixa o país à deriva no abastecimento de combustíveis, num mercado que não controla, nem tem qualquer influência e que num cenário de prolongamento da guerra ou a da ocorrência que afecte a produção da única refinaria portuguesa – como aconteceu no passado mês de dezembro – possa ocorrer o racionamento de combustíveis.

A insistência e veemência da denúncia pública deste crime execrável logrou que o novo presidente da Comissão Executiva tenha assumido a má conduta em todo o processo e anulado o despedimento de uma centena de trabalhadores que estão aos poucos a ser integrados na Refinaria de Sines e noutras área da Empresa/Grupo.

O encerramento da Refinaria do Porto também trouxe à evidência o binómio politico Governo e Administração da Galp agindo em consórcio para que os primeiros consigam um lugar ao sol na burocracia europeia e os segundos conseguirem abocanhar uma parte de leão dos fundos europeus do Plano de Recuperação e Resiliência. A prova disso é compromisso de 1700 mil milhões de euros em projectos pré-aprovados no âmbito do referido plano e que muito provavelmente alimentarão a fogueira dos dividendos. A tudo isto deram o nome de transição energética.

Houve uma mobilização de todo o aparelho socialista, incluindo a presidente da câmara que, entretanto, foi eleita como presidente da Associação Nacional de Municípios e agora apregoa a criação de um “Innovation District” nos terrenos ainda ocupados pela instalação industrial e que será mais um projecto destinado à especulação imobiliária, dando corpo a uma aspiração antiga do grupo amorim.

Os últimos dois anos de pandemia representaram um salto significativo na destruição da Empresa/Grupo com a eliminação de milhares de postos de trabalho, com o agravamento dos indicadores de solvabilidade da Empresa/Grupo compensados com o aumento preocupante da dívida porém camuflados e sustentados pelo autêntico jackpot que representou a guerra na Ucrânia em termos do aumento do crude e também das margens de comercialização dos combustíveis, onde o governo cedeu a uma reivindicação antiga das petrolíferas da redução da carga fiscal sem fixação de prços máximos.

Desta forma percebe-se claramente o posicionamento da Administração da Galp ao assumir a dianteira das sanções contra a Rússia e o seu posicionamento ao lado dos falcões da guerra.

  • Economia e Aparelho Produtivo
  • Central
  • abastecimento de água
  • Água pública
  • Alterações Climáticas
  • Capitalismo
  • Controlo Público
  • Energia
  • Galp
  • sector energético