Ensino especializado de música

 

Petição manifestando a sua não concordância quanto à extinção do ensino especializado de música no 1.º ciclo
Intervenção de Miguel Tiago

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Antes de mais, gostaria de saudar os peticionários que, perante a estratégia do Governo, primeiro escondida, depois, semianunciada e, agora, finalmente, conhecida, manifestaram justamente as suas preocupações e as fizeram chegar a esta Assembleia (petição n.º 442/X). Desde já, contam com o apoio e o empenho do PCP para a resolução da questão.

Da nossa parte, identificamos no Governo uma estratégia para o ensino artístico especializado que assenta nos mesmos princípios, embora com características diferentes, que são utilizados para os restantes segmentos da educação. É uma estratégia que assenta no combate à escola pública e na debilidade e fragilização das condições e da capacidade desta.

É, aliás, preocupante quando o Governo começa a procurar utilizar as mesmas expressões que o CDS-PP aqui vem propor: «serviço público/escola privada»...

Gostaria de dizer que o PCP não alimenta a ilusão de que é possível fazer serviço público através de escola privada. A escola privada supre o próprio conceito de escola pública e de serviço público.

O Governo tem vindo a ignorar os principais problemas do ensino artístico. Encomendou um estudo e, porque os principais problemas indicados numa fase preliminar não serviam, o Governo encontrou outros.

O alargamento da rede pública de escolas do ensino artístico especializado foi uma das principais questões colocadas, e o Governo, sobre isto, nada disse. Quanto à integração nos quadros dos professores contratados, como o PCP, aliás, propôs nesta Assembleia, o Governo nada disse. Quanto à profissionalização dos docentes, o Governo também nada disse.

Tudo isto foram questões identificadas pelo Grupo de Trabalho na fase inicial e às quais o Governo não deu resposta.

Curiosamente, o Governo deu resposta a outras questões que não foram levantadas pelo Grupo de Trabalho, nomeadamente, a certificação, a qualificação, a necessidade de acabar com o supletivo. Com isto, o Governo vai pôr um fim no ensino artístico, tal como o conhecemos, que carecia de um aprofundamento. Não há dúvida de que carecia, inclusivamente, de uma reestruturação, mas não esta, não a sua destruição. O Governo não pode utilizar o facto de o ensino artístico precisar de uma reestruturação para acabar com ele, para lhe pôr fim.

O fim do supletivo pode representar, na verdade, o fim de uma importantíssima valência, de uma importante fatia do ensino artístico.

O regime de financiamento e de patrocínio, que o Governo acaba de aprovar por despacho do Ministério da Educação, é, aliás, a consolidação desta perspectiva.

O Governo nomeia uma comissão para apurar quem merece ou não o patrocínio do Governo no ensino artístico e fá-lo em função dos seus novos objectivos. Quem optar por continuar com o supletivo será punido e apenas as escolas que conseguirem dinamizar o ensino em regime integrado serão beneficiadas. Esta é uma forma de, pela via do financiamento, impor a estratégia que o Governo quer!

A terminar, direi que é muito clara a estratégia do Governo: acabar com o supletivo, obrigar  quem queira frequentar esse tipo de regime a procurá-lo em escolas privadas, mas sem a necessária certificação, e encaminhar todos para grandes colégios, que se vão construindo, aliás, como sabemos, através da compra de escolas profissionais de música por grandes grupos privados.

Esta é a estratégia: entregar uma grande fatia, elitizar mais uma importante valência do nosso sistema educativo e, obviamente, que, com isso, o PCP nunca poderá concordar.

Daí a insistência do PCP, desde o primeiro momento da refundação do ensino artístico, no combate a esta estratégia do Governo.

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