Intervenção de Rogério Silva, Coordenador da FIEQUIMETAL, Mesa Redonda «Energia e recursos na transição energética. Soberania, segurança, ambiente e desenvolvimento»

«A designada transição energética do Governo PS tem na sua génese, uma agenda política, profundamente neoliberal»

A designada transição energética, iniciada em Portugal pelo Governo PS tem na sua génese, não uma verdadeira preocupação com as questões climáticas e ambientais, mas antes, uma agenda política, profundamente neoliberal que procura a qualquer custo colocar Portugal no pelotão da frente na redução de emissões de GEE. 

Em 2017, quando o anterior Governo iniciou este processo com o designado roteiro para a descarbonização, os trabalhadores reagiram com profunda preocupação e desconfiança, saltando logo á vista, as metas definidas para o encerramento das duas termoelétricas, Sines e Pego, que mais tarde vieram a ser antecipadas. 

A desconfiança dos trabalhadores sobre todo este processo residiu sempre, no facto de Portugal ser insignificante em matéria de emissões de GEE e o Governo pretender encerrar estas duas importantes unidades de produção electrica, sem alternativas credíveis.

Na medida em que a agenda foi sendo conhecida, facilmente entendemos que a decisão daqueles encerramentos, nada tinham que ver, com preocupações ambientais, mas apenas, com o saque aos fundos públicos com o recurso a uma narrativa toda ela centrada nas alterações climáticas, com a difusão de teorias apocalípticas, empurrar as populações para a natural e inevitável aceitação de tais encerramentos.  

Á margem do designado roteiro, surge o anuncio pelo Governo PS, do encerramento do complexo petroquímico de Matosinhos, onde se inclui a refinaria, recalcando os mesmos argumentos, Portugal tem de atingir as metas para a descarbonização da economia. Afirmavam António Costa e Matos Fernandes, “Seremos o bom exemplo na EU, em matéria de descarbonização”.

Não deixa de ser curioso, que tal anuncio tenha sido feito pela voz do então ministro do ambiente, quando o normal seria a Administração da Galp a faze-lo.

No caso, concreto da Refinaria fica igualmente claro, que a entrega ao grupo amorim das avultadas verbas publicas, a pretexto da transição se sobrepôs aos interesses industriais, da economia nacional, do emprego e do desenvolvimento da região e do País. 

Tais decisões, que resultaram em encerramentos extemporâneos não obedeceram a uma estratégia coerente para o sector energético por forma a salvaguardar o aprovisionamento, a segurança e a soberania energética e foram fortemente penalizadoras, ao destruir milhares de postos de trabalho directos e indirectos.  

 

São medidas executadas através de um conjunto de políticas públicas lesivas para os trabalhadores, para os consumidores de electricidade, gás natural e combustíveis líquidos, para além da carga fiscal ambiental crescente e penosa para todos.

O radicalismo politico da União Europeia, a que Portugal se associa numa postura subserviente, também contribui para a chamada crise energética que já conduziu a que, tanto o preço do gás natural como o da electricidade atingissem valores incomportáveis, aumentando o custo de vida dos trabalhadores, asfixiando o funcionamento das micro e pequenas empresas, sacrificando igualmente o emprego.  

Portugal, com défices estruturais, que há décadas teimam em não ser vencidos, tem um Governo que fez uma opção absolutamente suicida ao desencadear de forma radical mudanças no sector energético que potências económicas não estão dispostas a fazer. 

Países como a Alemanha inauguraram, há pouco mais de um ano, novos grupos numa central em Dortmund e vai continuar a ser produzida electricidade a partir de carvão até 2036. 

Aliás o Plano Alemão aprovado em 2020 prevê o último encerramento de uma das instalações com capacidade de 857 MW em 2038.

Foram as organizações representativas dos trabalhadores, designadamente a Fiequimetal e os seus Sindicatos que contrariamente aos defensores do liberalismo do sector energético defenderam a reabertura das centrais termoelétricas e da refinaria de Matosinhos, num contexto em que a tensão no leste da Europa se agudizava. 

Tínhamos razão, a vida veio confirmar a justeza da nossa reivindicação.  

Hoje perante a escalada dos preços, para o qual sanções económicas apenas favorecem as grandes transnacionais do sector poderia ser possível ao nosso País mitigar os impactos negativos que recaem sobre trabalhadores e população em geral.  

E só não avançará a reabertura, mesmo que transitoriamente, porque o Governo pretende a qualquer custo, fazer vingar a sua agenda politica.

Aliás, manda a prudência que no actual contexto internacional, carregado de enorme imprevisibilidade as decisões políticas sobre um sector estratégico como o da energia, fossem devidamente calculadas de modo a salvaguardar o interesse nacional.  

O saldo importador de electricidade é bastante elevado, não se produz em Portugal o suficiente e, assim, importa-se de Espanha (e França) energia gerada em centrais a carvão que emitem o dióxido de carbono que o governo diz querer combater.   

Do mesmo modo que em resultado do encerramento da Refinaria em Matosinhos, verificou-se já a necessidade de importar toneladas e toneladas de gasóleo. 

O Governo do PS, com as suas politicas cegas é hoje um mero facilitador de negócios ditos verdes, tentando confundir os trabalhadores, procurando fazer-se passar por campeão de uma transição energético-climática que não existe, isto é, trata-se de um verdadeiro embuste.

O mesmo Governo que tem um dedo que adivinha, quando afirmava vezes sem conta, que quando Portugal atingir uma cobertura de 80% em energias renováveis em 2025, então, o custo final da electricidade baixará de forma significativa. 

Propaganda em cima de propaganda, a mesma que os neoliberais usaram para enganar os Portugueses a aceitar com entusiasmo a privatização e liberalização do sector energético (electricidade e combustíveis) e que hoje está bem a vista de todos.

Adeptos fervorosos das energias renováveis, Governo e algumas associações ambientalistas desdobram-se em argumentos para convencer o Povo que com estas fontes de produção energética estaremos em poucos anos às portas de um admirável mundo verde.

Seria necessária muita ingenuidade política para ser embalado neste canto de sereia e acreditar que a concretizar-se a titulo de exemplo uma crescente massificação da utilização de carros eléctricos ou a electrificação de muitas outras actividades, isso será possível, apenas com o recurso a Energias ditas renováveis.  

Os encerramentos precoces e injustificados apadrinhados pelo governo, destruíram milhares de postos de trabalho, pequenas e medias empresas que operavam ao redor daquelas unidades sem que fossem acauteladas alternativas credíveis e sustentáveis.

Impoe-se uma clarificação politica por parte do Governo se mantem a intenção de encerrar as centrais a gás de ciclo combinado, conforme define o designado roteiro para a transição energética e conforme afirmou o ex ministro do ambiente no dia do encerramento do Pego, que a concretizar-se representaria mais um passo para o desastre económico. 

A crise energética é a prova provada de que não há ainda nenhuma alternativa credível e sustentável ao consumo dos combustíveis tradicionais e que as mais ou menos sonantes proclamações na COP26 não passam disso.

As emissões de carbono, foram colocadas na agenda como o principal causador das alterações climáticas, abrindo uma nova área de negócio com o mercado de licenças, uma espécie de bula climática, quem pagar mais pode emitir. 

No caso português as emissões de carbono representam apenas 0,15% do total mundial e a nível europeu, Portugal é o terceiro país com menos emissões per capita, o que torna a pressa demonstrada pelo governo seguidista do PS injustificada e desprovida de sentido a não ser para cumprir uma agenda oculta. 

É por isso que são duvidosas as motivações políticas de alguns ambientalistas, que recorrem á manipulação dos números, para exigir o encerramento prematuro e em alguns casos criminoso da capacidade produtiva nacional, ao mesmo tempo que defendem que o País coloque as fichas todas nas renováveis, caindo numa contradição insanável, a circunstância de estarmos na presença de fontes de produção energética intermitentes, isto é, que dependem das condições naturais, que segundo eles estão em acelerada alteração. 

Os mesmos que não manifestam posição sobre o facto de ser necessário o recurso a muitas matérias-primas com origem nas terras raras para a concepção desses equipamentos de energia renovável, bem como a sua colocação, ocupando parte significativa do nosso território, como já se verificou no Gavião com o abate de uma vasta área de sobreiro, e o muito solo agrícola, que poderá ser comprometido e contribuir para a desertificação de muitas aldeias e lugares deste País.  

Os mesmos, que não dizem uma única palavra de preocupação, sobre a extração do gás de xisto em que os EUA são lideres, processo altamente penalizador para o meio-ambiente.  

É por isso, que em nossa opinião estamos na presença de uma agenda ideológica, que nega a evolução tecnológica enquanto elemento crucial que permite elevar a qualidade de vida e permitir que o homem possa coexistir em harmonia com o meio ambiente e que deste não seja escravo, como deixam implícito. 

Uma agenda, aparentemente revolucionária que se limita a proclamar slogans e que não distingue os verdadeiros causadores da destruição do meio ambiente, o capital, daqueles que dependem apenas do seu trabalho para viver ou até mesmo sobreviver. 

É por isso que também são acérrimos defensores da designada fiscalidade verde, que em nada contribui para adopção de comportamentos ecologicamente conscientes, mas antes para alimentar um negócio. 

A mesma agenda ideológica, que procura fazer das alterações climáticas  o alfa e o ómega do futuro da humanidade, ao recorrer a mensagens alarmistas, numa espécie de profecia do fim do mundo ignorando que a defesa do meio ambiente, deve-se em larga medida a problemas de ordem local, de décadas de políticas que não cuidaram do ordenamento do território, de abandono do interior em detrimento do litoral.

São os mesmos, que se movimentam numa nuvem de sebastianismo, dispostos a fazer reset ao modo de vida e ao progresso, sabe-se lá para servir propósitos que apenas ao capital transnacional daria jeito.

O que está em causa, é defender um desenvolvimento económico e superar os graves problemas ambientais que estão muito para além do horizonte das alterações climáticas, lutar por um modelo de desenvolvimento que provoque uma rotura com os actuais métodos de produção e acumulação capitalistas, sistema que de verde nada tem, e processo de transição energética, que está a redundar isso sim num processo de destruição.  

O que se impõe aos trabalhadores, isso sim, é a exigência de que o incremento tecnológico sirva os seus interesses, ou seja, o aumento dos salários; a redução dos horários de trabalho a criação de emprego e a melhoria das condições de trabalho.  

Obrigado.

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