Intervenção de

Debate sobre energia - Intervenção de Jerónimo de Sousa na AR

 

Debate sobre energia com o Primeiro-Ministro

 

Sr. Presidente,

Sr. Primeiro-Ministro,

Permita-me um desabafo. Estes debates começam a correr o seguinte risco sério - e esta questão não é só entendida assim aqui na Assembleia: aquilo que sobra em anúncios falta em respostas aos problemas, aos anseios e às aspirações do povo português.

Em relação ao tema que hoje aqui nos trouxe, a minha primeira questão é sobre o preço dos combustíveis.

De acordo com a Direcção-Geral de Energia e Geologia do Ministério da Economia (insuspeito), o preço do barril do petróleo importado para Portugal aumentou apenas 1,5% em 2007. Contudo, no mesmo período, o preço da gasolina 95 aumentou 3,4%, a gasolina 98 aumentou 4,1%, o gasóleo rodoviário 3,5% e o gasóleo para aquecimento 7,9%. Ou seja, trata-se de aumentos muito superiores ao aumento do preço do barril de petróleo.

Este facto levou, como sabe, a lucros extraordinários inadmissíveis de 68,7 milhões de euros, num quadro de 777 milhões de euros de lucro líquido global, às petrolíferas, claro.

Sr. Primeiro-Ministro, ninguém percebe porque é que os preços têm de subir mais que o barril de petróleo e por que razão agora, face à importância que esta questão tem na actividade económica, o Governo não actua.

Por que é que o Governo não intervém no preço?

Esta é uma pergunta concreta, Sr. Primeiro-Ministro.

(...)

Sr. Presidente,

Sr. Primeiro-Ministro,

Em relação à sua tese da visão do Partido Comunista quanto à intervenção do Governo em relação aos preços, espero que não tenha de «engolir em seco» quando, num futuro próximo, perante a crise financeira e as dificuldades que a banca está a ter, o Estado tiver de intervir. Veremos se não vai ter de «engolir» aquilo que agora acaba de dizer.

Em relação à outra questão, considero inaceitável a sua visão. Estamos a falar do preço do petróleo, que tem efeitos devastadores na produção nacional, no nosso aparelho produtivo!

Fica, portanto, descansado quando mais de 50 000 empresas foram à falência, muitas delas por causa do preço dos combustíveis, que aumenta os custos de produção?!

Isto não tem nada a ver com esta política de preços?!

Por isso mesmo, faço-lhe uma segunda pergunta. Também em relação ao preço do gás natural, temos uma situação inaceitável, que está a criar problemas às empresas portuguesas. Em Portugal, o preço do gás é 40% superior ao praticado em Espanha e a política de tarifários premeia os grandes gastadores e penaliza a eficiência energética.

O Sr. Ministro da Economia prometeu tomar medidas para amenizar os impactos negativos desta situação.

Lembra-se? Prometeu, em Setembro do ano passado, que iria tomar medidas em relação às empresas do vidro e da cerâmica do distrito de Leiria. Prometeu e não cumpriu!

Por isso, fecharam, recentemente, mais empresas, como a Tosel e a Canividro. O encerramento de empresas vidreiras continua a ocorrer por causa do elevado preço do gás, que pesa 50% nos custos de produção desta indústria.

Sr. Primeiro-Ministro, não me estou a referir à promessa não cumprida, mas não acha que esta questão do preço do gás é vital, particularmente para as pequenas e médias empresas?

(...)

Sr. Presidente,

Sr. Primeiro-Ministro,

Não faça esse «golpe de rins», porque a solução que propomos é em relação aos lucros abusivos que as petrolíferas estão a ter.

É essa a questão. Se o petróleo aumentou 1,7% por barril, por que razão a gasolina há-de aumentar 4%?! É isso que deve explicar aos portugueses, às pequenas e médias empresas e às famílias.

Sr. Primeiro-Ministro, vou colocar-lhe uma última questão.

Há 15 dias atrás coloquei-lhe a questão do IRC pago pela banca em 2007. À pressa, e talvez devido a essa pressa, respondeu evasivamente com números de 2006. Já passaram 15 dias e, certamente, o Sr. Primeiro-Ministro viu que era verdade aquilo que afirmávamos, ou seja, que afinal a banca paga inexplicavelmente menos 150 milhões de euros. Seguramente, já reflectiu sobre a situação.

Diga lá, Sr. Primeiro-Ministro - já que tem agravado os impostos, indo buscar dinheiro a todo o lado (aos combustíveis, ao IVA, aos reformados, à função pública, ao tabaco, ao álcool) -, se considera aceitável que a banca acabe por pagar metade do que é devido. Vamos, ou não, acabar com este escândalo?

Temos vindo a apresentar uma proposta que obriga a banca a pagar uma taxa mínima de 20%,

independentemente de «engenharias fiscais». Ou seja, se esses valores que referiu são verdadeiros, então não tinha qualquer problema em aceitar a nossa proposta de taxação de 20% para a banca. Ora, os senhores têm-na recusado.

Não responda com evasivas. Esta é uma questão importante. Está, ou não, de acordo, com base num princípio de equidade, que a banca, que tem tido tantos lucros, pague aquilo que é devido ao Estado e a toda a comunidade?

(...)

Sr. Presidente, vou ser muito breve.

Há aqui uma contradição insanável. Alguém está a enganar alguém! Não entendemos que seja a própria banca a reflectir, nos seus relatórios e nos seus estudos, estes valores que apresentei. Quem fala verdade?

Nós cremos que a banca, apesar de ter alguma prudência, está a falar verdade. O Sr. Primeiro-Ministro é que a recusa, porque, no essencial, quer continuar a beneficiar este grande sector da sociedade portuguesa, quer continuar a beneficiar aquilo que para si é um palavrão, ou seja, o capital financeiro. E isso é que é injusto, porque, Sr. Primeiro-Ministro, quantas vezes, da tribuna, não levanta a voz a exigir sacrifícios a todos os portugueses?!

Há aqui um punhado que não faz quaisquer sacrifícios, que vive de privilégios, que vive da acumulação e concentração da fortuna.

Ora, este Governo do Partido Socialista não é capaz de contrariar esta situação, em nome da equidade e da justiça social.

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