Intervenção de Paula Santos na Assembleia de República

Cuidados paliativos

Direito dos cidadãos aos cuidados paliativos, responsabilidade do Estado em matéria de cuidados paliativos e rede nacional de cuidados paliativos.
(Projecto de Lei 288/XI e Projecto de Lei 408/XI)

Senhor Presidente,
Senhores Deputados

À semelhança do que se passa noutras áreas da saúde, a capacidade de resposta das unidades de cuidados continuados integrados de saúde, as quais incluem os cuidados paliativos, são insuficientes face às necessidades da população. A rede nacional de cuidados continuados integrados criada pelo anterior Governo do Partido Socialista, ficou aquém do que o País precisa. Não se verificou o aumento desejável da capacidade de resposta dos cuidados continuados e dos cuidados paliativos. Se é grave a carência de resposta ao nível dos cuidados continuados, esta é ainda mais grave no que se refere aos cuidados paliativos.

Vejamos alguns dados mais relevantes que constam no relatório de monitorização do desenvolvimento e da actividade da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, elaborado pela Unidade de Missão dos Cuidados Continuados Integrados:
- O número total de camas a 31 de Dezembro de 2009 é apenas cerca de 4000 para o universo dos cuidados continuados, das quais somente 118 são destinadas para os cuidados paliativos;
- Os cuidados paliativos foram a área com menor crescimento em termos de número absoluto de camas;
- A 31 de Dezembro de 2009 existiam 7 camas por 100 mil habitantes com mais de 65 anos nos cuidados paliativos.

O Governo está muito longe de assegurar a todos os portugueses o acesso aos cuidados de saúde de que necessitam e a que têm direito constitucionalmente, que lhes dê o apoio, dignidade e a qualidade de vida possível.

A própria Inspecção Geral de Finanças no seu relatório de actividade de 2009, no que se respeita à Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados faz uma apreciação muito crítica da actuação do Governo.
Face à carência de resposta dos cuidados continuados e dos cuidados paliativos, o PCP acompanha as preocupações manifestadas nas iniciativas legislativas que hoje discutimos, e que propõem a criação de uma rede nacional de cuidados paliativos.

O PCP defende o reforço da rede pública para os cuidados continuados e também para os cuidados paliativos. No entanto face à situação do país, não rejeitamos a hipótese de recorrer a entidades de âmbito social e privado lucrativo para dar resposta nesta área, mas isto não pode significar o desinvestimento ou a desvalorização do Governo em função da ampliação da rede pública, para beneficiar esses sectores.

As propostas do CDS e do BE vão exactamente no sentido de criar uma rede de cuidados paliativos, que integra a vertente pública e privada, social e lucrativa, embora na proposta do BE estes aspectos não estejam clarificados. Na nossa opinião, a referência deveria ser: a criação de uma rede exclusivamente pública, e enquanto esta não tivesse capacidade para dar resposta às necessidades do país, contratualizar-se-ia com entidades privadas de cariz social e/ou lucrativa. Esta formulação é significativamente diferente da expressa nos projectos de lei em discussão. Já sabemos qual vai ser o resultado, o social e o privado desenvolve-se e amplia-se, em detrimento do serviço público.

A evolução da capacidade de resposta dos cuidados continuados integrados de saúde no Serviço Nacional de Saúde, no sector social e privado lucrativo demonstra o desinvestimento na rede pública, em benefício dos restantes. O Serviço Nacional de Saúde apenas corresponde a 10% da capacidade de resposta dos cuidados continuados integrados, sendo o sector com menor número de camas e o que menos evoluiu durante o ano de 2009. Já o sector privado com fins lucrativos foi o sector que mais cresceu no ano de 2009, seja em número de camas, seja nos acordos estabelecidos.

Mais uma vez tínhamos razão. O PCP alertou e denunciou a subversão que poderia existir com a inclusão na mesma rede, da vertente pública e da privada, quando foi criada pelo anterior Governo.

O PCP não vê inconveniente na criação de uma rede nacional de cuidados paliativos, autonomizando-a da dos cuidados continuados integrados, pois possibilita a sua valorização, crescimento e desenvolvimento, ao nível de equipamentos e de meios humanos, permitindo aumentar esta resposta aos utentes, que se encontram já em situação fragilizada e que precisam destes cuidados de saúde, com qualidade e eficácia.

Mas na nossa opinião a questão central não passa obrigatoriamente pela criação de uma nova rede, mas sim pelo aumento do investimento público nesta área. Mesmo com a inclusão dos cuidados paliativos nos cuidados continuados integrados, como se encontra actualmente, se houvesse investimento do Governo e uma evolução equilibrada, o país não estaria nesta situação.

O débil investimento do Governo nesta matéria é o grande responsável pela enorme carência dos cuidados continuados integrados e paliativos aos portugueses. A Inspecção Geral de Finanças no citado relatório, refere que “a rede nacional de cuidados continuados integrados tinha associada uma dotação entre 2006 e 2009 superior a 303 milhões de euros, embora até 2008, a execução não tenha ascendido, a 63 milhões de euros, o que reflecte falta de eficácia e eficiência”.

Estamos perante mais uma desresponsabilização do Governo na saúde. O que é preciso é que o Governo reforce o investimento público para ampliar a rede de equipamentos públicos de cuidados continuados e de cuidados paliativos no País, de proximidade à população; reforce o investimento nos recursos humanos disponíveis, para criar as equipas especializadas; reforce a formação dos profissionais e que assegure as condições de trabalho, com respeito pelas carreiras e direitos dos trabalhadores, que permita acompanhar e prestar os cuidados de saúde que a população precisa e garanta o direito à saúde com qualidade.

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