Pergunta ao Governo N.º 1977/XI/2

Consequências dos cortes nos transportes de doentes no distrito de Évora

Consequências dos cortes nos transportes de doentes no distrito de Évora

A decisão tomada pelo Governo de cortar o direito ao transporte de doentes está a causar graves problemas em todo o País. As consequências desta decisão são particularmente graves em regiões desertificadas, com população envelhecida e de baixos recursos económicos, como é o caso do Alentejo.
No distrito de Évora as consequências desta decisão do Governo estão a atingir proporções verdadeiramente dramáticas, não só na vida dos utentes dos serviços de saúde mas também nas associações e corporações de bombeiros.
A decisão governamental de impedir a atribuição de credenciais de transporte aos utentes dos serviços de saúde para efectuarem tratamentos ou para assistirem a consultas médicas significa que os utentes passam a ter que suportar os custos com os transportes nessas deslocações.
No distrito de Évora, utentes que anteriormente beneficiavam do transporte para os locais das consultas ou dos tratamentos são agora confrontados com custos de várias dezenas ou centenas de euros consoante tenham que ser transportados para Évora ou para Lisboa.
Na realidade, esta decisão governamental impede os utentes sem recursos económicos de aceder aos cuidados de saúde a que têm direito porque não têm forma de suportar os custos das deslocações.
Prova disso é que desde o início de Janeiro tem aumentado significativamente o número de utentes que não comparece a consultas de especialidade agendadas no Hospital do Espírito Santo em Évora, na generalidade dos casos por não poderem custear o transporte a partir do seu local de residência para a capital de distrito.
Simultaneamente, também em consequência desta decisão do Governo, as associações humanitárias de bombeiros vêm-se agora a braços com uma situação de estrangulamento financeiro.
Estas associações foram, ao longo dos anos, melhorando a sua capacidade de resposta e a qualidade dos serviços prestados aos cidadãos, nomeadamente realizando investimentos em viaturas, material e contratação de pessoal.
O financiamento garantido pelo Estado com o transporte de doentes foi, obviamente, tido em conta na decisão de realização dos investimentos necessários à melhoria de qualidade dos serviços prestados pelos bombeiros na área da saúde, assumindo igualmente uma importância decisiva para que a acção dos bombeiros pudesse ser mais eficaz noutras dimensões, particularmente na área da protecção civil.
A verdade é que o financiamento da actividade de transporte de doentes permitiu a contratação de bombeiros e a aquisição de material e equipamentos necessários não só ao cumprimento da sua missão em matéria de saúde mas também de protecção civil.
A manutenção dos efectivos profissionais – aqueles que efectuam o transporte de doentes mas também asseguram a intervenção em operações de salvamento e socorro ou de combate aos incêndios – na generalidade das corporações de bombeiros das associações humanitárias foi garantida, em boa parte, com base no financiamento obtido pela actividade de transporte de doentes que agora é cortada em mais de 90%.
Ora, face à decisão do Governo, as associações humanitárias de bombeiros estão agora confrontadas com a perspectiva de terem que despedir bombeiros e outros funcionários e até de terem que alienar património para pagar as indemnizações legalmente devidas.
Com esta decisão governamental põem-se em causa anos de investimentos realizados pelas associações de bombeiros e pode vir a reduzir-se a zero toda a capacidade instalada das respectivas corporações.
Caso esta situação se mantenha, muitas associações de bombeiros confrontar-se-ão mesmo com a eventualidade de terem que encerrar portas e cessar a sua actividade em resultado do estrangulamento financeiro a quês estão a ser sujeitas.
Apesar de se terem já tornado evidentes muitas das consequências dramáticas desta decisão governamental, temos assistido com incredulidade às afirmações socialmente insensíveis e mesmo irresponsáveis da própria Ministra da Saúde que procura ignorar a realidade.
Ouvimos inclusivamente a senhora Ministra da Saúde referir-se ao direito que todos os cidadãos têm de aceder à saúde falando de abusos e também a procurar desmentir a realidade vivida diariamente por milhares de utentes dos serviços de saúde e pelas corporação de bombeiros.
Não cremos que o Governo desconheça a real dimensão das consequências da sua decisão nem sequer pomos a hipótese de ser por desconhecimento dessa realidade que a situação se mantenha.
As motivações economicistas que estão na base desta decisão são conhecidas e bem evidentes mas é fundamental que o Governo reconheça que, perante as dramáticas consequências que a mesma assume, impõe-se a sua imediata correcção com a correspondente reposição do direito ao transporte de doentes.

Assim, e ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, solicito através de V. Exa., ao Ministério da Saúde, os seguintes esclarecimentos:

1. Que previsão fez o Governo quanto ao impacto desta decisão no acesso aos cuidados de saúde por parte dos utentes no distrito de Évora?
2. Que avaliação está o Governo a fazer no distrito de Évora das consequências desta decisão no acesso aos serviços de saúde, que medidas tomou para que essa avaliação fosse feita ou porque motivo não o fez?
3. Que contabilização está o Governo a fazer da não comparência de doentes do distrito de Évora em consultas ou tratamentos nos serviços de saúde?
4. Como pretende o Governo resolver a situação criada aos doentes do distrito de Évora que entretanto deixaram de assistir a consultas ou realizar tratamentos por não terem meios que lhes permitissem deslocar-se?
5. Quando vai o Governo reverter a decisão e que medidas vai adoptar para assegurar o acesso de todos os cidadãos aos cuidados de saúde, como de resto é sua obrigação?

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