Projecto de Lei

Conselho Nacional para as Tecnologias da Informação e da Comunicação

 

Cria o Conselho Nacional para as Tecnologias da Informação e da Comunicação

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Exposição de Motivos

A política do actual Governo ao longo desta Legislatura na área das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC) veio pautando-se principalmente por uma lógica de propaganda e favorecimento de interesses privados, sacrificando os recursos e o interesse nacional. Não existe uma verdadeira visão estratégica de desenvolvimento e democratização dos benefícios e do potencial das tecnologias, antes uma política assente na subserviência do Estado às necessidades das grandes corporações, situação que ficou bem patente nos famosos "memorandos de entendimento" entre o Estado Português e a Microsoft.

Quer o Governo, quer as entidades da Administração Pública que poderiam liderar a adopção e normas abertas não estão a assumir esse papel, permitindo o aprofundamento dos monopólios. Continuadamente a aquisição de licenças de software proprietário para os organismos do Estado é feita sem concurso público, apenas com a renovação de acordos.

O caso do "portal para a transparência" do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, adjudicado à Microsoft sem concurso público, seria até caricato se não traduzisse uma situação tão preocupante. Nesse processo soubemos da acção da Microsoft enquanto consultora do Ministério das Obras Públicas, colaborando com a Secretaria de Estado na regulamentação do Código da Contratação Pública, acabando por conseguir a adjudicação de um serviço para o qual foi consultora, ao arrepio das recomendações legais.

Mais recentemente, novos elementos de particular gravidade vieram a público quanto à operação "e-iniciativas", envolvendo os projectos "e-escolas", "e-escolinhas" e "e-oportunidades", que vêm merecendo a atenção e o acompanhamento do PCP desde há anos. Aqui o que se verifica é que uma Fundação instituída por empresas privadas, em que o Estado assume (explicitamente) a responsabilidade pelo financiamento, transfere verbas para as empresas que a criaram, para compensar o custo de iniciativas que estas se comprometeram a garantir.

O chamado Plano Tecnológico é o principal eixo de uma política assente num conjunto de medidas avulsas, sem uma visão do desenvolvimento tecnológico do país. Da aplicação do Plano Tecnológico resultam negócios de avolumadas dimensões, bem como pontuais medidas de aplicação das tecnologias da informação. No entanto, este Plano Tecnológico demonstrou não apresentar uma matriz de desenvolvimento transversal e nacional, nem de efectiva democratização do acesso e utilização às tecnologias em nenhuma esfera da actividade. Continua sem existir um estímulo ao tecido empresarial para que modernize os seus sistemas produtivos; e continua sem existir uma formação adequada da população para a utilização e manipulação dos meios tecnológicos.

Esta prática e estas opções políticas do Governo, este acumular de situações de falta de transparência democrática e esta gritante ausência de uma estratégia integrada de desenvolvimento económico, social e cultural associada à promoção das TIC vem reforçar a justeza e a oportunidade da proposta do PCP no sentido da criação de um Conselho Nacional para as Tecnologias da Informação e Comunicação.

Rejeitado numa anterior Sessão Legislativa pela maioria parlamentar do PS, este projecto de lei do PCP ganha hoje em dia razão e actualidade reforçadas, e constitui um contributo positivo e construtivo para uma mudança de atitudes por parte dos poderes públicos no nosso país, promovendo a transparência e a informação, mas desde logo a participação, a reflexão sustentada e o debate qualificado sobre as políticas e estratégias a adoptar nesta área.

No seu Programa Eleitoral para a presente Legislatura da Assembleia da República, o PCP consagrou como uma das orientações fundamentais para a área das Tecnologias da Informação e Comunicação a promoção da participação das pessoas e das organizações, incluindo na área da economia, na definição das suas necessidades em serviços, aplicações e em conteúdos, tendo em conta as possibilidades crescentes de oferta de soluções diversificadas.

Nesse sentido, uma das medidas que o PCP propôs no seu Programa, a concretizar neste mandato, corresponde à criação de um Conselho Nacional para as Tecnologias da Informação e Comunicação, dotado da necessária autoridade institucional, com funções de orientação estratégica para as áreas da ciência e da tecnologia, para as estruturas económicas, sociais e culturais, e para os diversos centros de intervenção política e institucional.

A actuação do actual Governo nesta matéria tem sido fundamentalmente a de promover eventos que se destacam mais pelo seu carácter mediático do que por uma promoção efectiva do envolvimento e participação da comunidade.

Segundo o Governo, o objectivo do Fórum para a Sociedade da Informação era «assegurar a participação regular dos actores relevantes para o desenvolvimento da Sociedade da Informação em Portugal, públicos e privados, estimulando o debate, a troca de experiências e a aferição das próprias políticas públicas».

No entanto, e à semelhança de outros "foros" organizados por este Governo, a verdade é que esta iniciativa correspondeu muito mais a um conjunto de palestras de oradores convidados, seguidas de breves momentos de perguntas e respostas, e muito menos a uma verdadeira jornada de reflexão e debate sobre a situação actual e as perspectivas futuras do sector das TIC em Portugal.

O organismo que foi apresentado pelo Governo como «um órgão de consulta e concertação para o desenvolvimento das políticas públicas para a sociedade da informação, reunindo os principais actores sociais, públicos e privados, e aberto, de forma interactiva, à sociedade em geral» está assim muito longe de corresponder a tais características.

Pela importância estratégica que assumem para o desenvolvimento do nosso país, nas suas múltiplas vertentes, as Tecnologias da Informação e Comunicação exigem que as políticas públicas sejam definidas e conduzidas de forma efectivamente participada, e com o contributo e reflexão das diversas comunidades no plano social, cultural, científico e económico. Assim, a definição dos principais eixos estratégicos de acção para esta área não pode deixar de ter em conta o conteúdo de uma discussão ampla e abrangente, que se desenvolva e actualize de uma forma regular e estruturada.

Esse funcionamento regular constitui a base necessária para uma intervenção efectiva no acompanhamento a esta área, avaliando a situação do país em cada momento, a evolução das tendências e dinâmicas do sector, a aplicação e os resultados das políticas públicas. Tal acompanhamento exige também uma base sólida de informação e conhecimento, que pode e deve ser proporcionada pela realização de estudos e pareceres que qualifiquem a acção do Estado nesta matéria.

Nesse sentido, o PCP propõe a criação do Conselho Nacional para as Tecnologias da Informação e Comunicação, órgão consultivo junto do membro do Governo responsável pela área das Tecnologias da Informação, com a participação das instituições do ensino superior, das estruturas do poder local e regional, das estruturas representativas das empresas, dos trabalhadores e dos utilizadores das tecnologias, do movimento associativo.

Trata-se de um organismo composto por 15 representantes, que se propõe funcionar numa base de regularidade semestral, pronunciando-se sobre as orientações estratégicas do Governo e a legislação para o sector, propondo novas medidas e opções, identificando prioridades para a intervenção nesta área.

Nos termos da proposta do PCP, deve ser integrado nesta intervenção mais ampla e mais participada que se deve desenvolver a realização periódica (e não isolada, como até agora), de um "Fórum para a Sociedade da Informação" efectivamente merecedor dessa designação.

Esta proposta do PCP é um contributo para uma efectiva promoção da participação, qualificando e enriquecendo os processos de definição das políticas públicas para este sector, na medida em que se considera de facto que «o desenvolvimento do País, neste como noutros domínios, requer plataformas alargadas de participação que promovam o trabalho em rede e a construção partilhada de objectivos comuns».

Assim, face aos motivos acima expostos, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1.º

Objecto

A presente lei cria o Conselho Nacional para as Tecnologias da Informação e da Comunicação e estabelece o seu regime jurídico.

Artigo 2.º

Conselho Nacional para as

Tecnologias da Informação e da Comunicação

É criado o Conselho Nacional para as Tecnologias da Informação e da Comunicação (CNTIC), adiante denominado por "Conselho Nacional", órgão consultivo junto do membro do Governo responsável pela área das Tecnologias da Informação.

Artigo 3.º

Competências

•1.      O Conselho Nacional tem como missão central o aconselhamento do Governo no que respeita ao desenvolvimento das tecnologias da informação e da comunicação, assumindo como vertentes dos seus estudos e pareceres as seguintes áreas:

•a)     Investigação;

•b)     Desenvolvimento;

•c)      Inovação;

•d)     Acessibilidade;

•e)      Utilização;

•f)      Cobertura territorial;

•g)     Impactos e custos da utilização.

•2.      Compete também ao Conselho Nacional:

•a)     Pronunciar-se sobre a legislação em vigor relativa às tecnologias da informação;

•b)     Pronunciar-se em cada ano sobre as propostas de Grandes Opções do Plano e Orçamento do Estado relativas às tecnologias da informação;

•c)      Elaborar, em cada mandato, um "Relatório sobre o Estado das Tecnologias da Informação em Portugal", relativamente às vertentes referidas no número 1 do presente artigo;

•d)     Desempenhar as demais funções que lhe forem atribuídas por lei.

•e)      Promover e supervisionar a realização de um encontro anual, designado por "Fórum para a Sociedade da Informação" e de outras iniciativas de reflexão e debate, de âmbito nacional, para as tecnologias da informação.

•3.      O Conselho Nacional emite, obrigatoriamente, parecer não-vinculativo sobre programas, medidas e legislação, de âmbito nacional, a aprovar e a implementar na área da sua competência.

Artigo 4.º

Composição

  1. O Conselho Nacional é composto por:

•a)     dois elementos designados pelos membros do Governo responsáveis respectivamente pelas áreas das Tecnologias da Informação e da Comunicação Social;

•b)     um elemento designado pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas;

•c)      um elemento designado pelo Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos;

•d)     um elemento designado pelas associações com intervenção na promoção das tecnologias de informação e da comunicação;

•e)      um elemento designado pelas associações de defesa do consumidor;

•f)      um elemento designado pela Associação Nacional de Municípios Portugueses;

•g)     um elemento designado pela Associação Nacional de Freguesias;

•h)     um elemento designado pela Confederação Portuguesa das Colectividades de Cultura Recreio e Desporto;

•i)       dois elementos designados pelas Centrais Sindicais;

•j)       dois elementos designados pelas associações empresariais;

•k)     dois elementos designados pelos Governos Regionais das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.

  1. O Conselho Nacional pode proceder ao convite de entidades e personalidades, pelo seu contributo e experiência no domínio das TIC, para participar nos seus trabalhos, sem direito a voto.

Artigo 5.º

Mandato

•1.      Os membros do Conselho são designados por dois anos.

•2.      Os membros do Conselho mantêm-se em funções até ao acto de posse de quem os substitua.

Artigo 6.º

Estatuto dos membros do Conselho

•1.      Os membros do Conselho são representantes das entidades que os designaram e podem ser substituídos por estas.

•2.      Os membros do Conselho perdem o seu mandato caso percam a qualidade pela qual foram designados.

•3.      Os membros do Conselho exercem as suas funções em regime não remunerado.

Artigo 7.º

Funcionamento

•1.      O Conselho reúne ordinariamente uma vez em cada semestre, e extraordinariamente sempre que o presidente o entenda necessário ou sempre que se verifiquem os requisitos estipulados no seu regimento.

•2.      O Conselho elege de entre os seus membros um presidente e dois vice-presidentes, por maioria qualificada de dois terços.

•3.      O Conselho funciona em plenário com a presença da maioria dos seus membros.

•4.      O Conselho delibera por maioria e o presidente tem voto de qualidade.

•5.      O Conselho elabora e aprova o seu regimento, que é publicado na II Série do Diário da República.

Artigo 8.º

Comissões especializadas

O Conselho pode criar comissões especializadas, com a missão de apreciar e apresentar iniciativas nas áreas específicas previstas no Artigo 3.º.

Artigo 9.º

Dever de cooperação

O Governo e a Administração Pública cooperam com o Conselho, prestando a colaboração que este solicite para o cumprimento das suas atribuições e garantindo os meios logísticos e financeiros necessários para o seu funcionamento.

Artigo 10.º

Orçamento e instalações

Os encargos com o funcionamento do Conselho são cobertos pela dotação orçamental atribuída à Presidência do Conselho de Ministros, a quem compete assegurar as instalações e o apoio técnico e administrativo de que aquele necessite para o seu funcionamento.

Assembleia da República, em 3 de Julho de 2009

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